Entrevista com o Poeta e Escritor J Estanislau Filho



Uma papo bem esclarecedor com o autor de oito livros,escritor e poeta do “Recanto das Letras” sobre temas diversificados.

FB - Como foi sua infância, como era o menino J Estanislau Filho e conte um pouco da origem de sua família.

JEF - Sou filho de trabalhadores rurais. Meu pai foi um pequeno proprietário de terras e desde cedo ajudava na lida, moendo cana para fazer rapaduras; debulhando milho, para tratar dos porcos; entregando leite na cooperativa, ajudando nas lavouras. Era uma vida bastante precária, alternando com alguns momentos de fartura, em termos de alimentação. A diversão era jogar futebol nos terreiros; cantigas de roda; de carrinhos de madeira. Filho de família católica. Rezávamos o terço diariamente e íamos à missa aos domingos. Minha mãe segurava a onda quando o bicho pegava, pois meu pai era bastante rigoroso nas correções.


FB - Como começou sua história como poeta e escritor e de onde veio o incentivo inicial?

JEF - Como tinha um irmão que estudava no seminário e uma irmã num convento, tanto ele, quanto ela trazia livros e revistas. Meu irmão, livros de filosofia e teologia, minha irmã, foto-novela, quadrinhos. Na escola primária, por meio dos clubes de leitura tive acesso às poesias de Castro Alves, Cecília Meireles, Olavo Bilac, Raimundo Correa, Fagundes Varela, entre outros. O primeiro romance que li foi Guerra e Paz de Leon Tolstoi. Tinha por volta de 12/13 anos de idade. A partir daí lia o que me caia em mãos. No internato, em que estudei durante 3 anos, lia os livros da biblioteca. José Alencar, Machado de Assis, Adolfo Caminha, entre outros.

FB - Você é autor de oito livros de crônicas, contos, novelas e poesias. Você tem algum testemunho de algum leitor sobre o impacto de suas obras em suas vidas? E o que estas obras trouxeram e ensinaram para você?

JEF - Ouvi de alguns leitores elogios, mas não saberia dizer o tipo de impacto causado. Penso que ao escrever meus livros, fui me tornando uma pessoa melhor, mas consciente da realidade e do meu papel na sociedade.

FB - No principio de sua carreira como escritor e poeta você afirma que sua literatura era mais engajada e até mesmo panfletária, como se deu essa transição para o escritor e poeta que você é nos dias atuais?

JEF - Era mais panfletária, por causa da conjuntura da época. Vivíamos sob um regime de ditadura e ansiava como boa parte da minha geração, por liberdades democráticas. Panfletárias no sentido libertário.


FB - Em sua “Crônica do Amor Virtual” você narra uma relação doentia do internauta com o computador em que ele se torna um dependente e passa a viver em função dessa virtualidade. Em contraponto, você fala também de histórias de relacionamentos bem sucedidos. Você teve alguma experiência em algumas dessas duas situações ou conviveu com alguém que passou por elas?

JEF - Não. É pura ficção.

FB - O seu poema “Palavras de Amor” nos mostra um amor incondicional e tolerante que infelizmente quase não se ver mais nos tempos aos quais vivemos. Como fazer para aperfeiçoar este amor que temos em todos nós e fazer com que nós possamos nos aproximar desse sentimento tão nobre?

JEF - Aprendi, lendo os clássicos, que o ódio gera ódio; que o amor gera amor. Acho que devemos amar todas as coisas, o que não significa compactuar com a maldade. Como disse Machado de Assis: "Ame o bom para que ele te honre; o mal para que ele não te desonre".

FB - Como é sua relação com a espiritualidade?

JEF - Minha espiritualidade é viver em harmonia com a natureza, respeitando-a. Entendendo como natureza a Criação. Não tenho religião. Não tenho "atravessadores" entre mim e a Criação. Faço contato com Deus diretamente.


FB - O cenário político atual interfere em suas obras em que aspecto?

JEF - Não creio na arte pela arte. O cenário político, ou conjuntura política, econômica e sócio-ambiental sempre interfere na minha criação, pois vivo este contexto. Penso que todo artista deve se comprometer com a liberdade, com os direitos humanos, enfim, com a vida.

FB- Em sua opinião estamos realmente vivendo em um país politicamente dividido?

JEF - O país sempre esteve dividido entre capital e trabalho. É inevitável, pois o modelo de desenvolvimento capitalista produz a divisão do trabalho e do lucro. É esta divisão que dá suporte ao modelo. Cria-se a pirâmide social e a díade: ricos e pobres.


FB - O povo esteve nas ruas para apoiar a democracia, a Petrobrás e a reforma política. Você acha que estamos mais bem informados do que realmente necessitamos para nossa sociedade?

JEF - As ruas são boas fontes de informação. Sempre se aprende com a prática. Mas é importante a teoria. Sobre o segundo ponto da pergunta, é complexo, pois, por um lado, com a internet há excesso de informação e excesso de informação leva ao esquecimento; por outro lado, as outras mídias empresariais, rádios e tv's desinformam, manipulam. É preciso aprimorar a educação, com mais investimentos, melhores conteúdos.

FB - Os meios de comunicação estão pregando uma insatisfação coletiva em relação ao governo da Presidente Dilma. Até que ponto esta insatisfação realmente procede? E quais são os interesses dessa mídia em relação ao declínio de Dilma Rousseff?

JEF - A chamada grande mídia empresarial (que inclui rádios, tv's, portais, revistas e jornais impressos) é um instrumento do capital, portanto, sempre que um governo trabalhista e voltado aos direitos dos trabalhadores se elege, a mídia empresarial vai pra ofensiva. Foi assim com Getúlio Vargas; João Goulart e com Lula e Dilma.

FB - O que este governo trouxe de desenvolvimento e o que ainda acredita que pode ser feito?

JEF - Os governos trabalhistas foram os que deixaram o melhor legado aos mais pobres, inserindo-os ao consumo. Getúlio criou a CLT; Jango preparava as Reformas de Base, quando foi derrubado. Lula e Dilma são exemplos de um governo trabalhistas de maior duração. Criaram vários programas de inclusão social e retiraram milhões de famílias da pobreza extrema. Entretanto o próprio modelo capitalista, com suas regras de mercado, impõe limites. A tarefa da nova governança é vencer estes desafios, impedindo, inclusive, boicotes de empresários, na área de abastecimento e transportes, por exemplo. Não houve greve de caminhoneiros. Foi greve dos donos das transportadoras. Acho que o governo federal terá de ir pra ofensiva, com reformas estruturantes, como a política, tributária e agrária. Não será fácil com este Congresso. Vai precisar de apoio popular, para pressionar o Congresso, que é quem tem o poder de fazer tais reformas. Terá de negociar com os parlamentares.

FB - Em relação à educação, o que poderia ser feito para despertar o interesse a leitura?

JEF - Não sei exatamente. Com a internet muita coisa mudou no mundo da leitura. É preciso que educadores, comunidade escolar, governos das três esferas: municipais, estaduais e federais, a sociedade enfim, reflitam sobre o tema. Hoje os alunos não querem mais carregar mochilas pesadas. Temos tabletes, celulares onde os conteúdos estão armazenados. Há professores, inclusive, que não dominam estas novas tecnologias. A leitura não acabará, apenas está migrando para estas novas ferramentas.

FB - Quais são os seus próximos projetos literários?

JEF - No prelo um livro de prosa e verso, que espero lançar ainda este ano. Tenho um romance escrito, que ainda não sei quando será publicado.

FB - Quais foram suas maiores referências para que você consolidasse sua carreira como escritor e poeta?

JEF - É difícil citar, pois são inúmeras. Cito minha professora primária Djanira e meu professor Wallace Pimentel. Em minhas redações, eles sempre me estimularam a escrever.

FB - Dos jovens poetas e escritores que estão surgindo tem alguns que considere mais promissores?

JEF - Há muitos bons escritores e poetas. Impossível citar, pois seria injusto com outros.


FB - Um poema, uma música, um filme e uma personalidade que admira.

JEF - Também é impossível citar. Certamente esqueceriam alguns e seria uma injustiça.

FB - Algo em sua trajetória literária que ainda deseja realizar e não conseguiu.

JEF - Lançar meu romance e uma ou duas antologias dos meus melhores textos.

FB - Como você se define?

JEF - Um cidadão.


FB - Uma mensagem aos meus e seus leitores do site “Recanto das Letras”.

JEF - Leiam, leiam, leiam e escrevam o que der nas telhas.



Para encerrar, um grande poema da trajetória de J Estanislau Filho:

Palavras de Amor

Amo amar todas as coisas,
sem exigência de valores.
Quem faz de marquises casas
e em castelos habitam senhores,
amo-os como os assassinos
e me compadeço pelos psicopatas.
Amo adultos e meninos
E ao que a fome mata.
Amo quem vive na luxúria
e me emociono com as prostitutas,
com pessoas em amarguras.
E aos que vivem felizes,
de sorrisos estampados nos rostos
eu os amo como os andarilhos rotos.
Homens e mulheres de finas estampas,
tudo isto me encanta:
o gari, o pedreiro, o carpinteiro,
o meu amor é verdadeiro.
Amo sem restrições
os objetos e as coisas abjetas
e em estado de putrefações.
Amo as nuvens e as estrelas,
não só por serem belas
tanto quanto a lua,
sem me importar se está fixa ou se flutua,
assim como o sol a girar,
sem deixar de brilhar,
pois se aqui há escuridão,
ele ilumina o Japão.
Amo os sem-teto e os sem-terra,
amo tudo em evolução:
comunistas e até alguns capitalistas,
católicos, muçulmanos e evangélicos,
eu os amo igualmente aos psicodélicos...
E aos aprisionados pelos grilhões da intolerância,
procuro amá-los com paciência,
pois que o amor não discrimina
opção sexual ou religiosa,
nem o negro, o branco e o cor-de-rosa.
Amo amar todas as coisas,
a feiura e a beleza
porque somos todos natureza.


J Estanislau Filho - Do livro Palavras de Amor - 2010.


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www.jestanislaufilho.blogspot.com
Fábio Brandão
Enviado por Fábio Brandão em 18/03/2015
Reeditado em 18/03/2015
Código do texto: T5174298
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