"É preciso experimentar nossa cultura"
Na estrada há mais de 20 anos, Eduardo Proffa analisa papel da mídia, da escola e do governo
Fillipe Lima | Texto
Compositor, músico e poeta, Eduardo Proffa é integrante do Nó Na Garganta, projeto artístico que mistura poesia e música. Com mais de 20 anos de carreira, lançou em 2013 o CD e DVD Nó Na Garganta – Show Entre Amigos, gravado ao vivo no Teatro Deodoro.
Em um bate-papo à beira-mar da praia da Pajuçara, ele falou ao InFoca sobre o papel das escolas, do poder público e da mídia na divulgação e aumento do consumo da cultura alagoana, principalmente entre os jovens.
Qual a sua avaliação sobre a divulgação da cultura alagoana?
A cobertura dos programas das emissoras locais abertas é muito acanhada. Temos bons espaços em programas como Vida de Artista, da Gal Monteiro (TV Educativa), Bart Papo, do Geraldo Câmara (TV Mar), Alagoas Arte e Cultura, do Paulo Poeta (TV Assembleia), e o site Identidade Alagoana.
A gente não deve nada para ninguém, o nosso lance cultural é magnânimo. Tanto na música, quanto na poesia, no cinema e no teatro. Ainda acho que a gente tem que invadir as universidades e as escolas públicas e particulares com festivais de música. Os festivais mostram a cara do artista e ajudam muito na divulgação.
Quais os motivos do grande público consumir pouco essa cultura?
A questão é que as pessoas estão muito ligadas a TV e têm preguiça de ler jornal. Atualmente, a internet (Facebook e Instagram) é a principal ferramenta de divulgação de massa da nossa cultura, porém, ainda há muita gente que não tem acesso a ela. As pessoas estão muito ligadas as rádios, que por sua vez não tocam músicas dos artistas locais, com exceção da FM Educativa. Os telejornais hoje em dia estão informando muito mais que antes, mas o espaço para a cultura ainda é pequeno.
É necessário que a iniciativa privada seja mais presente na divulgação, prestar mais atenção na cena cultural alagoana. Assim como a prefeitura vem fazendo ao levar projetos culturais aos bairros. Acredito que se continuarmos nesse ritmo, nos próximos 10 anos atingiremos o público tão desejado.
A escola deveria falar mais sobre a cultura alagoana?
Sem dúvida! Eu sou de uma época em que se aprendia música na escola e conhecia os valores da terra e estudava História de Alagoas. Acredito que hoje isso já não aconteça. Algumas escolas ensinam música. Nessas aulas se estuda artistas nacionais e alagoanos. É necessário fazer isso em todas as escolas, que se estude não só Hermeto Pascoal, mas também Mácleim Carneiro, Júnior Almeida etc. É necessário que a criançada conheça esse pessoal.
Um grupo chamado Caçuá, lá da cidade de Piaçabuçu, faz um trabalho musical nas escolas. Através da música, por exemplo, ensinam que é preciso valorizar e preservar o Rio São Francisco. É preciso mudar o currículo. O professor até pode incluir um assunto ou outro, mas se não estiver no currículo ele não pode aprofundar.
O interesse do alagoano em procurar essa cultura é pequeno?
Os artistas mais jovens (Renata Peixoto e Elisa Lemos, por exemplo) já têm um público próprio: os internautas. A partir do instante que a Renata Peixoto participa do show do Nó Na Garganta, o público dela vai saber que o Nó Na Garganta existe. É importante esse trabalho de divulgação online. Para aumentar ainda mais essa procura é preciso ir às escolas e aumentar o interesse das novas gerações. É necessário, também, eventos culturais promovidos pelo poder público.
O governo estadual apóia? E de que forma?
O governo apóia, porém, o orçamento é muito pequeno em relação a quantidade de artistas que temos. Dentro disso, é feito o possível. Entretanto, acho que é necessário muito mais. Precisamos colocar nossos artistas em evidência em eventos públicos, como o Maceió Verão. Projetos como O Teatro É O Maior Barato e o Quintas no Arena movimentam os teatros Deodoro e o de Arena assustadoramente. Assim como foram abertas as portas do Teatro Linda Mascarenhas para os artistas alagoanos. Existem espaço e galera jovem para absolver essa produção, mas os artistas também devem buscar mais.
O artista alagoano precisa acreditar mais em si?
Não é o fato de acreditar. É preciso botar a cara para bater, se expor um pouco mais. É muito desgastante, mas lá na frente é compensador.
Em relação aos turistas, você acha que eles têm o interesse pela cultura alagoana?
Os ambientes turísticos estão lotados. Eles consomem também a cultura local. Não à toa, artistas locais são convidados para se apresentar fora do Brasil. Júnior Almeida e Everaldo Borges já viajaram para a Europa. A cultura alagoana é bem-vinda por lá. Na praia do Gunga, por exemplo, alguns locais tocam e dão CDs como souvenir. O que falta mais é o alagoano valorizar o alagoano, pois os de fora valorizam e muito.
O que deve ser feito para inserir a cultura local no dia-a-dia do alagoano?
A divulgação nos canais abertos de televisão e a união de todos os artistas. Não adianta a gente apenas criticar o poder local e a mídia. Os festivais são importantes. Por exemplo: em um festival poderia ser colocadas telas de artistas plásticos, imagens de fotógrafos alagoanos, peças dos artesãos. Poderia também fazer a abertura do festival com manifestações da cultura popular. São diversas ações que podem ser feitas para valorizar e incentivar a cultura. A rádio alagoana tem que tocar música alagoana sem “jabá” (quando é preciso pagar a emissora). Tocar porque é boa. Hoje em dia estão abrindo as portas, mas é necessário ir lá e bater.
Qual a sua mensagem para o jovem que não conhece a cultura alagoana?
Se abram, se arrisquem e se joguem! É preciso buscar outros valores e nada como a nossa cultura alagoana, tão rica e tão diversificada. Como diz a minha amiga Gal Monteiro: temos cultura para todos os gostos e bolsos. É preciso experimentar para depois dizer se é boa ou não. O importante é experimentar, consumir.