JORNAL COLEGIAL. ENTREVISTA DE DUDU FAGUNDES, O MAESTRO DAS RUAS

ENTREVISTA DE DUDU FAGUNDES, O MAESTRO DAS RUAS.

(Jornal) - Com se deu o seu interesse pelo mundo das artes ?

(Dudu) - Nasci e me criei em Senador Camará, comunidade com um dos menores índices de desenvolvimento humano do Brasil. Estudei a vida inteira em escola pública. Tive a graça Divinal de conhecer o mundo das artes dentro da própria comunidade através do contato com grandes mestres como Jair Batptista, Toninho, Isa dos Santos, Renatão, Roberto, Turino, Cesar Augusto, os sambistas do bloco carnavalesco Mobral do Amor entre outros. Depois o meu pai e meu avô que eram músicos oriundos do município de Duas Barras me ensinaram violão e teoria musical. Acho que arte entrou na veia criando uma espécie de dependência benéfica, não é atoa que nasci no dia 22 de Novembro, dia do músico.

(Jornal) - Porque você é conhecido como "O Maestro das Ruas do Brasil?"

(Dudu) - No final dos anos 90 eu estava com muitas dificuldades financeiras, desempregado, sem ter o que comer. Eu abria a porta da minha geladeira e só tinha água. Aí eu me ajoelhei no chão e pedi a Deus pra que desse uma solução na minha vida. Quando eu levantei já estava com uma ideia surreal na cabeça: de ir para o centro da cidade, parar em frente ao setor de registro musical da faculdade federal de música da UFRJ na Lapa com um banquinho, um violão velho e uma placa escrita: "Faz-se partituras para registro, o menor preço da praça." Eu sabia que muito compositor registrava música ali e que era exigido uma partitura musical, uma espécie de "DNA" da música. Um maestro cobrava uma fortuna por uma partitura, eu resolvi cobrar apenas dez reais. Passei muito tempo sem um cliente, sem ter o que comer, nem como voltar pra casa. Até que veio o primeiro, o segundo... hoje são mais de 45 mil compositores que já fizeram partituras musicais comigo. Aí passei a ser chamado de "Maestro das Ruas".

(Jornal) - Você é um diretor de cinema respeitado, como o cinema entrou na sua vida?

(Dudu) - Surgiu de uma profunda necessidade de documentar os artistas que passavam por mim na rua e me mostravam obras musicais e histórias de vida fantásticas. A principio eu escrevi um livro falando dessa gente, chama-se: "Novas Histórias da Velha Lapa." Mas um livro não era suficiente para registrar todo esse talento que eu ouvia privilegiadamente em meu banquinho no meio da rua. Resolvi fazer faculdade de cinema para poder fazer um filme com toda essa riqueza musical que o próprio Brasil desconhece.

(Jornal) - E como foi lançar esse filme fora do Brasil?

(Dudu) - Foi muito gratificante, um sentimento de missão cumprida, assistir emocionado a Europa aplaudir de pé o nosso trabalho. Eu tinha feito uma reunião antes de iniciar as gravações com os 150 compositores que participam do documentário e disse a cada um deles que esse projeto era um compromisso com o futuro. Para que as gerações futuras pudessem ver essa arte tão maravilhosa que eles faziam em seu tempo, em sua época. Como fiz tudo do meu próprio bolso, sem apoio, sem patrocínio, acabei demorando quatro anos para finalizá-lo. Muitos dos artistas documentados partiram sem deixar vestígios de suas existências. Uns não possuem nem fotos, nem gravações, nem nada. Graças a Deus esse filme existe e essa gente esta viva na tela, emocionando as plateias com suas histórias e suas canções.

(Jornal) - Você dirigiu vários filmes que têm por base a história do negro brasileiro. Isso é uma vertente sua?

(Dudu) - Na verdade meu cinema é voltado para as minorias, para a correção de injustiças. E uma das maiores injustiças cometidas nesse país foi contra o povo negro, que sofreu quase 400 anos de escravidão e como retribuição por erguer essa nação gigantesca, recebeu foi o abandono, a condenação as mais obscuras margens de nossa sociedade. É isso que trata os meus três últimos filmes: "Batacotô", "Memórias D'um Candongueiro" e "A Pedra". Mas tenho também um filme inédito com Chico Anysio, Nonato Buzar e Alcione, chama-se "Rio Antigo". É sobre uma época de ouro vivida por essa cidade, mas também uma homenagem a uma das canções mais perfeitas já produzidas no planeta, lançada pelos três e que pouca gente conhece, muito pouca gente fala sobre ela. Passei muito tempo com os três, esse filme será lançado no próximo ano. É a minha forma de corrigir injustiças.

(Jornal) - Você também é compositor. Como foi ver Daniela Mercury gravando sua música e sendo indicada ao Gremmy?

( Dudu) - Foi emocionante. Sobretudo por que essa música é um hino contra o preconceito racial e etá no cd "Carnaval Eletrônico", junto com Lenine, Carlinhos Brown, Toquinho, Gilberto Gil e outro abolicionistas pós-modernos. Somos todos iguais, miscigenados pela graça de Deus. Nelson Motta chama Daniela Mercury de "nossa rainha vingadora". , E nós somos juntos uma poderosa nação, uma mistura com a mesma estrutura, a beleza pura:

"Todo mundo aqui é branco e preto...

Todo mundo aqui é preto e branco"

Dudu Fagundes O Maestro Das Ruas
Enviado por Dudu Fagundes O Maestro Das Ruas em 27/02/2014
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