Vocês deveriam ler essa entrevista
Entro na banca de revistas para comprar algo. Sou um cara moderno. Se fosse pós-moderno, acessaria meu computador. Entrei e, olhando as capas, deparo-me com uma enorme foto em preto e branco (mais moderno impossível!) de um casal de ripongas (ultra moderno!) com seu filho pequeno, ocupando toda a capa. Era a revista Trip de setembro, edição 225. A foto era a chamada para a matéria principal daquela edição, sobre uma comunidade hippie que existiu no Havai na década de 1970, num terreno à beira mar cedido por um irmão da atriz Elizabeth Taylor.
Mas saindo da modernidade e sendo pós-moderno, digo que a entrevista referida no título desse texto não é a acima. Nada mais pós-moderno que ser pós-estruturalista, eh eh eh. Viva o rizoma! A entrevista a que me refiro é a com José Júnior, criador do AfroReggae. Inclusive a mesma edição da revista vem com duas capas distintas (bem pós-moderno isso, se bem que revista impressa é algo moderno...): a dos ripongas e uma com o José Júnior, toda vermelha, com ele na capa. Por essa capa (imagem acima), confesso, não teria comprado a revista.
Depois de ler a matéria muito legal sobre a comunidade hippie (Taylor Camp era o seu nome), fui ler a entrevista do Júnior. Gente, o título não diz exatamente o que é a alma da entrevista, embora revele seu mote principal: Marcado Para Morrer. José Júnior está sentenciado a morte pelo narcotráfico carioca e vive sob proteção policial permanente do Core, a tropa de elite da polícia civil do Rio de Janeiro.
Pela entrevista, a gente fica sabendo que ele, de mediador de conflitos entre polícia e traficantes nos morros, devido a sua relação com os últimos, passou a “condenado” por sua briga com um pastor evangélico que supostamente seria testa de ferro do tráfico. Depois da prisão do tal pastor, várias sedes do AfroReggae tem sido atacadas. O básico é isso. Mas o interessante são as coisas que ele diz na entrevista, das quais reproduzo uma pequena parte aqui para vocês, por entender que isso deve ser divulgado, que é de interesse geral.
“Trip - Todo morador do Rio reconhece os benefícios da polícia de pacificação [UPPs nos morros]. Mas há críticas: ditadura policial nas comunidades, repressão contra os jovens, nenhum investimento social... O que acha dessas críticas? Júnior – Concordo. Mas essa mesma juventude que está reivindicando nunca criticou o tráfico, que faz uma ditadura dez mil vezes pior que a dos policiais. Hoje, só de poderem se manifestar, contra a polícia e contra o governo, já é um caminho melhor”.
“Trip – Você nunca pode sair sem a escolta? Júnior – Não. Ninguém nunca tinha dito não pro narcotráfico antes. Fui a primeira pessoa talvez na história a dizer que na ia seguir ordens deles. Ou eu fecho o AfroReggae ou vão me matar? Como acatar uma parada dessa?”
“Trip – Mudou também o perfil do tráfico no Rio? Uma vez você disse que só encontrava bandido doido para largar o crime. Júnior – Continua todo mundo doido pra sair. O fato ocorrido com o AfroReggae foi sinal de fraqueza. Se o tráfico estivesse forte, eu já teria morrido. Nesse momento, temos que dar apoio à política de pacificação. Quem quer o bem do Rio de Janeiro tem que querer que certas políticas avancem e a pacificação é uma delas. Desde que começou a pacificar, são menos 100 mil balas que a polícia gasta. Isso pode significar menos 100 mil pessoas mortas”.
Na entrevista tem muito mais que isso. Interessantíssima. É uma entrevista que deve ser lida, recomendo. É só colocar “marcado para morrer José Júnior” no Google que ela vem (http://revistatrip.uol.com.br/revista/225/paginas-negras/jose-junior.html).
Texto publicado na seção de Opinião do Jornal Portal de Notícias: http://www.portaldenoticias.com.br
Entro na banca de revistas para comprar algo. Sou um cara moderno. Se fosse pós-moderno, acessaria meu computador. Entrei e, olhando as capas, deparo-me com uma enorme foto em preto e branco (mais moderno impossível!) de um casal de ripongas (ultra moderno!) com seu filho pequeno, ocupando toda a capa. Era a revista Trip de setembro, edição 225. A foto era a chamada para a matéria principal daquela edição, sobre uma comunidade hippie que existiu no Havai na década de 1970, num terreno à beira mar cedido por um irmão da atriz Elizabeth Taylor.
Mas saindo da modernidade e sendo pós-moderno, digo que a entrevista referida no título desse texto não é a acima. Nada mais pós-moderno que ser pós-estruturalista, eh eh eh. Viva o rizoma! A entrevista a que me refiro é a com José Júnior, criador do AfroReggae. Inclusive a mesma edição da revista vem com duas capas distintas (bem pós-moderno isso, se bem que revista impressa é algo moderno...): a dos ripongas e uma com o José Júnior, toda vermelha, com ele na capa. Por essa capa (imagem acima), confesso, não teria comprado a revista.
Depois de ler a matéria muito legal sobre a comunidade hippie (Taylor Camp era o seu nome), fui ler a entrevista do Júnior. Gente, o título não diz exatamente o que é a alma da entrevista, embora revele seu mote principal: Marcado Para Morrer. José Júnior está sentenciado a morte pelo narcotráfico carioca e vive sob proteção policial permanente do Core, a tropa de elite da polícia civil do Rio de Janeiro.
Pela entrevista, a gente fica sabendo que ele, de mediador de conflitos entre polícia e traficantes nos morros, devido a sua relação com os últimos, passou a “condenado” por sua briga com um pastor evangélico que supostamente seria testa de ferro do tráfico. Depois da prisão do tal pastor, várias sedes do AfroReggae tem sido atacadas. O básico é isso. Mas o interessante são as coisas que ele diz na entrevista, das quais reproduzo uma pequena parte aqui para vocês, por entender que isso deve ser divulgado, que é de interesse geral.
“Trip - Todo morador do Rio reconhece os benefícios da polícia de pacificação [UPPs nos morros]. Mas há críticas: ditadura policial nas comunidades, repressão contra os jovens, nenhum investimento social... O que acha dessas críticas? Júnior – Concordo. Mas essa mesma juventude que está reivindicando nunca criticou o tráfico, que faz uma ditadura dez mil vezes pior que a dos policiais. Hoje, só de poderem se manifestar, contra a polícia e contra o governo, já é um caminho melhor”.
“Trip – Você nunca pode sair sem a escolta? Júnior – Não. Ninguém nunca tinha dito não pro narcotráfico antes. Fui a primeira pessoa talvez na história a dizer que na ia seguir ordens deles. Ou eu fecho o AfroReggae ou vão me matar? Como acatar uma parada dessa?”
“Trip – Mudou também o perfil do tráfico no Rio? Uma vez você disse que só encontrava bandido doido para largar o crime. Júnior – Continua todo mundo doido pra sair. O fato ocorrido com o AfroReggae foi sinal de fraqueza. Se o tráfico estivesse forte, eu já teria morrido. Nesse momento, temos que dar apoio à política de pacificação. Quem quer o bem do Rio de Janeiro tem que querer que certas políticas avancem e a pacificação é uma delas. Desde que começou a pacificar, são menos 100 mil balas que a polícia gasta. Isso pode significar menos 100 mil pessoas mortas”.
Na entrevista tem muito mais que isso. Interessantíssima. É uma entrevista que deve ser lida, recomendo. É só colocar “marcado para morrer José Júnior” no Google que ela vem (http://revistatrip.uol.com.br/revista/225/paginas-negras/jose-junior.html).
Texto publicado na seção de Opinião do Jornal Portal de Notícias: http://www.portaldenoticias.com.br