Entrevista
 
       Um livro é como um filho: bonito ou feito, o pai o ama, e procura defendê-lo contra invasões e agressões que lhe tira a paternidade, e o fere no brio da criação; a vida me ensinou contudo que os sebos (alfarrábios) são o cemitério das vaidades. Amo, como virtude, a dignidade sem ostentação, a bondade viril sem artifícios, bens recebidos na casa paterna.
       Não me esqueço do que aprendi com inesquecível mestre: muito me aborrece deixar as coisas pela metade. Posso não tocar num assunto, dizia ele, mas se nele toco, tenho de levá-lo até o fim: nada deve ficar na sombra.
       A reputação de um economista, dentista, padeiro, pedreio, depende apenas do que ele faz.
       Liras ao Vento terá uma segunda edição, literalmente revisada e, quem sabe, melhorada. Assim é e deve ser a vida.
       Para orgulho de uns e desespero de outros o jornal Estado de Minas, edição do dia 17 e 23 de junho de 2012, estampa em sua primeira página: "AS MARCAS DA TORTORA SOU EU, FAZEM PARTE DE MIM. NÃO TENHO QUALQUER SENTIMENTO, NEM ÓDIO, NEM VINGANÇA, TAMPOUCO PERDÃO" ( DILMA VANA ROUSSEFF, hoje a presidente do Brasil)  A repórter Sandra Kiefer, que obteve documentos inéditos em que Dilma relata ter sido pendurada por seus algozes mineiros no pau de arara, apanhado de palmatória e levado choques e socos que a marcaram para o resto da vida. "Me deram um soco e o dente se deslocou e apodreceu".
       Chesterton, Gilbert Keith (1874-1936) na época muito badalado: Quem fica louco náo é o poeta que põe a cabeça na lua, mas o físico que quer por a lua na cabeça..." A classe média brasileira sempre foi e continua reacionária. É uma pena! Eu já vivi um pouco de tudo. O convívio intimo com a ciência mais abstrata me mostrou na carne as ambiguidades desse tipo de pensamento, e posso afirmar que o que digo hoje nas reflexões de Liras não são reflexões generalizantes, mas, para mim, verdades profundamente vividas e sofridas. Liras ao Vento não foi idéia minha - mas uma... "cobrança"?  Quando se tem a coragem de se despir publicamente várias podem ser as consequências: reprovação ou aprovação  - isso acontece quando a teia das emoções envolvem fatos e personagens do nosso cotidiano. Assim é a vida!
       "Como místico busquei a transcendência. Foi uma fase intensamente voltada para dentro de mim mesmo, muito poética mas também muito solitária. E o que escrevi nessa fase refletiam ao mesmo tempo essa busca de fusão e essa profunda solidão. Meu desejo de participar, de não ficar à margem dos acontecimentos, com o sentimento que me ligava à transcendência, mas através do Cristo encarnado no mais probre dos pobres". Isso é AMOR. O que me norteia é o compromisso com a minha própria consciência, com a minha verdade interna. De repente descobri que até então eu encontrava uma saída coletiva, e não a minha individual. Tenho procurado o meu caminho. Tudo o que se afasta do caminho tradicional, do roteiro-estabelecido, é condenado, massacrado, amarrado e preso numa cruz. Exemplo: O Cristo Jesus.
       Hoje, parece que já faz parte da consciência coletiva que é preciso uma profunda transformação nas relações humanas, e imediatamente para que se reverta esse quadro de incerteza.
       Isto quer dizer que, visto assim levianamente, o fim da história pode ser o fim do mundo 
       A auto-suficiência do homem tradicionalmente  requer  a mulher como sua propriedade na relação com os outros. O homem  heróico é aquele que vive isolado, que não precisa de ninguém, aquele que é capaz de viver errante em busca de aventuras.
       Tal como Ulisses, que durante vinte anos andou o mundo inteiro e depois de tudo acabado volta a sua casa e encontra Penélope, esperando-o. E o símbolo de Penélope é muito interessante: ela era aquela que desmanchava de noite tudo aquilo que criara durante o dia. O mito mostra o homem sendo obrigado a criar para sobreviver num mundo hostil e a mulher, passiva, esperando sempre e sempre destruindo o que cria. Nos contos de fadas tudo termina de maneira feliz. Mas Branca de Neve, Cinderela ou a Bela Adormecida são mulheres que esperam passivamente o princípe salvador. Por outro lado, na saga de Peer Gynt, de Ibsen, o herói que vagou a vida inteira vem morrer nos braços da noiva virgem que deixara há muitos anos e lhe permanecera sempre fiel. (Muraro, Rose Marie, in "Os seis meses em que fui homem", ed Rosa dos Ventos, 4a. ed, Rio de Janeiro-RJ, 1991)
       A mulher deve ter uma conexão íntima e não uma oposição, uma intimidade e não um controle com o mundo e com os outros sem se perder.
       Só os poetas e os místicos, os artistas e os criadores são capazes, entre os homens, de alcançar essa intimidade, e por isso são reconhecidos como marginais pelos outros homens. A subjetividade é alocada à mulher e a objetividade ao homem, e os homens subjetivos, por mais importante que seja a sua missão cultural, são sempre desvalorizados. O mundo da reflexão importuna quem concentra coisas e coleciona espelhos". O sufoco dos afetos mal resolvidos desfazem a pulsão de vida".
                                            
                                              "A esta hora da noite
                                               ninguém passando na rua
                                               só o sereno e a lua
                                               somente a rua na rua" 
                                                     (Cora Coralina)

       É apenas na segunda metade da vida, no seu caminhar para a morte, que começa o princípio da individuação. Segundo Jung, a individuação é um novo tipo de conexão com o outro e com o mundo. Já maduro, o homem é capaz de voltar a se relacionar com o mundo e com os outros a fim de cumprir a sua plenitude. Se a cruz é lugar de martírio, é também o lugar das melhores esperanças.

 
Roberto Gonçalves
Escritor