Entrevista - ZULU DE ARREBATÁ (Música & Poesia) - SP
(Zulu de Arrebatá, 56 anos, ícone da musicalidade negra de São Miguel, está bem. Cheio de projetos e ideias, é ele mesmo que nos diz isso.
Em bate-papo logo depois de seu show no Casa de Farinha (mix de restaurante, open bar e casa de espetáculos de São Miguel Paulista), naquela noite gostosa de julho, ele – na companhia dos poetas Santiago Dias e Guiberto Genestra, novos parceiros – deu sua contribuição para o projeto “Bentevi, Itaim”, que visa levantar fundos para o lançamento do livro e cd com poemas de Akira Yamasaki. Aproveitou para fazer reflexões profundas sobre suas experiências artísticas e pessoais)
EF – Como foi participar deste projeto (Bentevi, Itaim)?
Zulu de Arrebatá – É uma imenso prazer ter sido convidado para participar deste projeto, até porque a maioria das pessoas são conhecidas, além dos outros que chegaram.
Fiz uma surpresa para o Akira, que tem o projeto de construção de seu livro e todo esse trabalho, já que o projeto vem contribuir para isso. Fico muito honrado de estar participando de alguma forma. Um projeto dessa natureza tem uma importância aqui pra São Miguel, assim como outros movimentos que existem na zona leste e em outros cantos da cidade. Isso ajuda a manter viva essa força de toda a nossa produção, que foi e continua sendo pólo irradiador para uma série de coisas que acontecem.
Nós, da zona leste, mais precisamente de São Miguel – que é o lugar onde moro e atuo – sinto que aqui é um grande centro cultural, sem querer ser bairrista, talvez já sendo. S. Miguel tem uma coisa especial, uma história que data desde 1622 mas é anterior a isso. E a gente, por conta dessa história e a do Movimento Popular de Arte que, como tantos outros, começaram a pipocar pelo Brasil com o advento da democracia, dessa abertura, essas coisas todas, esses projetos pipocaram - tem o Jaguaribe Carne lá na Paraíba, com o Chico César na Secretaria de Cultura do estado e o Pedro Osmar, como secretário adjunto - e é tudo amigo da gente. São pessoas da área também e isso pra mim é muito importante. Como o Edvaldo Santana e tantos outros.
Sendo muito importante qualquer evento de natureza artística, nós estaremos juntos, contribuindo de alguma forma para a transformação das pessoas. A arte é um veículo que a gente utiliza para que essas coisas aconteçam.
EF – E o que você acha deste espaço, a Casa de Farinha, onde está rolando o projeto “Bentevi, Itaim”?
Zulu de Arrebatá – Posso dizer que sou um privilegiado. Fui convidado para conhecer essa casa no ano passado, através do Arnaldo Bispo, advogado, contador de "causos" e que por algum momento foi subprefeito em Ermelino Matarazzo. Ele me contou, “vamos numa casa de farinha, um espaço cultural que existe ali pros lados da Vila Mara, na Vila Barboza". Cheguei aqui e fiquei impressionado porque vi uma roda de carroça e o nome do lugar é Casa de Farinha, bastante sugestivo.
Fui apresentado ao dono da casa, o dr. Xavier, um cara que gosta de música e aos poucos fui conversando, fiquei sabendo que a família dele é da Congregação Cristã no Brasil, onde eu fui criado, minha família é da Congregação e da Assembléia de Deus. E no fim dessa história toda, eles conheciam meus pais, meu irmão, que toca na orquestra de uma dessas igrejas, e assim foi.
Mais ou menos em setembro do ano passado sugeri ao Xavier que a gente fizesse um show aqui e comecei a contar a história dos artistas de S. Miguel, e pra minha felicidade ele já conhecia e era muito fã de Sacha Arcanjo. Quando adolescente, ele assistia ao MPA-Circo, e falou, “aquilo ficou em minha cabeça”. E me disse, “você conhece Sacha?” Eu disse “sim, é meu parceiro mais constante na música”.
Acabei fazendo esse show aqui. Aí o Ronaldo Ferro pintou, uma sintonia que o Akira faria 60 anos, quiseram fazer uma homenagem a ele, confeccionando um livro com 60 poemas dele. Surgiu então uma segunda homenagem para nosso querido amigo que já não está mais entre nós, o Raberuan. Aí pintou este projeto Bentevi – que é uma música do Raberuan (nota: em parceria com o Akira Yamasaki) - onde todas as pessoas e artistas, sejam músicos, poetas ou atores, participando diretamente, tendo como objetivo angariar fundos para este projeto.
Essa é uma situação. A outra é o IPEDESH (nota: Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Social e Humano, organização não governamental sediada em São Miguel), que é um instituto que surgiu dentro de uma oficina de lideranças comunitárias, essa coisa toda, e no final deste projeto surgiu o IPEDESH, que tem como objetivo resgatar alguns artistas que até o presente momento não tiveram condições de fazer o seu trabalho musical individual, ou livro, até o momento mais focado na questão do disco.
Essas coisas são importantes por quê? Porque os meios de comunicação de massa, que têm tudo para produzir, tem público pra tudo nesse mundo, né? Tem aquelas coisas que são de bom gosto e outras não priorizam a questão do gosto daquilo que se faz.
Não estou preocupado com essa questão, se vai tocar no rádio ou não. A gente tem essa energia que é estar sempre junto, trocando figurinha, contribuindo, solidário com todas as formas de projeto que venham a transformar alguma coisa.
Só por isso já é fundamental estar num projeto como o “Bentevi, Itaim”.
EF – Fale um pouco sobre sua carreira:
Zulu de Arrebatá – Costumo dizer que sou um cantor e compositor mas não sou daqueles que compõem a toda hora. Componho sim, uma hora ou outra, gosto muito de trabalho em parcerias. O Guiberto Genestra (poeta) é um cara que contribui muito para isso. Para esse ano tenho um projeto que sai um pouco fora do meu jeito de fazer, um disco de bossa nova. Gosto muito de bossa, soul, jazz... estou num momento de escolha de repertório, começo de ensaios para fazer um trabalho de pérolas e não pérolas. É um ritmo que gosto muito.
Também continuo compondo, pretendo voltar para a faculdade de História e simultaneamente pretendo fazer outro disco com a cara bastante diferente de como foi o Amor Urbano (primeiro cd), pretendo novas parcerias também, mas o conceito do disco vai ser completamente diferente do outro.
Estou muito feliz nesse momento, conhecendo bastante pessoas que estão somando na construção dessas idéias que estão pintando por aí.