MS- Norma Blum,quem é você?
NB- Uma mulher. Uma atriz. Uma mãe. Uma amiga. Uma apaixonada pela vida, pela natureza, pela arte. Uma pessoa feliz.

MS- Você morou uns tempos no Paraná. Como foi essa experiência?
NB- Foram apenas três meses no verão. Eu tinha nove anos de idade. Meu pai, grande professor de Inglês, foi convidado a dar aula para os filhos de um fazendeiro de café e gado. Ficamos na fazenda e tenho maravilhosas lembranças.
MS- Como iniciou sua carreira?
NB- Aos doze anos fui ser auxiliar do meu pai no programa Aulas de Inglês na TV Tupi do Rio. Representávamos pequenos trechos de peças inglesas. O produtor e diretor Jacy Campos então me convidou para fazer o personagem principal da peça Nossa Cidade no programa dele Câmera Um. A partir daí passei a trabalhar no Noite de Gala de Geraldo Casé, Teatrinho Infantil de Fábio Sabag e Grande Teatro Tupi de Sérgio Britto e Fernando Torres. Aos 18 anos estreei no teatro com o mesmo personagem Emily de Nossa Cidade. Aos 14 já tinha feito meu primeiro longa metragem Sai de Baixo, direção de J.B.Tanko, no papel de mocinha, para o qual fui escolhida após um teste.
MS- Fale um pouco do seu passado, sua família.
NB- Minha família austríaca veio ao Brasil para fugir da Segunda Guerra Mundial. Meu tio avô já morava no Rio desde 1920. Meu avô paterno era um virtuose do violino e tive o privilégio de conhecer as músicas do folclore alemão além de muita música erudita quando muito novinha.
MS- Qual a sua posição em relação a Frau Herta? Foi um papel difícil?
NB- Frau Herta foi a vilã da novela Ciranda de Pedra da TV Globo. Uma nazista fanática e autoritária. Foi difícil porque meus avós eram judeus e tinham fugido da guerra. Mas todo papel de vilã é um grande desafio para uma atriz. Temos que lutar com o nosso lado sombrio. Foi sucesso.
MS- Vc acompanha o trabalho de novos autores?
NB- Sim. Procuro sempre estar informada. Adoro o trabalho da dupla Thelma Guedes e Duca Rachid. Há um autor ainda novato e muito talentoso chamado Xandy Novaski. Fiquemos atentos aos seus futuros trabalhos.
 Também gosto de ver os colegas novos e antigos na tevê, no teatro e no cinema. O Brasil tem muitos talentos na arte de representar.
MS- - O que mudou no ofício de ator desde que vc começou no radioteatro (em meados dos anos 40)?
NB- Comecei na tevê no início dos anos 50. A maioria dos atores vinha do rádio e do teatro. Não havia o saber fazer televisão. Aprendemos na marra. Durante os primeiros dez anos a programação era ao vivo, como se fosse um teatro filmado na hora. Não existia a gravação porque o videotape só foi introduzido em 1962. Por esse motivo não existe registro dos grandes programas que foram ao ar naquele tempo. Algumas verdadeiras obras primas.
Os atores dessa época faziam muito teatro e estudávamos muito.
Hoje a gravação em HD permite uma série de efeitos especiais para a tevê. Sinto que muitos atores jovens não estudam para se aprimorar. Representar é a arte da repetição e do aprofundamento. Cultura geral é requisito primário.
Os anos de tevê ao vivo foram uma maravilhosa escola de interpretação prática. E de agilidade mental e para trocar de roupa em segundos.
MS- Que caminhos deve seguir um jovem ator brasileiro que deseje fazer sucesso em Hollywood? E  no  Brasil  ?
NB- Saber Inglês fluente. Fazer carreira de sucesso no cinema primeiro no Brasil. Estudar, estudar, estudar.
MS- Norma, é a Tv que sustenta os atores que desejam enveredar ou permanecer no teatro?
NB- Cada caso é um caso. A visibilidade na tevê pode garantir o público no teatro. Porém com os custos altíssimos de produção teatral e aluguel de teatros hoje a arte precisa de patrocínio forte. Pela Lei de incentivos Rouanet ou por outros meios.
MS- O que pensa das telenovelas de hoje? Há quem veja um esgotamento do gênero.
NB- Não penso assim. É verdade que tem havido alguma repetição nas tramas. Mas o Brasil ainda produz as melhores novelas do mundo. Claro que o público, principalmente os jovens, migrou para outras mídias. No entanto com a sofisticação cada vez maior e recursos mais fortes a novela ainda seduz no Brasil e no exterior.
Claro que dos anos 60 aos anos 90 havia novelas com tramas mais fortes e centradas em menos atores, geralmente escritas por um único autor ou por uma dupla. Hoje há uma profusão de núcleos o que deixa muitas tramas com seus fios de conexão perdidos. Os protagonistas (do tempo em que eu fiz algumas na TV Globo) tinham muito mais cenas fortes.
MS- Por que, nos últimos 20 anos, os produtores culturais brasileiros
passaram a depender tanto de patrocínios e leis de renúncia fiscal?

NB- Porque o Brasil não investe em sua indústria, em nenhum segmento. Então a cultura passa a depender dos mecenas ou dos incentivos governamentais.
MS- Os artistas consagrados também ouvem "nãos"?
NB- Praticamente todos os dias. Estive doente no ano passado. Agora estou com ótima saúde e buscando um papel mas até agora não tive nenhum convite.
MS- Por ser uma atriz consagrada e respeitada pela crítica e pelo público alguma vez recusou um convite com medo de comprometer sua imagem?
NB- Não me lembro de ter recusado nenhum papel em cinema ou tevê. No teatro já tive que dizer não quando o texto a mim submetido era muito fraco.
MS- Qual o seu mais importante papel na TV?
NB- Além de muitos que fiz no Grande Teatro Tupi durante o período do ao vivo, destaco a Julieta de Shakespeare num espetáculo da TV Continental do Rio.
Além de Aurélia Camargo em Senhora, Suzana em Vejo a Lua no Céu, Frau Herta em Ciranda de Pedra, Malvina em Escrava Isaura, todas na Globo.
MS- De q/ vc tem medo?
NB- De parar de trabalhar com o meu ofício.


MS- Como foi sua relação com a ditadura militar?
NB- Péssima. Lutamos muito contra a censura nos meios artísticos. Participei de muitas passeatas. A gente vivia em assembléia permanente contra a repressão.
MS- Fale um pouco dos livros q/ vc escreveu.
NB- O primeiro foi Exorcize Sua Bruxa Madrinha (também publicado na Espanha). Depois vieram Palavra de Anjo, Falando com Anjos, Energia Positiva. Gosto muito do livro infantil que escrevi O Dragãozinho Sonhador. Infelizmente todas as obras estão esgotadas. Meu último livro foi minha biografia (Muitas Vidas – Vida e Carreira de Norma Blum) que saiu pela Coleção Aplauso da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo.
MS- Vc se sente uma pessoa realizada tanto profissional como pessoa?
NB- Sim. Como pessoa porque criei meus filhos e todos estão bem.
Mas como profissional falta muita coisa. Quero trabalhar sempre como atriz.
MS- Qual é o seu maior anseio, hoje?
NB- Voltar a fazer cinema. Há vinte anos estou esquecida. Adoro a linguagem cinematográfica.
Tenho um convite para um grande papel num seriado policial com ótimos atores brasileiros e um americano de renome. Estou torcendo para que a produção engrene logo. O título por enquanto é Coroa Reformada e eu farei a própria. Mas todo o resto ainda é segredo. Também estou fazendo pesquisa para escrever um romance sobre sete mulheres da mesma família.
NB- Como você encara a velhice?
NB- Com muito empenho em não deixar a mente, o coração e o espírito envelhecer.
MS- O que você faz para se manter tão bem fisicamente?
NB- Na verdade não faço nada.
MS- Qual a sua relação com a fama e o dinheiro?
NB- A fama veio muito cedo, no princípio da adolescência, razão porque ela sempre me pareceu natural. Ela era mais duradoura antigamente. Agora tudo se resume aos quinze minutos de fama como citado por Andy Warhol. Se estamos numa novela de sucesso somos mais interpelados nas ruas. Tenho fãs que conversam comigo e lembram dos meus primeiros papéis. Isto é gratificante. Mas hoje em dia tudo é muito efêmero. Não ligo para isto.
Quanto ao dinheiro nunca foi muito. Tive que criar muitos filhos sem muita ajuda dos pais. Ainda preciso trabalhar para me sustentar hoje aos 72 anos de idade.
MS- Dessa a gente não pode escapar: Que conselho profissional daria ao jovem que começa?
NB- Estudar, ler sobre tudo e qualquer coisa. Fazer com paixão qualquer papel por menor que seja. Sem paixão não há profissão.


MS- Como vc vê o Brasil, hoje?
NB- Com muito desencanto. Corrupção e violência, péssima distribuição de renda, injustiça social. Saúde e educação precárias. Fico triste. O Brasil tinha tudo para ser um grande país.
MS-Os desmandos,a corrupção desenfreada lhe incomoda?
NB- Já respondi acima.
MS- Cite bons amigos que chegaram através do trabalho.
NB- Marcelo Del Cima, um pesquisador. Mauro Alencar, jornalista e escritor, doutor em novelas, Priscila Camargo, Berta Loran, Zeca Prudente, atores. E mais um sem fim de pessoas especiais entre colegas e conhecidos de uma vida inteira.

MS- O que é felicidade,para vc?

NB- Estar em paz comigo. Curtir minhas plantas e meus animais de estimação. Ficar com os familiares. Escrever. Trabalhar, trabalhar, trabalhar.
MS- Como foi, para você participar do excelente livro da Rogéria Gomes sobre o teatro brasileiro e suas Damas maravilhosas? Viajei lendo esse livro...
NB- Uma honra por ser incluída entre tantas damas de nossa arte e cultura. Através do meu depoimento fiquei muito amiga da autora, a jornalista Rogéria Gomes, mais uma aquisição de amizade através do trabalho.
MS- Norma,agradeço a oportunidade de entrevistar você, uma das figuras mais importantes da cena brasileira e uma pessoa que sempre me marcou pela beleza e elegância; e, não estou me referindo apenas ao físico.Além, é claro, do indiscutível talento.
Muito axé para  você!

NB- Axé para você também e obrigada pela oportunidade.
 Norma

NÃO PERCAM,HOJE,"AS BRASILEIRAS"COM NORMA BLUM NUM PAPEL CÔMICO.
TV GLOBO,CONFIRA A PROGRAMAÇÃO
Miriam de Sales Oliveira
Enviado por Miriam de Sales Oliveira em 08/03/2012
Código do texto: T3541963
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