ANTÔNIO BARRETO É ENTREVISTADO POR VALDECK ALMEIDA DE JESUS

Antônio Barreto, nascido nas caatingas do sertão baiano, em Santa Bárbara, Bahia, no Brasil. Professor, poeta e cordelista. Amante da cultura popular, dos livros, da natureza, da poesia e das pessoas que vieram ao Planeta Azul para evoluir espiritualmente. Graduado em Letras Vernáculas e pós graduado em Psicopedagogia e Literatura Brasileira. O terceiro livro de poemas, Flores de Umburana, foi lançado em dezembro de 2006 pelo Selo Letras da Bahia. Vários trabalhos foram publicados em jornais, revistas e antologias, além de mais de 100 folhetos de cordel, abordando temas ligados à Educação, problemas sociais, futebol, humor e pesquisa, entre vários títulos ainda inéditos. Autor de músicas na temática regional, como toadas, xotes e baiões.

VALDECK: Quando e onde nasceu?
ANTÔNIO BARRETO: Eu nasci, Valdeck, há nove mil anos! Sei que muita gente não gosta de dizer a idade, todavia sou um canceriano convencido de que o tempo me enobrece, estou envelhecendo consciente da minha caminhada aqui no planeta azul. Em julho de 2012 (dia 10) estarei completando 57 aninhos, com perfil e vigor de um rapaz de trinta! Nasci em 1955, na fazenda Boa Vista, Santa Bárbara (sertão baiano). Era domingo de sol esturricado, sem praia, sem os encantos desencantados das metrópoles. A parteira contou pra minha avó que eu já nasci cantando uma toada de vaqueiro. Acredite se quiser!

VALDECK: Já conhece o restante do Brasil? E outros países?
ANTÔNIO BARRETO: Eu ainda não conheço por completo o meu apartamento de quarto e sala (onde resido há 20 anos), imagine essa vastidão geográfica nas coxas da América do Sul! Para conhecer o meu país mais amplamente, necessito de muitas encarnações! Com relação ao além-mar, já pisei em outras terras: Espanha, Peru, Paraguai, Uruguai, Colômbia. Mas o que estou precisando mesmo, para minha evolução espiritual, é viajar cada vez mais para dentro de mim.

VALDECK: Como você começou a escrever? Por quê? Quando foi?
ANTÔNIO BARRETO: Comecei a escrever sendo conduzido pela mãozinha delicada da minha professora, lá pelos meus 10 anos! Mas o escrever poético só aconteceu a partir dos 27 anos. Costumava rabiscar versos livres e rimados nos cadernos escolares, mas não tinha o hábito de guardar. Depois dos trinta, me tornei mais organizado. Aos 40, comecei a mostrar os meus escritos aos amigos e a receptividade foi boa. Ganhei aprovação de pessoas sabedoras da arte poética e não parei mais de escrever.

VALDECK: Você escreve ficção ou sobre a realidade? Suas obras são mais poesias ou prosa? O que mais você gosta de escrever? Quais os temas?
ANTÔNIO BARRETO: Por ter formação em Letras Vernáculas, li Homero a Patativa do Assaré. Sou amante da prosa e da poesia, mas o gênero que sempre me encantou foi a poesia. Inclusive cheguei a escrever dois livros de poesia e estou com mais um no prelo. Confesso que foi através do cordel, essa arte popular encantadora, que me realizei e me tornei conhecido. E vale lembrar que no cordel nós temos a fusão do gênero narrativo com o lírico. Portanto a poesia e a prosa em ação.

VALDECK: Qual o compromisso que você tem com o leitor, ou você não pensa em quem vai ler seus textos quando está escrevendo?
ANTÔNIO BARRETO: Não é egoísmo, mas primeiro a preocupação é comigo, o escritor que se preocupa somente com os outros, acaba sendo mal sucedido. A filantropia, no ato de escrever, é algo relativo. Sempre parto do particular para o geral. Mas o que está fora acaba sendo a essência do que sou – e isso é o que chamamos de magia da escrita. Sou Antonio Barreto. Mas sou também o menino de rua, o retirante, as estrelas, a solidão do mundo, o vaqueiro, o eterno aprendiz, o mestre, as cores do arco-íris, as trevas, a luz, o Dom Juan, deus, o diabo, a ficção, a realidade, a arte do encantamento – enfim a essência de tudo que há.

VALDECK: O que mais gosta de escrever?
ANTÔNIO BARRETO: Quando mais jovem, gostava de escrever cartas de amor! Agora minha missão cármica é, humildemente, buscar o meu aperfeiçoamento através do cordel.

VALDECK: Como nascem seus textos? De onde vem a inspiração? E você escreve em qualquer hora, em qualquer lugar ou tem um ritual, um ambiente?
ANTÔNIO BARRETO: Às vezes escrevo por inspiração, sobretudo quando estou em contato com a natureza, mas estou perdendo essa habilidade, o sertão já virou mar! Quer dizer, habitando o submundo da cidade grande, me tornei mais técnico, sem jamais perder a ternura! Quanto ao ambiente, não há um local específico para escrever, costumo elaborar os meus versos dentro do transporte coletivo, no avião, fila de banco, no computador, me balançando numa rede etc.

VALDECK: Qual a obra predileta de sua autoria? Você lembra um trecho?
ANTÔNIO BARRETO: Não sei se devo chamar de obra, já que vivo cercado de tanta gente melhor que eu, de tantos gênios, mas o trabalho de minha autoria mais apreciado pelo público é o cordel “Big Brother Brasil - um programa imbecil”, que começa assim:

Curtir o Pedro Bial
E sentir tanta alegria
É sinal de que você
O mau gosto aprecia.
Dá valor ao que é banal,
É preguiçoso mental
E adora baixaria.
 
Há muito tempo não vejo
Um programa tão fuleiro
Produzido pela Globo
Visando ibope e dinheiro
Que além de alienar
Vai por certo atrofiar
A mente do brasileiro [...]

VALDECK: Seus textos são escritos com facilidade ou você demora muito produzindo, reescrevendo?
ANTÔNIO BARRETO: Depende do tema, da necessidade, das circunstâncias. Alguns cordéis eu elaboro em questão de minutos, outros em questão de horas. E também tem aqueles que venho escrevendo há anos. Ou seja, desde quando perambulava junto àquela mescla de raças lá na Península Ibérica!

VALDECK: Qual foi a obra que demorou mais tempo a escrever? Por quê?
ANTÔNIO BARRETO: “O caipira e a delegada”, que é um mini romance sobre a saga de um matuto que visita a cidade grande e acaba se apaixonando por uma delegada. Também teve outro cordel que demorei muito para elaborar: “Canto Lírico de um sertanejo”, em que faço uma ‘viagem’ poética à essência da minha infância na Fazenda Boa Vista (lá em Santa Bárbara):

Sou do seio das catingas
Lá das bandas do sertão
Carrego na veia a essência
Dos acordes do azulão
Do açum preto o sustenido
Da cigarra o alarido
Da coruja a solidão.
 
Sou o Pajé lá da floresta
O Xamã buscando a cura
De toda ferida aberta
Da mais profunda loucura
Sonho eterno de menino
Eu sou o badalar do sino
E o doce da rapadura.
 
Bode deserto no pasto
Apartado do rebanho
Asa Branca em retirada
Cobra que não tem tamanho
O tatu-bola escondido
Um lobisomem sofrido
Assanhaço sem assanho.
 
Sou caipira itinerante
Águas velozes do rio
Bem-te-vi anunciando
Que andorinha está no cio
O verão queimando a mata
Um cachorro vira-lata
Todas as noites de frio. [...]

VALDECK: Concluiu a faculdade? Pretende seguir carreira na literatura?
ANTÔNIO BARRETO: Como mencionei anteriormente, tenho licenciatura em Letras Vernáculas e sou pós graduado em Psicopedagogia e Literatura Brasileira. Não pretendo fazer mestrado, tampouco doutorado, já me sinto realizado nessa incursão ao mundo do conhecimento livresco, agora preciso de paz. Leio muito, mas sem a égide da obrigatoriedade. Descobri que o mundo da simplicidade é demasiadamente encantador!
 
VALDECK: Qual o escritor ou artista que mais admira e que tenha servido como fonte de inspiração ou motivação para seu trabalho?

ANTÔNIO BARRETO: Existem vários exemplos de simplicidade e grandeza no campo da literatura pelos quais fui influenciado. Costumo citar Patativa do Assaré, Manuel Bandeira, Mário Quintana, Leandro Gomes de Barros, Cecília Meireles, Khalil Gibran, Mark Twain.  E tantos outros.

VALDECK: O que você acha imprescindível para um autor escrever bem?
ANTÔNIO BARRETO: Não sei se sou a pessoa certa para responder corretamente a tua pergunta, Valdeck. Até porque não sei se escrevo bem!

VALDECK: Você usa o nome verdadeiro nos textos, não gostaria de usar um pseudônimo?

ANTÔNIO BARRETO: Nunca gostei de pseudônimo, que é bem diferente de nome artístico. O pseudônimo acaba permitindo que o autor do texto se esconda. Tenho a grandeza de responder pelos meus erros e acertos.

VALDECK: Como foi a tua infância?
ANTÔNIO BARRETO: Minha infância foi pra lá de bacana, fiz tudo aquilo que um menino sertanejo é capaz, embora fosse um garoto tímido! Mas traquinei sob luas e sóis: pescaria, corrida de saco, quebra-pote, picula, empinar arraia, montaria em cavalo e jegue, roubar manga no quintal do vizinho, banho de tanque, pau de sebo, jogo de gude, cavalo de pau, bicicleta, futebol, a arte circense me encantava! Mas a melhor brincadeira mesmo era uma que nós denominávamos de “brincadeira de médico” – Eta tempo bom!

VALDECK: Você é jovem, gasta mais tempo com diversão ou reserva um tempo para o trabalho artístico?
ANTÔNIO BARRETO: Sou um jovem entrando na fase do condor! Mas vou à praia, ao cinema, a eventos culturais, adoro viajar, dançar forró, tocar violão, gaita, namorar! Só não gosto de carnaval – essa festa tornou-se tão negativa que eu me afastei dela.

VALDECK: Tem um texto que te deu muito prazer ao ver publicado? Quando foi e onde?
ANTÔNIO BARRETO: Muitos deles. Em revistas, jornais, coletâneas. Aguardo ansiosamente a publicação de “A Cartomante” (uma versão minha, em cordel, do enigmático conto de Machado de Assis) que será publicada pela Editora Nova Alexandria (SP). Se Deus quiser – e Marco Haurélio também! Marco Haurélio é um cordelista baiano, residente em Sampa, responsável pelo projeto da “Coleção Clássicos em Cordel”, da referida editora.

VALDECK: Você tem outra atividade, além de escritor?
ANTÔNIO BARRETO: Sou professor da Rede Pública do Estado da Bahia, ensino há vinte anos na Escola Pedro Ribeiro. Brevemente estarei me aposentado e devo plantar um pé de sonho em outra estrela bem distante...

VALDECK: Você se preocupa em passar alguma mensagem através dos textos que cria? Qual?
ANTÔNIO BARRETO: Evidentemente. Penso, logo reflito! Por ser educador, estou sempre trazendo à baila minha partilha pedagógica com os alunos na sala de aula. Inclusive boa parte do que produzo está vinculada à educação.

VALDECK: Qual sua Religião?
ANTÔNIO BARRETO: Eta, meu Deus, e agora?!  Vou deixar para responder à sua pergunta na próxima entrevista!

VALDECK: Quais seus planos como escritor?
ANTÔNIO BARRETO: Aqui em Salvador a gente tem que ter cuidado ao anunciar os nossos planos, principalmente os planos mais nobres.  Existem muitas feras à espreita... Mas posso afirmar que muitas surpresas virão – no momento certo. Alea jacta est!!!

(*) Valdeck Almeida de Jesus é escritor, poeta e editor, jornalista formado pela Faculdade da Cidade do Salvador. Autor do livro “Memorial do Inferno: A Saga da Família Almeida no Jardim do Éden”, já traduzido para o inglês. Seus trabalhos são divulgados no site www.galinhapulando.com
Valdeck Almeida de Jesus
Enviado por Valdeck Almeida de Jesus em 24/02/2012
Reeditado em 25/02/2012
Código do texto: T3518170
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