Sóstenes por Sóstenes (SUENKA AQUINOVA)
O Solitário
Aos quatro meses de nascido, meus pais se separaram, ao menos sei assim, me contaram assim, no fundo acredito que eles se separaram antes, antes mesmo de eu nascer. Minha mãe teve outros filhos, meu pai também, mas sou o mais velho, o primogênito.
Passei a infância ouvindo os berros de minha mãe, que certamente gritava acreditando que aquela era a melhor maneira de se educar. Não tive muitos amigos nessa época, não tinha brinquedos, brinquedos trazem "amigos" quando somos crianças. Meus irmãos eram muito diferentes de mim, até hoje são, não brigávamos, mas também não brincávamos. O campinho de futebol da rua onde morávamos foi meu fiel companheiro, e todos aqueles meninos que ali apareciam para o baba, todos eles eram meus amigos, meus irmãos, os usurpadores de minha solidão infantil.
Cresci, um adolescente estranho se encontrava em mim: óculos fundo de garrafa, gostava de Raul, não de pagode, de ler não de dançar. Tive um amigo, o Beto, mas este perdeu-se com a maconha, e eu mais uma vez fiquei só. Minha mãe continuava a berrar, agora com mais violência, cobrava-me apoio financeiro, e eu tentava ajudar como podia. Duas namoradas na adolescência éramos muito diferentes, eu era estranho, foram apenas namoradas. A escola e os colegas constituíram o mais forte elo que tive na adolescência, hoje, quando a nostalgia pega-me despreparado, lágrimas correm em meu rosto expressando a voraz saudade em meu ser. O trabalho no barzinho, na lanchonete, na gráfica, no game, os carrinhos de mão empurrados a R$ 1,00, a bola, a escola, os colegas, a biblioteca da cidade, minha fiel companheira de muitas tardes, formaram a tertúlia de minha adolescência.
Mudo de cidade aos dezenove, vou morar só e me sinto cada vez mais só. O trabalho de professor permite-me o contato com muitas pessoas, mas a noite as músicas, os pernilongos, o travesseiro são meus únicos companheiros.
Muitas festas, algumas mulheres, nenhuma companheira. Uma namorada poetiza que escrevia para mim, mas ela só escrevia.
A proximidade com meus avós quebra em partes a nuvem negra da solidão, mas as mutações ocorreram, permitindo que ela permanecesse ao meu lado.
Outra namorada, uma filha, falta amor, continuo só.
Outro emprego de mesma função, outra cidade, outras pessoas, continuo só.
Outra namorada, outra filha, continuo só.
Hoje aos vinte e seis, vejo meu pai raramente, eu e minha mãe nos damos até bem, meus irmãos andam espalhados aos quatro cantos, minhas filhas não estão comigo, não tenho um grande amor. Hoje ao vinte e seis tenho o carinho de alguns colegas, de um ou dois amigos, meu irmão mais jovem me idolatra, meus avós me veneram, meus colegas de trabalho admiram-me, mas continuo só.
SUENKA AQUINOVA,
Ministra da Moda do Reino de Gorobixaba
O Solitário
Aos quatro meses de nascido, meus pais se separaram, ao menos sei assim, me contaram assim, no fundo acredito que eles se separaram antes, antes mesmo de eu nascer. Minha mãe teve outros filhos, meu pai também, mas sou o mais velho, o primogênito.
Passei a infância ouvindo os berros de minha mãe, que certamente gritava acreditando que aquela era a melhor maneira de se educar. Não tive muitos amigos nessa época, não tinha brinquedos, brinquedos trazem "amigos" quando somos crianças. Meus irmãos eram muito diferentes de mim, até hoje são, não brigávamos, mas também não brincávamos. O campinho de futebol da rua onde morávamos foi meu fiel companheiro, e todos aqueles meninos que ali apareciam para o baba, todos eles eram meus amigos, meus irmãos, os usurpadores de minha solidão infantil.
Cresci, um adolescente estranho se encontrava em mim: óculos fundo de garrafa, gostava de Raul, não de pagode, de ler não de dançar. Tive um amigo, o Beto, mas este perdeu-se com a maconha, e eu mais uma vez fiquei só. Minha mãe continuava a berrar, agora com mais violência, cobrava-me apoio financeiro, e eu tentava ajudar como podia. Duas namoradas na adolescência éramos muito diferentes, eu era estranho, foram apenas namoradas. A escola e os colegas constituíram o mais forte elo que tive na adolescência, hoje, quando a nostalgia pega-me despreparado, lágrimas correm em meu rosto expressando a voraz saudade em meu ser. O trabalho no barzinho, na lanchonete, na gráfica, no game, os carrinhos de mão empurrados a R$ 1,00, a bola, a escola, os colegas, a biblioteca da cidade, minha fiel companheira de muitas tardes, formaram a tertúlia de minha adolescência.
Mudo de cidade aos dezenove, vou morar só e me sinto cada vez mais só. O trabalho de professor permite-me o contato com muitas pessoas, mas a noite as músicas, os pernilongos, o travesseiro são meus únicos companheiros.
Muitas festas, algumas mulheres, nenhuma companheira. Uma namorada poetiza que escrevia para mim, mas ela só escrevia.
A proximidade com meus avós quebra em partes a nuvem negra da solidão, mas as mutações ocorreram, permitindo que ela permanecesse ao meu lado.
Outra namorada, uma filha, falta amor, continuo só.
Outro emprego de mesma função, outra cidade, outras pessoas, continuo só.
Outra namorada, outra filha, continuo só.
Hoje aos vinte e seis, vejo meu pai raramente, eu e minha mãe nos damos até bem, meus irmãos andam espalhados aos quatro cantos, minhas filhas não estão comigo, não tenho um grande amor. Hoje ao vinte e seis tenho o carinho de alguns colegas, de um ou dois amigos, meu irmão mais jovem me idolatra, meus avós me veneram, meus colegas de trabalho admiram-me, mas continuo só.
SUENKA AQUINOVA,
Ministra da Moda do Reino de Gorobixaba