ENREVISTA ( Celismando Sodré)
Entrevista concedida por Celismando Sodré a Tereza Cristina S. Abade, poeta e professora graduada em letras pela FTCead.
1)Como surgiu a vontade de escrever poemas e narrar histórias?
R- Escrever poemas foi uma vontade de adolescente, lá pelo início dos anos oitenta, ao ler autores como Carlos Drummond, Vinicius de Moraes, Jailda Santana, as letras das musicas de compositores e cantores que eu gostava como Milton Nascimento, Caetano Veloso, Chico Buarque, Zé Ramalho e outros, os primeiros poemas lidos nos livros didáticos, literatura de cordel, romances e revistas em quadrinhos. Todas estas referencias mexiam com a imaginação e com os sonhos de um garoto tímido que começou a rabiscar seus primeiros versos num velho caderno que era guardado a sete chaves, Quanto às histórias, isso foi bem depois, já havia lançado meu primeiro livro de poemas e sempre ouvia atento, as narrativas de casos e acontecimentos interessantes e engraçados da minha cidade e região, despertando o interesse de um dia registrar algumas dessas histórias em livro, o que veio a acontecer no segundo e terceiro livro.
2)Em sua obra é possível perceber você como um observador, um leitor não só do universo das letras, mas também um leitor do mundo. Essa é uma característica essencial para um autor?
R- O grande escritor russo Leon Tolstoi já dizia que “ Ninguém se torna universal sem escrever sobre sua aldeia”, por isso que devemos estar antenados com nossa aldeia e também com o mundo que nos cercam, escrever é uma conseqüência do hábito da leitura”, geralmente, escreve bem que ler muito para estar inserido no mundo, procurando sempre a compreensão dos acontecimentos e fenômenos. Mesmo você estando preso em um lugar, mas através da leitura você pode viajar em sua imaginação pelo planeta e até pelo universo, sempre indo além das idéias dos autores. Esta é a possibilidade mais importante que o livro proporciona.
3)Existe um escritor considerado por você como uma referência?
R-Estaria sendo injusto se citasse apenas um. Alguns escritores foram fundamentais para despertar meu interesse pela literatura, como: Carlos Drummond, Jailda Santana, Graciliano Ramos, Jorge Amado, Machado de Assis e outros. Hoje reconheço que todas as minhas leituras foram importantes para meu fazer literário.
4)Em entrevista concedida às professoras Sueli Martins e Maria Aparecida, você descreve o ato de escrever como uma necessidade. Em que momentos essa necessidade vem a tona?
R-Muitas vezes ocorre quando observo um fato inesperado, às vezes na observação dos belos detalhes da natureza que passam despercebidos para muitos, ou quando fico indignado diante de acontecimentos sociais no mundo e no meu lugar. Também quando de repente vem uma inspiração que desperta o desejo de expressar o que sinto diante do mundo e das pessoas.
5)Você acha que o domínio atual da mídia sobre a sociedade facilita ou dificulta a formação de leitores e o surgimento de escritores?
R-A Mídia por si só é neutra, são os homens que fazem da mídia o que ela é, não adianta criticar radicalmente os meios de comunicação de massa, por que eles estão aí e este é um fato irreversível. O que as pessoas fazem com a mídia é o que preocupa. Penso que temos bons programas que desperta leitores e futuros escritores, infelizmente esses programas são raros e geralmente passam em canais alternativos que são poucos sintonizados. As grandes redes em audiência deveriam se preocupar mais em despertar o hábito da leitura nas crianças e nos jovens. A internet provoca um fenômeno atual que é a necessidade de ler de forma rápida e instantânea, sem que as pessoas se dêem conta do que está lendo de uma forma crítica. São muitas informações e possibilidades de acesso sites, que você termina não “digerindo”, analisando criticamente o que está lendo, neste sentido, o livro ainda é insubstituível.
6)Pela sua experiência como professor, qual a melhor maneira para incentivar os jovens a ler e descobrir o prazer pela leitura?
R- Acho fundamental colocar as crianças em contato com os livros desde as séries iniciais, mas com livros que as interessam. Ninguém ler com prazer aquilo que não lhe interessa. Para isso é necessário equipar as escolas com bibliotecas que tenham um acervo variado. É fato que, no mundo de hoje, competir com as variadas multimídias não é uma tarefa fácil. Nos países do primeiro mundo, se consegue um bom nível de leitura, mesmo com o acesso as diversas tecnologias de entretenimento. Porque não procurar saber como se consegue isso? Precisamos parar com essa mania de que o que deu certo em outros países não daria aqui. É claro que cada povo tem suas peculiaridades, mas, precisamos analisar com atenção o que tem dado certo no mundo.
7) Em sua obra você fala de sua gente, sua revolta contra as injustiças. Esse é um estilo que você pretende manter nos próximos livros?
R- Com certeza, não acredito na neutralidade literária. Não é possível ser neutro em um mundo onde predomina a miséria, a opressão, a perseguição e a mentira. Quem escreve tem uma responsabilidade muito grande, você pode ser um serviçal do poder, usando sua capacidade literária para encobrir e escamotear mentiras, como você pode ser um perseguidor das verdades, denunciando as injustiças e a opressão que existe no mundo, em todo lugar. Porem, o escritor precisa ser um ferrenho auto-crítico, esta sempre pensando no que escreve, para que não venha a cair nos perigos das ideologias que cegam e levam ao fanatismo.
8)Você valoriza muito o trabalho dos poetas regionais, quem você citaria como o grande nome da literatura regional?
R- Temos bons nomes na literatura regional, em Irecê, Central, Gabriel e outra cidades. Em Barra do Mendes não devemos esquecer de Edízio Mendonça com seus levantamentos históricos e sociais, Wésio Pimentel e sua poesia repleta de sensibilidade, Avelino Sodré e sua irreverência e tantos que escrevem e mantém seus poemas e contos ainda inéditos, mas minha grande referência na literatura da minha terra foi a professora e poeta Jailda Santana, foi lendo um dos seus livros que senti o primeiro impacto do poder da poesia em minha vida.
9) Você tem algum livro em andamento? Pode nos adiantar algo a respeito?
R- Estou terminando um livro cujo título já foi escolhido “ Fragmentos Filosóficos e Outras Histórias”, será dividido em duas partes como se pode ver no próprio título, a diferença das outras publicações, será justamente o maior desafio deste trabalho que corresponde a responsabilidade de um leigo falar da complexidade da própria filosofia.
10) Você sempre teve bons vínculos com a literatura?
R- Li uma vez numa entrevista de algum escritor que não me lembro o nome agora, quando ao falar da importância da literatura em sua vida ele afirma categoricamente: “ a literatura me salvou da loucura”, não sei se chegaria a tanto, mas que ela tem sido um suporte essencial na minha vida, isto eu garanto.
11) Para finalizar, fale-nos um pouco sobre os principais benefícios que a leitura proporciona na vida das pessoas e que livro você recomendaria hoje?
R- A literatura permite que você viaje no mundo da imaginação, exercitando a mente e o raciocínio, evitando que o cérebro “enferruje”, sim, o cérebro quando não usado adequadamente pode enferrujar igual a qualquer máquina velha. A literatura possibilita sua conscientização do mundo, evita seu envolvimento com tudo que não presta neste mundo tão cheio de armadilhas, salva vidas que podem se perder pelos caminhos tortuosos; é facilmente constatável que os povos mais equilibrados socialmente e os países mais desenvolvidos são aqueles que mais lêem.
Indicarei dois livros que foram importantes na minha vida de leitor: O clássico da literatura mundial “Crime e Castigo” do grande escritor russo Dostoievski, e “Vidas Secas” do nosso Graciliano Ramos. Mas, é importante ter um relativo conhecimento sobre os clássicos da literatura mundial, pelo menos o básico.