Entrevista com um dicotômico

Prólogo:

Trata-se de uma entrevista ficcional onde o autor faz um juízo formado sobre aparência, fundado em indícios, em probabilidades; hipótese, suposição.

Entrevistador – Caro Wilson Henrique, o que o senhor acha desta história de liberar o jogo, como defende o governador do Estado do Rio de Janeiro?

Wilson Henrique – Permita-me responder como responderia o saudoso tribuno Rui Barbosa: "De todas as desgraças que penetram no homem pela algibeira, e arruínam o caráter pela fortuna, a mais grave é, sem dúvida nenhuma, essa: o jogo, o jogo na sua expressão mãe, o jogo na sua acepção usual, o jogo propriamente dito; em uma palavra: o jogo: os naipes, os dados, a mesa verde.".

Entrevistador – Tudo bem, professor, já deu pra entender sua opinião. Agora, mudando de assunto, o que o senhor achou do fato de o ministro do Supremo Tribunal Federal - STF ter suspendido o sigilo do procedimento penal que envolve o presidente do Superior Tribunal de Justiça - STJ?

O senhor sabe do fato ocorrido onde o demandado ministro Ari Pargendler e o peticionário que foi demitido porque o ministro não gostou da postura do rapaz na fila enquanto ele (ministro) tentava se entender com a máquina do caixa-eletrônico?

Wilson Henrique – É uma pena que o povão não tenha tomado conhecimento do abuso funcional cometido por Sua Excelência o ministro Ari Pargendler. Para mim foi uma verdadeira excrescência humana antes mesmo de considerar um abuso funcional.

Essa doença que devemos abominar - “juizite” - é própria dos tiranos. Ora, A Assembleia Nacional Constituinte, "em momento de feliz inspiração" repudiou o compromisso do Estado com o mistério e com o sigilo, que fora tão "fortemente realçado sob a égide autoritária do regime político anterior".

Dessa forma, a nova CF/1988 expôs o Estado, em plenitude, ao princípio democrático da publicidade. Portanto, "somente em caráter excepcional os procedimentos penais poderão ser submetidos ao (impropriamente denominado) regime de sigilo".

Sabemos, melhor dizendo, qualquer estagiário sabe, que tal medida não deve se converter em prática processual sob pena de "deslegitimação dos atos a serem realizados no âmbito da causa penal".

Ademais, para o total e mais justo e merecido repouso dos renomados juristas, já desencarnados, desejo, mais uma vez, parodiar Rui Barbosa dizendo: "A clandestinidade do processo inquina de suspeita as decisões mais justas.".

Entrevistador – Então quer dizer que a imprensa poderá noticiar o andamento do feito? Isso poderá ser feito sem o uso abusivo das algemas e sem censura?

Wilson Henrique – Sem dúvida! Ou melhor, responderei com a linguagem do povão dizendo e estalando a língua... “Com certeza!”. Mas o uso abusivo das algemas, condenável e já normatizado pelo Supremo Tribunal Federal – STF (Ver Súmula Vinculante nº 11, de 13 Ago 2008) não se poderá garantir por se tratar de mais uma das dezenas de centenas de determinações desmoralizadas, sem a devida e necessária eficácia, por culpa da própria sociedade letárgica e indolente.

NOTA NECESSÁRIA DO AUTOR:

A nova súmula inspirou-se na elogiável intenção de evitar o aviltamento da dignidade humana, mas pode causar grave quadro de insegurança jurídica pelas anulações em série de processos. No intuito de refrear abusos relacionados com o emprego de algemas em pessoas presas, o Supremo Tribunal Federal – STF, em sua composição plenária, por unanimidade, em sessão realizada em 13.08.08, editou a súmula vinculante n. 11, com o seguinte texto:

"Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado".

Como poderá haver justiça sem os apelos da imprensa? A publicidade é o princípio que preserva a justiça de corromper-se. Todo o poder que se oculta, perverte-se; transforma-se em um ninho de víboras onde só sobrevive o déspota mais recôndito em suas ações quase sempre malfazejas.

Quando a imprensa acompanha as quixotescas operações de nomes esdrúxulos das Polícias Civil, Militar ou Federal é porque foi convidada para dar não apenas publicidade (ampla cobertura) aos feitos dos heróis patrulheiros, mas principalmente para mostrar ao povão que, enquanto a sociedade dorme o poder estatal está atento (atento?) na garantia da ordem pública. Claro que os rombos existentes nas leis fragilizam as prisões e apreensões, mas ai é outra história.

Entrevistador – Outro assunto palpitante desta semana foi a aprovação do CPC. As críticas, em geral, são quanto ao modo como está sendo feita a mudança. O que o senhor nos diz?

Wilson Henrique – Entendo que um crítico assemelha-se a um especialista na identificação de erros. Desse modo, um crítico é sempre cego para os acertos. Podemos concluir, portanto, esse analista ou censor nem sempre é capaz de distinguir com competência o verdadeiro do falso, o bom do mau etc.

É preciso que a sociedade se manifeste em relação aos assuntos, às necessidades que nesse trabalho se vão prever e reger; que a sociedade se manifeste concorrendo para ele com as suas ideias, com a sua experiência e com os seus sentimentos.

Sabemos que segmentos da sociedade ligados às Ciências Jurídicas e Sociais – OAB, Sindicatos, etc. - foram consultados e emitiram pareceres sobre a tão esperada mudança do CPC. Contudo, EU NÃO FUI (elevando a voz) convidado para compor a plêiade de renomados juristas para realizar esse trabalho que entendo ser de relevante monta. Talvez, por ser um simplório autodidata, eu não mereça tão cobiçada e subida honra.

Entrevistador – Tudo bem, o senhor não quer se comprometer. Entendemos. Enfim, dê-nos agora uma mensagem, já que é preste o findar de 2010. O ano de 2011 será auspicioso?

Wilson Henrique – Gostaria de poder dar uma resposta simples. Impossível! Estamos vivenciando um tempo de preparação social para a semeadura da almejada paz. As favelas de todos os Estados de nossa Federação terão de receber o poder estatal de braços abertos e cooperar muito com delações e informações precisas para a limpeza da área e reestruturação da ordem pública.

Nossas crianças precisam crescer e acreditar num ambiente onde o respeito aos Direitos Humanos e às Instituições Democráticas são fundamentais para o progresso de uma nação. O direito de ir e vir e a educação são fundamentais para a consecução desses grandiosos propósitos.

Os morros do Rio de Janeiro serão o espelho dessa preparação e servirão de modelo para os demais Estados onde a desordem e a baderna aos poucos se ramificaram. A temporada de “caça aos pombos” (referindo-se aos marginais) foi iniciada, mas só terá êxito se houver continuidade, união, apoio da sociedade e força crescente.

No esporte, na política, na economia, na educação, nos transportes, nas leis, em todas as áreas esperam-se evoluções consistentes, pragmáticas. Todavia, é preciso atentar para uma verdade (mais uma vez parodiando Rui Barbosa): "O mal é inexorável, pela consciência de ser caduco. O bem, paciente e compassivo, pela certeza da sua eternidade.".

NOTAS E FONTES CONSULTADAS

- MIGALHAS n° 2.533

- SÚMULAS DO STF PUBLICADAS