A TÁBUA DE SALVAÇÃO

– para Vitor Hugo Horta Lima e sua coluna “Perfil da Semana”, no DM, de Pelotas/RS.

A amizade antiga e a bondade do cronista social exigem de mim uma resposta pública. Ele acredita que isto vai interessar ao leitor do Diário da Manhã.

Por mim, acho que nada vale um poeta na Coluna Social. Tem tanta gente mais importante pra figurar na folia midiática... E não que tenha alguma restrição. É que poeta não nasceu pra criar fama enquanto vivo. Poeta vale mais morto do que vivo. Nele, a bolsa vale nada, a vida menos ainda!

Dizem a mim que o convidante Vitor Hugo não permite substituição dos questionamentos e gosta de respostas diretas aos quesitos.

Por mim, faria alguns incrementos para fugir do laconismo, que é sempre o problema na linguagem do jornalismo não literário. Talvez por esta razão eu tente chegar à Poesia: falar pouco e dizer muito em vários sentidos. A multivalência das metáforas é a tábua de salvação.

Nasci Joaquim Luiz dos Santos Moncks e muito cedo me tornei somente Joaquim Moncks, na vida de relação e na Poesia. Homenageava o meu pai, que fora poeta bissexto, eis que autor dos primeiros versos que recitei na Escola primária, isto lá por 1957/8. Era um soneto: “Ode a João Affonso”. Irremediavelmente a sina dos anos... Nada recordo do soneto. Perdeu-se. O pai vive em mim todos os dias, na memória e ao espelho.

Sou um homem condenado ao pensar. A vida me olha de relancina e eu aceito o desafio de ser dois: o homem e o poeta. Vivo os dois num repente.

É nos amigos que me realizo. Contam-se nos dedos da mão os personagens que guardo no coração e permanecem arquivados na cuca. Mas tenho milhares de pessoas com quem prazerosamente convivo: são os meus talismãs. Traduzem a ótica histórica com que registram minhas pegadas. Sempre me fazem encabular quando ficam “rasgando seda” em torno de minha vida e obra. São ‘amigos’, o que fazer?

Meu lazer é a natureza humana e a topografia que me cerca. É este o barro com que me construo após nascido nessa Pelotas, na primavera de 1946. A Literatura continua sendo o pincel com que recrio a vida polindo o brilho dos dias e dando safanões no que me é hostil.

Amo os animais domésticos. Vários deles são personagens com alma em minha obra. Alegra-me os olhos a rica fauna brasileira e deploro os espíritos impuros que matam desbragadamente a natureza silvestre. Quem resiste à dança e ao olhar dos felídeos silvestres em seu habitat? Mas tenho medo do ambiente da floresta: “ovelha não é pra mato!”

Somente três perfumes pousaram na minha pele sexagenária: Polo, Pacco Rabanne e Allure. Muitos outros deitaram junto a nós com o amor da hora... e o que mais ficou foi o Poême, “eau de parfum” da Musa.

Minha posição frente à vida é a de aceitar o Homem como espécie inacabada. Nascemos para a experimentação. Erramos e acertamos. Mas a vida atual me parece melhor no seu cadinho de fermentação. Por vezes, alguns exemplares de nossa espécie retornam à Idade da Pedra. Detesto os ditadores de plantão. A Poesia desbasta a pedra bruta (que sou) enquanto espécime condenado à vida neste plano de expiação.

Parece-me que neste ano da graça de 2009 a “Personalidade do Ano” será Barack Obama, o presidente americano. Precisamos de ícones mundiais para afogar o ditado latino de que “o homem é o lobo do homem”. Gostaria que o político não afogasse o homem em Obama, e que ele permanecesse vivo na cabeça dos contemporâneos. Ele me parece ser a memória rediviva de Luther King, patriarca dos direitos da negritude americana.

No Brasil, o metalúrgico-presidente, também merece destaque. Tomara que os dirigentes brasileiros não esqueçam de que Lula vem atingindo os mais altos graus de aprovação popular. Este indicativo me parece esclarecedor.

Tenho um vício deplorável: a leitura. No momento estou lendo Charles Baudelaire e o seu “Meu coração desnudado”. Todo e qualquer livro é uma viagem ao insondável.

O meu hobby é a telecartofilia, o colecionismo de cartões telefônicos. Tenho mais de quinze mil exemplares, um diferente do outro. Ressalte-se que o Brasil tem mais de quarenta e seis mil diferentes estampas, nos cartões emitidos desde 1992. Sou um colecionador médio, com um terço dos CTs existentes no mercado.

Resta ressaltar algo que me mexe nos neurônios. Fico com Benedetto Croce, pensador italiano, em seu livro A Poesia:

O homem, contrariamente aos animais e aos deuses, está condenado a pensar.

– Do livro O HÁLITO DAS PALAVRAS, 2006/2009.

http://www.recantodasletras.com.br/entrevistas/1469827