Maria Quitéria no Le Monde

LM - Você escreve há quanto tempo?

MQ - Creio que desde que aprendi a escrever (digo, depois do be-a-bá), já rascunhava trovinhas. Meu pai sempre escreveu músicas e, embora eu nunca tenha escrito nenhuma, escrevia coisinhas para mostrar para ele... Aprendi a ler e a escrever com cinco anos e em casa só falava em italiano com meu pai. Creio que isso desenvolveu em mim vontades de me expressar através da palavra escrita.

LM - Você se considera uma escritora popular?

MQ - Não me considero uma escritora e não sou. Sou apenas escrevinhadora. Não tenho métodos, métrica e muito menos disciplina.

LM - Seus textos normalmente são eróticos ou sensuais. Seu veio poético é semelhante a sua pessoa?

MQ - Creio que sim, embora não vá jamais explicar se o que escrevo é verdade ou mentira. Se misturarem a autora com a pessoa, tudo certo. Se separarem, tudo certo também. Não acho que deva dar satisfações sobre minhas letras; isso, além de ser ridículo, é totalmente dispensável. Sou erotizada, sensual e isso faz parte da minha natureza, contudo, também sou séria e posso ser bastante cruel se necessário. Mas nem por isso preciso escrever crueldades.

LM - Você recebeu propostas para escrever livros. Por que nunca aceitou?

MQ - Primeiro porque, como já disse, não tenho disciplina. Escrever por obrigação iria tirar toda a graça. Segundo, jamais irei investir em letras. Não que não creia que poderiam valer algo, mas me propus a jamais pagar para ser lida. Se um dia tiver que gastar um único centavo seja onde for para publicar, deixarei de escrever. Ou melhor, deixarei de publicar, continuarei escrevendo em meu diário. Recebi uma proposta para publicação de contos e não iria investir nada, exceto tempo, mas analisei friamente: o que querem que eu escreva? o que iria atrair um público X? qual o tamanho ideal de um conto a não ser cansativo e fazer com que se continue folheando? o que seria um sucesso? Como não gostei das respostas que eu mesma me dei, não quis fazê-lo. Não compensaria o desgaste, exceto se fosse um sucesso mas, honestamente, não creio que seria.

LM - Quantos textos você já escreveu? Tem a quantidade?

MQ - Não, não tenho, mas devem ter superado a marca de 10.000. Entre todas as frentes de publicação que ainda mantenho, devo ter mais de 8.000 publicados, então creio que esse número deva ser até superior.

LM - O que você mais gosta de escrever?

MQ - Política. Já assinei matérias em um jornal e em uma revista por muito tempo com pseudônimo. Adorava escrever politica, mas me proibi de continuar. É desgastante e eu ficava enfurecida, começou a me fazer mal. Mas ainda gosto muito de escrever sobre o assunto, embora pouco o faça. Também gosto da linha financeira. Toda a estratégia, as aplicações... isso tudo faz o cérebro funcionar a mil. Como não bebo nem uso drogas, política e finanças dão um barato e tanto.

LM - Quando você escreve sobre amor, por exemplo, você idealiza ou retrata?

MQ - Normalmente retrato. Idealizar pode trazer transtornos já que as pessoas nunca são o que desejamos.

LM - O que você gosta de fazer quando está de folga?

MQ - Nada. Fazer nada é uma coisa muito gostosa. Quase tão boa quanto fazer amor.

LM - Você acha que poesia ainda é vendável?

MQ - Será sempre vendável porque o amor existe. Mas as pessoas, embora ainda há quem busque aquele "eu te amo", agora também buscam outras formas de expressão na poesia e quando ela consegue aliar o amor, o cotidiano e mais as diversas posturas, tanto psicológicas quanto temporais, torna-se leitura obrigatória para a maioria.

LM - Então você acha que a poesia precisa ser clara, é isso?

MQ - Eu disse outra coisa, mas isso também é verdadeiro. Não há nada mais desagradável do que você começar a ler uma poesia e ficar tentando decifrar o que o autor quis dizer. A metáfora é sempre benvinda, mas a estupidez, a 'invençatez', além de ser pobre em aspecto literário, ainda causa aquela sensação de aturdimento ao final da leitura. Isso me faz pensar no poetrix, poema simples em sua forma, mas que as pessoas pensam que podem escrever qualquer tolice em três linhas e está feito. Mas, de tudo, o que mais de deixa atordoada é observar pessoas aplaudindo o que não entenderam ou o que não faz sentido, apenas para adular um autor ou passar atestado da própria ignorância, como nos quadros com aquele monte de cores e rabiscos e as pessoas (sempre com ar intelectual), explicando o inexplicável.

LM - O plágio é um problema gravíssimo para os que publicam na Internet. Como você encara isso?

MQ - Bem, apenas uma vez fiquei bastante zangada com relação a um texto meu que foi publicado sem a autoria. Achei desagradável o que a pessoa fez. Não só desagradável, foi desonesto. Mas o plágio, embora seja uma erva daninha e eu encontre frases inteiras minhas na boca de outras pessoas, eu acabo por entender que só copiamos o que entendemos como sendo uma coisa de valor, então, essas pessoas que costumam plagiar, se tiverem talento, cedo ou tarde encontrarão seu próprío caminho e deixarão de copiar os outros e, os que não possuem talento, serão esquecidos. Não se engana a todos por muito tempo.

LM - Que tipo de literatura você acha que poderia fazer mais sucesso?

MQ - A ficção romântica, o suspense, o esoterismo, o conto policial, a intriga política; esses temas são interessantes e abrangem um grande público. Também os livros de auto-ajuda, embora eu não goste deles, o filão comercial é imenso.

LM - Há alguma fórmula mágica para ser bastante lido?

MQ - Sem dúvida. Quando o título é chamativo, normalmente a leitura é imensa, mas isso é uma faca de dois gumes já que você acena com algo e o leitor busca isso no conteúdo e, se o conteúdo for pobre, ele acaba se cansando e deixa de ler você. Sempre entendi que títulos apelativos exigem muita capacidade no texto em si e nunca me vali desse argumento. Às vezes escrevo algo para uma única pessoa e, sabendo que essa única pessoa me leu, já me satisfaz. Não busco o sucesso fácil, aliás, nem busco o sucesso, apenas gosto de escrever. E também sou bastante seletiva com relação aos comentários que recebo. Sempre são benvindos, mas não me iludo achando que isso me torna um sucesso já que quem gosta de A, não pode gostar de B e se os elogios para A e B são constantes, isso significa apenas amizade e não um aval ao meu talento.

LM - Você escreve de forma crua, isso acarreta algum problema?

MQ - Não. Em alguns sites, creio ter sido a primeira mulher a escrever as palavras como são, sem o invólucro da boa educação. Quando se escreve, não se pode tolher a criatividade. Algumas palavras são usadas em medicina, outras são usadas no erótico, e eu não tenho nenhuma censura ao escrevê-las. Contudo, sempre tomei muito cuidado para não ser vulgar. Isso é o que difere uma palavra da outra. A vulgaridade, a palavra crua escrita apenas visando um determinado aspecto do sucesso é que faz desandar toda uma letra. Até a pornografia explícita possui talento se não entrar na vulgaridade.

LM - Fora escrever, o que você mais gosta de fazer?

MQ - Amor, cavalgar, cozinhar, torrar dinheiro e fazer nada.

LM - Se você pudesse criar um homem como se fosse um livro, como ele seria?

MQ - Eu gosto do biotipo do Stallone. Poderia ter cabelos escuros e longos, músculos, ser mortal e quase mudo. Esse homem é o ideal para meu gosto; rústico, bruto, forte, calado, confiável, determinado e sem piadinhas. Detesto homem que conta piadinhas ou vive rindo. Mas embora tenha preferências físicas um tanto determinadas, se esse homem não tiver caráter e ser "galinha", não valeria nada no meu conceito; seria um livro só de capa. Ainda prefiro um livro até rasgado, mas com letras poderosas.

LM - Gosta do tipo bruto, então?

MQ - "Hay que endurecer, pero sin perder la ternura jamás..."

LM - Que tipo de literatura você gosta? O que você lê?

MQ - Sempre li muito. De bula de remédio à gibi. Livros técnicos, livros sérios, livros idiotas. Mas depois de alguns anos (muitos, no meu caso) a gente aprende certas coisas. Cito Nelson Rodrigues e, creio, estarei explicando o que penso hoje: " "Deve-se ler pouco e reler muito. Há uns poucos livros totais, três ou quatro, que nos salvam ou que nos perdem. É preciso relê-los, sempre e sempre, com obtusa pertinácia. E, no entanto, o leitor se desgasta, se esvai, em milhares de livros mais áridos do que três desertos".

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Na íntegra:

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