Era um sonho dantesco.O tombadilho,
que das luzernas avermelha o brilho,
em sangue a se banhar...
                                
                                       (castro Alves)
Tumbeiros.Assim eram chamados os navios que transportavam escravos,mais parecidos com tumbas,que foram,sim,de muitos.Carregavam 500 a 600 "peças",que era como denominavam os negros;não gente,não pessoa-peças-homens amontoados nos porões,mulheres e crianças,algumas ainda de peito,na coberta.Sujeitas a intempéries,ondas altas a varrer o convés,ratos enormes e vorazes a passear,gozando a sujeira reinante.Era preciso ser uma raça muito forte para resistir a tudo isso!Conte ainda com as chicotadas,a alimentação precaria,e,me diga,se não tinha razão o filósofo Hobbs,quando dizia:"Homo lupi homini"(o homem é o lobo do homem)?De vez em quando,os homens subiam á coberta,para espairecer,respirar ar puro.Eram obrigados a dançar,mover braços,pernas e pulmões entorpecidos;se não dançavam por bem,dançavam no chicote.
Mais uma vez,me ajuda o poeta:"tinir de ferros...estalar de açoites,legiões de homens negros como a noite,
horrendos a dançar...(C.Alves).
De repente,um barco,ao longe.O capitão negreiro quer saber quem é e de onde vem.Era um brigue inglês,caçador de tumbeiros;quando alcançava um,o aprisionava e levava capitão e tripulação a ferros.Então,o que fazia nosso honrado capitão?Abria o porão e jogava a carga ao mar;toda ela,incluindo mães e crianças de colo.
"Senhor Deus dos desgraçados,
dizei-me,Vós,Senhor Deus,se é mentira,se é verdade,
tanto horror perante os céus?
Na verdade todos ganhavam com esse vil comercio;menos os negros,é claro!Ganhavam os régulos ou sobas,negros que vendiam seus irmãos de cor;os negreiros,que faziam o repasse;o governo,que embolsava os melhores ganhos;a parte do leão,era do rei;os comerciantes,que revendiam os negros para os fazendeiros;estes,porque tinham mão de obra barata.Os agentes da Real Fazenda,que recebiam as taxas;os traficantes pagavam ao rei 1$750 reis,por cabeça,isso no inicio do tráfico;Para que se tenha ideia do crescimento desse infame comercio,em 1699,a taxa subiu para 3$500 réis;e,na metade do século XV,para 6$600.Lucrativo,não?Melhor que a Bolsa de Valores.Multiplique isso por 10 milhões de cabeças,que rendiam ganhos diretos;uma fábula!E havia os ganhos indiretos:a força do trabalho que significava mais açucar,mais tabaco,mais algodão,mais gado.
Quando encontrar um negro na rua,tire o chapéu para êle;seus ancestrais sofreram muito,lutaram nuito para desenvolver nossa economia.Seus descendentes,de uma certa forma,ainda são escravos:são escravos da miseria,da ignorancia,do crime,da discriminação;são vítimas de politicas públicas omissas e do preconceito generalizado ou camuflado.São vítimas de todos nós.
Quem me dá a fecha é o poeta dos escravos,Castro Alves:
Fatalidade atroz que a mente esmaga!
Extingue nesta hora o brigue imundo,
o trilho que Colombo abriu nas vagas,
como um íris,no pélago profundo!
Mas,é infamia demais!...Da etérea plaga
levantai-vos herois do Novo Mundo!
Andrada,arranca esse pendão dos ares!
Colombo,fecha a porta dos teus mares!
Miriam de Sales Oliveira
Enviado por Miriam de Sales Oliveira em 13/05/2008
Reeditado em 12/05/2018
Código do texto: T987846
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