Petição 9.935 – Retrato de uma Justiça falida II
A petição a que me refiro no título deste artigo e de outros, embasou um despacho, que é importante ressaltar, não caberia ao STF e muito menos a de um de seus ministros em particular, porque o “acusado” não tem foro privilegiado e portanto não deveria ser julgado por aquele órgão.
O despacho é caracterizado abaixo, inclusive com seu primeiro parágrafo.
“PETIÇÃO 9.935 DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. ALEXANDRE DE MORAES
REQTE.(S) : DELEGADO DE POLÍCIA FEDERAL
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
REQDO.(A/S) : ALLAN LOPES DOS SANTOS
ADV.(A/S) : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
DECISÃO
Trata-se de petição instaurada a partir de representação da Polícia Federal pela decretação de PRISÃO PREVENTIVA de ALLAN LOPES DOS SANTOS, com fundamento nos arts. 13, IV e 312 e seguintes, do Código de Processo Penal.”
Já nesse primeiro parágrafo podemos perceber a “fragilidade” legal do despacho.
A menção ao art. 13, IV, do Código de Processo Penal (CPP) em uma fase ainda acusatória pode ser interpretada como um equívoco ou, no mínimo, uma formulação que anteciparia uma certeza do crime, o que não é compatível com a presunção de inocência e com a ordem natural do processo penal.
O art. 13 do CPP trata do conceito de “autoridade policial” no contexto das atribuições da polícia judiciária. O inciso IV desse artigo menciona:
Art. 13. Incumbe ainda à autoridade policial:
IV - realizar outras diligências necessárias para o esclarecimento do fato.
Esse dispositivo se refere à fase investigativa e não tem relação direta com a prisão preventiva, que é tratada nos arts. 311 a 316 do CPP. Se uma petição que pede a prisão preventiva fundamenta-se no art. 13, IV, pode-se entender que há um erro técnico, pois esse artigo não trata dos requisitos necessários para a decretação dessa medida.
Além disso, a forma como a citação foi feita pode passar a impressão de que a materialidade do crime já estaria certa, quando, na verdade, a fase acusatória exige que a culpa ainda seja provada e debatida.
O Processo Penal segue uma ordem lógica baseada nos princípios do Devido Processo Legal, contraditório e ampla defesa:
- investigação (fase inquisitorial) - Coleta de provas e informações pela polícia para apurar a ocorrência de crime;
- denúncia e acusação - O Ministério Público (ou outro órgão competente) apresenta uma acusação formal com base nas provas obtidas;
- instrução processual - O juiz analisa a acusação, ouve defesa e testemunhas, e avalia as provas;
- sentença - O juiz decide se há ou não culpa.
Se, na fase de acusação, a petição já faz referência a um artigo que trata da atuação investigativa policial para sugerir a certeza de um crime, isso pode ser visto como um erro processual ou, no mínimo, como um argumento que pressupõe a materialidade e autoria antes da devida instrução processual. Isso poderia ser questionado como uma tentativa de inverter a lógica do processo, tratando uma hipótese investigativa como se já fosse uma certeza jurídica.
A menção ao art. 13, IV, do CPP em um pedido de prisão preventiva na fase de acusação pode ser tecnicamente inadequada, pois:
- esse artigo trata de diligências investigativas e não da prisão preventiva;
- ele se refere à atuação da polícia, e não aos requisitos exigidos para uma decisão judicial de prisão preventiva.
- pode sugerir uma certeza antecipada da materialidade e autoria do crime, atropelando a ordem processual e ferindo o princípio da presunção de inocência.
Portanto, essa fundamentação é questionável sob o aspecto da legalidade processual.