( - As Bruxas e suas Crenças - )
Uma mulher velha, solitária, feiticeira. Acostumada a fazer o mal e arquitetar maldições gratuitas. Este é o estereótipo construído ao longo de 20 séculos de tradição cristã, que culminou em fogueiras, torturas, estupros e centenas de milhares de assassinatos.
Talvez esta história começasse assim. Mas há bastante vida para contar. Mulheres que enxergavam na natureza uma fonte de conhecimento inesgotável e pela harmonia das matas, dos brejos, das florestas construiram uma tradição de milênios. Pelos saberes passados por gerações se consolidaram as bases do que chamamos hoje de paganismo.
Paganismo, como quase todas as definições no Sec. XXI, passa por uma polissemia escancarada. Sua origem latina "pagani", "paganus" refere-se àquilo o que é do campo. O termo não encerra uma religião. Não encerra uma crença, tampouco qualquer construção social específica. Mas para decifrar qualquer dimensão da bruxaria, é preciso entender este conceito primário. Ser bruxa é, antes de tudo, conectar-se com a vida maior, com a vontade maior e, a partir dela, construir sua existência e sua vontade.
Esta é a base comum às religiões pagãs estabelecidas ao longo dos séculos. Sociedades campestres aperfeiçoavam seus conhecimentos sobre o solo, o tempo, os fenômenos, os indícios, os astros e tudo o quanto pudesse contar, medir e aprender. Com a posse dessa sabedoria e pela vontade e necessidade passaram a interferir nestes fenômenos, mas este é um assunto para outro texto.
Com base nestes conhecimentos também foi possível estabelecer um conjunto de crenças originárias que dão corpo às religiões. Seja no cerimonial, seja na cosmogonia: a explicação das origens, da formação dos fenômenos e da natureza dos deuses.
Dentre tantos e diversos tipos de bruxaria, a tradição que melhor representa esta visão, no Sec. XXI, é a Wicca. Considerada como neopagã, esta é uma doutrina condensada nos anos 50 por Gerald Gardner que, em sua pesquisa, identificou elementos do paganismo pré-cristão em bruxos de diversas origens, encontrando nelas elementos comuns.
A Wicca, como religião, é fruto de um vasto sincretismo cultural e, apesar de possuir diferentes escolas, com diferentes ênfases, é na doutrina de Gardner e de seus discípulos que floresce na Europa e, de lá, se dissemina por todo o globo.
A Religião estabelece uma relação de equilíbrio entre o feminino e o masculino sagrado. Representados pela Deusa Mãe (Brigid, na tradição céltica) e pelo Deus Cernunnos. Há tradições que estabelecem este sincretismo com Afrodite, ou mesmo Hécate, ou até Pachamama, de tradição indígena.
Este sincretismo, longe do que possa parecer, não tem nada de moderno. Na "Cidade Antiga" de Fustel de Coulanges, notável historiador do Sec. XVIII, há documentação com fonte sobre diferentes Deuses diante da mesma imagem em cidades vizinhas.
É na natureza, no culto à vida, aos ciclos e aos Deuses que a Religião se manifesta. É saber que somos parte de tudo. E destruir a vida na Terra é uma forma de se destruir. E lembrar sempre que o assassinato daquelas mulheres ao longo dos séculos teve a marca comum de uma profunda e covarde submissão.
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