Bacia HRG – XI

Bacia HRG – XI

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Depois de ter entrado no Graben (GRG), vou agora entrar na sua Bacia Hidrográfica (BHRG). Não na sua totalidade, mas na porção dela (que me parece) exercer maior impacto na qualidade das águas da Praia do Monte Verde. Antes de o fazer, vou apresentar-vos (por alto) a Bacia. É constituída ‘por quatro massas de água.’ Que são: Lombadas, Roças/Salto do Cabrito, Pernada e a Grande. Tal como o seu hospedeiro (Graben), ela está ‘(…) encaixada no flanco norte do Maciço de Água de Pau, que corresponde ao maior vulcão central da Ilha, com uma área de cerca de 133 Km2. Este maciço possui duas das três mais importantes ribeiras da Ilha, sendo uma delas, a da Ribeira Grande.’ É esta (ribeira Grande) ‘de regime permanente, com uma área de 18, 3 Km, em que o comprimento do curso de água mais longo tem 13, 2 Km e o comprimento total dos cursos de água existente é de 90,8 Km.’ E, atente-se nisso, está integrada ‘na área Protegida para a Gestão de Habitats e Espécies da Serra de Água de Pau.’

O que pretendo neste trabalho? Perceber a causa dos males do Monte Verde. Como chegar lá? Ver por onde passa a água antes de desaguar no Monte Verde. Não esquecer que a água se transforma naquilo por onde passa. Enquanto o faço, não devo perder de vista que a água que vem do mar pura (através da evaporação/precipitação), infelizmente, nem sempre regressa pura à sua origem. Onde se localiza a área que mais influi na qualidade das águas do Monte Verde? Pelas observações feitas no terreno, pela consulta de plantas e por conversas com colegas que fazem parapente, destacou-se o suspeito principal: a área da ribeira Grande e seus afluentes (ribeira do Teixeira, Tondela, etc. …). E um suspeito secundário: a área da ribeira Seca.

De onde vem a água que chega às torneiras dos domicílios de quatro das cinco freguesias da Cidade da Ribeira Grande (implantada no Graben) que mais influenciam a água do Monte Verde? As duas a nascente (Ribeirinha e Matriz) são abastecidas por nascentes que nascem no Monte Gordo. A mais central, a Conceição, é abastecida (sobretudo) por nascentes da área da Caldeira Velha e do Salto do Cabrito. As duas freguesias a poente, Ribeira Seca e Santa Bárbara, recebem-na de outras. Antes de chegar às torneiras, a água é tratada na ETA situada no Pico Arde (caminho da Lagoa do Fogo) e periódica e aleatoriamente analisada (nos domicílios). E a que sai? Para onde vão os efluentes domésticos? Aqui não consegui dados objectivos, no entanto, pelo que dizem, a maioria, alguns até avançam com mais de 90%, ainda utiliza fossas (que na generalidade, ao que continuam a dizer-me, funcionam bem). Há uma rede pública, porém, só uma minoria, ao que dizem, insisto, já se ligou. Os afluentes domésticos ligados à rede pública, após a passagem por várias estações elevatórias (quatro ou cinco), situadas em vários pontos (sobretudo) no interior da Cidade da Ribeira Grande, estão (presentemente procede-se a ensaios) a ser conduzidos à ETAR da Ribeira Grande (situada na Vila de Rabo de Peixe). Após o que, ainda restará resolver duas ou três ligações que drenam (na zona da Vila Nova) para o Monte Verde.

E a água da ‘derrega’? Trata-se de um sistema de regadio (ao que apurei de gente que sabe) único na ilha e nos Açores (hoje quase a desaparecer, como tive ocasião de constatar). Virá de longa data - talvez mesmo do início do povoamento. Entrou em declínio (apesar dos esforços, sobretudo dos do engenheiro Fernando Monteiro) nas décadas de sessenta/setenta, com o avanço das pastagens e o abandono das culturas (por falta de mão-de-obra e preços não competitivos dos produtos). A partir daí, muitos dos regos - que correm – em geral a céu aberto -, foram sendo abandonados (invadidos pela vegetação ou derrubados pelas rodas dos tractores). Por meados de Maio, ‘quem queria derregar os seus terrenos, ia dar o nome à Câmara. A partir de Junho começava de baixo para cima. Nos terrenos mais ‘temporãs.’ O responsável era o agueiro da Câmara. Municipal. Na vizinhança da água da rega, na sua casa e quinta do Pico Arde, o Morgado João da Arruda Botelho da Câmara (n. 12 de Maio de 1774 - PDL – f. 31 de Janeiro de 1845 RG) (antes da SPAM enquanto escrevia a sua História da Ilha de São Miguel e a Genealogia dos seus morgados) também experimentava (com sucesso) a introdução de diversas espécies botânicas com valor económico. Dois ou três quilómetros mais acima do Morgado Arruda Botelho, na Caldeira Velha, José do Canto (tal como fizera na margem da Lagoa das Furnas e em Ponta Delgada) construiu um parque botânico (hoje totalmente descaracterizado). À sua volta, mantendo-se até 1974 (mais ou menos), José do Canto cultivou chá e construiu a primeira e mais importante fábrica de chá da Ilha. Aliás, era na área do Graben da Ribeira Grande que se localizava a esmagadora maioria das plantações e das fábricas de chá de São Miguel. Em 1985, a última (a da Barrosa) teve um fim trágico (consumida por um incêndio algo suspeito). Naquilo que interessa a este trabalho: a água da rega não polui nem poluiu a Praia do Monte Verde.

Para onde vai a água que passa pelos moinhos (valas dos moinhos de ribeira e levadas dos da Condessa)? Os últimos dois ou três deixaram de moer na década de noventa, alguns foram convertidos em residência (casos dos moinhos do Correia ou do seu vizinho), outros, em alojamentos turísticos (caso dos moinhos da Areia e o do Félix). Um deles, há anos produziu electricidade. Uma das quintas regada pela água da levada dos moinhos (no caso da que vinha do moinho da Palha – moinho de Condessa) foi a do Ouvidor Feliciano Rémy (n. c. 1799 RG – f. 1864 - RG). Dedicou-lhe os últimos 17 anos de vida. De ascendência francesa, era natural da Ribeira Grande. Liberal, com ligação directa ao poder vigente (pertencia ainda à maçonaria), e sócio activo da Sociedade Promotora da Agricultura Micaelense (SPAM). Cultivou diversas variedades de laranja, de roseiras e experimentou o chá. O agueiro dos moinhos era o responsável. Entregava a renda da água destinada à limpeza e manutenção da vala. Infelizmente, a água que circula pelas valas (velha – das sete primeiras e nova – das sete segundas) dos moinhos (apesar de haver cada vez menos quem o faça) é ainda causa de alguma poluição na Praia do Monte Verde. Como resolver esse problema? Com fiscalização? E educação?

E a geotermia? Teve o seu primeiro ensaio em 1973 (bem sucedido logo à primeira tentativa): foi ao fim dos Foros, na Casa do Pico Arde, numa pastagem da família Berquó de Aguiar: à cota +72 m e a escassa distância da ribeira Grande. O chamado poço Dalhousie. Na campanha de elevação da Vila da Ribeira Grande a Cidade, o potencial da geotermia serviu de argumento de peso para convencer os descrentes. Esperava-se que trouxesse mais investimento (público e privado). Virgílio Varela, um dos cabecilhas militares envolvidos no malogrado movimento do 16 de Março de 1974, então radicado na Ribeira Grande, e promotor (logo em 1978) do Restaurante O Fuseiro, desafiou alguns membros da Assembleia Municipal que se opunham à elevação da Vila a Cidade: ‘Não será a geotermia a base de um grande futuro industrial para a futura cidade da Ribeira Grande??? - Quantas indústrias não virão para a nossa região? - Quantos técnicos qualificados ficarão a residir nesta vila-cidade?’ Dois anos antes, em 1977, a imprensa divulgara um muito interessante projecto da dupla Victor Hugo Forjaz e Mac Meidev. Deram-lhe o nome de Parque geotérmico de sonho. Nele se propunha a criação de uma ‘Cidade’ a Sul da da Cidade da Ribeira Grande: com piscinas (recreativas e terapêuticas), uma clínica, estufas aquecidas, fábrica de açúcar, escola comercial, criação de aves, etc, etc... Apesar de a produção geotérmica já ter atingido 41/42%, de o Parque Industrial da Ilha de São Miguel (foi essa a intenção da Região, porém, sem variante e mais infra-estruturas, acabaria por ficar muito aquém da intenção) estar encostado à Central do Pico Vermelho, o projecto ficou por aí. Porquê? O projecto geotérmico (em abono da verdade) provocou alguns sobressaltos e acidentes. No entanto, as descargas que iam desaguar na foz da ribeira Seca no Monte Verde, cessaram em 1997 com o recurso à reinjecção dos fluidos. E esses não afectam os lençóis de água? Garantem-me que não. E a areia extraída do tufo? Também, não. GarantEm-me. Separa as lamas e reenvia a água (já depurada).

E a água da chuva que faz transbordar as nitreiras e arrasta a matéria química e orgânica que ainda esta semana interditou a Praia do Monte Verde? E impediu a realização da etapa do campeonato de Surf? Aqui é que a situação se torna grave (mais do que o caso da vala dos moinhos – facilmente solucionável). Esperança? Há uma luzinha que se acende ao fundo do túnel. No lado do Pico Arde, em parte das antigas plantações de chá, depois transformadas em pastagens, planeia-se construir um hotel de luxo.

Mário R.ª Grande (Continua)

Mário Moura
Enviado por Mário Moura em 18/06/2024
Código do texto: T8088713
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