Segunda-Feira

A segunda-feira é um dia límbico, narcotizante e perigoso. Já não é fim-de-semana e ainda não é semana. É uma coisa. Uma ressaca. Uma lenta e penosa transição. Uma metamorfose. Esquecemos o que fomos no Sábado e no Domingo, esquecemos o que seremos quarta ou quinta. É o dia em que todos os planos se perdem, soprados pelos ventos do torpor e da hibernação. Olhamos para a Agenda e rimo-nos: «Ah, ah, não queriam mais nada!» Dizemos a tudo que sim, porque ainda dormimos. Não rendemos, não criamos, não resolvemos. É um torpor, uma penitência pelos excessos de ontem, uma preguiça para as exigências de amanhã. Uma areia movediça que pode engolir-nos, e não é tão mau assim. Sobrevivemos com pouco alimento e baixa oxigenação. É às segundas que os outros estranham a nossa voz: «Por momentos, não parecias tu» Verdade: por umas horas não somos nós e é o que seduz. As pessoas que não sofrem de segunda-feira sofrerão mais tarde de coisas piores, muito mais graves. São pessoas que nunca chegam a dormir, que nunca chegam a acordar. Acordar demora um dia, um dia inteiro. Não nos darmos segundas-feiras é um erro. Toda a gente tem direito à sua segunda-feira e, se não tem, morrerá disso. O milagre são as terças. Todas as segundas nos tentam, há quem fique segunda-feira para sempre.

Rodrigues Miguel
Enviado por Rodrigues Miguel em 15/04/2024
Código do texto: T8041924
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