Surf na Ribeira Grande: Intenções - VII
Intenções – VII
Eleita em finais de Novembro, a 6 do mês seguinte, a nova Direcção vai (em peso) apresentar-se (e ao seu programa) à Câmara da Ribeira Grande. Só a 22 de Novembro de 2022 (com polémica à mistura) é que a AASB conhecera uma nova Direcção. Porém, ainda que Filipe Mendonça - o Presidente -, e a sua equipa, se comprometessem a cumprir por inteiro o mandato de quatro anos, pouco menos de sete meses depois, pediriam a demissão. Como é que uma associação tida (havia bem pouco tempo) como estável - com as contas limpas, com crédito e prestígio, permite a demissão de uma Direcção? Para (tentar) explicá-lo de forma razoável (e convincente), há que ter (creio) em conta (certas) contradições inerentes (vindas de trás). A começar, havia um obstáculo conhecido de todos (de muito difícil solução): ‘Sabe-se que os desportos de ondas, pelas suas características e riscos associados, terão sempre um número limitado de praticantes, não sendo propriamente um desporto de prática fácil e de rápida aprendizagem como outros desportos ditos tradicionais.’ Depois, havia (e há) a natureza inteiramente amadora da AASB quando (devido à complexidade do programa apresentado e às – normais -, exigências burocráticas dos apoiantes institucionais) já se exigiria (algum) profissionalismo. E ainda: como poderia a Direcção promover (com sucesso) a angariação de mais praticantes se, no caso da Ilha de São Miguel, a formação dependia (quase) exclusivamente (da disponibilidade e da boa vontade) dos clubes/empresas cada vez mais (consequência do aumento do turismo) virados para a vertente da empresa? Só (por conseguinte) levando em linha de conta esses obstáculos, se poderá (eventualmente) chegar a entender (em parte) a razão da demissão da Direcção. No entanto, provavelmente, as razões decisivas, comuns às direcções anteriores, foram (bem) outras (remeto-vos para as notas). Estarão ligadas (até melhor prova) a falhas no seio da própria equipa directiva, a falhas da equipa directiva com (alguns) clubes, e vice-versa. Poderiam ter (alguns desses conflitos) sido resolvidos com mais tacto? A faúlha final (ou o pretexto final?) é atribuída à crescente falta de tempo disponível. Diferente das direcções anteriores?
Quem é Filipe Mendonça (o novo Presidente da AASB)? Que vantagem dispunha (eventualmente) sobre o candidato da Lista A? Não consegui obter uma resposta que me satisfizesse por completo, confesso, todavia, terá sido por apresentar uma lista de continuidade e por ser filho da terra. Jovem engenheiro em início de carreira e surfista desde a adolescência, havia acumulado (alguma) experiência na organização de competições internacionais. Pertencera à USBA, onde chegara a Vice-Presidente. Havia (ainda) participado na reunião (inicial) do Castanheiro que iria levar à criação da AASB, no entanto, como preferisse reactivar a USBA a criar (do nada) uma nova associação, afastara-se. Mais tarde, porém, agradado com o rumo escolhido (entretanto) pela AASB e (extremamente) descrente do rumo que (no seu entender) esta tomaria, caso a lista B (a única até então apresentada) vencesse as eleições (sobretudo no pendor mais empresarial, assim a classificou), avança com a lista (A), (apanhando completamente de surpresa aquela outra lista). Dito isso, qual foi a proposta de Filipe e da sua equipa? ‘Reforço do desporto federado em todas as ilhas, aumentando o número de atletas e praticantes, integrando mais clubes na AASB, dar mais visibilidade do desporto de ondas nas várias ilhas e trabalhando com as várias associações e clubes no sentido de apostar na formação de treinadores e juízes, bem como na formação e treino de atletas.’ Como seria isso possível? ‘Trabalhar em conjunto para fazer lobby junto das entidades regionais e patrocinadores para canalizarem parte do investimento que tem sido feito, para os escalões de formação e para a dotação de infraestruturas de apoio que permitam o desenvolvimento da atividade (ex.º edifícios de apoio para os atletas/praticantes guardarem material nas praias, zona de ginásio, duches, proteção contra a chuva e vento, apoio aos clubes para o transporte dos praticantes/atletas entre os estabelecimentos de ensino e os locais de treino, ATL ligadas ao Surfing, apoio à aquisição de material para famílias carenciadas, entre outros).’ Queriam ‘prosseguir com o aumento do número de atletas, dirigentes, treinadores e juízes federados.’ O plano, apresentado em Novembro, viria a morrer no mês de Junho seguinte. Seria o programa da lista A diferente do da lista B? Não sei.
Que acontece (nesse entretanto) na capital do Surf? Pela primeira vez, a Direcção da AASB integrava elementos ligados à Cidade da Ribeira Grande. Marco Medeiros (o responsável pelos nadadores-salvadores da Costa Norte e surfista divulgador das ondas gigantes da costa Norte) entra como vogal e José Moreira (piloto da aviação civil) entra como relator do Conselho de Disciplina. Vai (até) mais longe essa ligação. Francisco Faria e Maia (tesoureiro, formado em gestão de empresas e hoje profissional no sector das seguradoras) passava os verões nas Caldeiras da Ribeira Grande e nas Poças (Piscinas). Onde pela primeira vez se aventurou no bodyboard. O próprio Filipe passava os verões nos Moinhos. Francisco Cabral de Melo morara na Ribeira Grande (passando verões nos Moinhos). Até Paulo Ramos (Sagão) trabalhava (ou já trabalhara) na Secundária da Ribeira Grande. Aparentemente, havia bons motivos para (esta) crer numa mudança favorável ao Surf da Ribeira Grande (e da Ilha). Para 2023, a AASB revelou à Câmara o seu calendário de provas. Tão ou mais importante, foram as ‘questões logísticas relacionadas com o surf, na Praia do Areal de Santa Bárbara.’ A autarquia comprometeu-se a ‘continuar a cooperar com a AASB no reforço da marca ‘Capital do Surf,’ assim como nas respetivas atividades.’ Nessa mesma reunião, ‘o projeto ‘Save The Waves,’ mereceu uma tomada de posição conjunta: ‘quer a Câmara Municipal, quer a AASB, reforçaram o seu compromisso e empenho para com o propósito ambiental do mesmo.’ Em finais de 2022, cinco anos após a revelação (ao público em geral) da onda da Viola, Marco Medeiros - já fazendo parte da Direcção da AASB -, revelara a onda gigante da ponta do Farol dos Fenais da Ajuda. Era (seguramente) a maior dos Açores. Quanto (ainda) a ondas e à sua protecção (algo que deve ser sempre visto à luz da intenção - ainda não concretizada -, da candidatura da Ribeira Grande a Reserva Mundial de Surf), em finais de Novembro de 2023, no Teatro Ribeiragrandense, ‘a Portuguesa Surf Festival, em parceria com a Câmara Municipal da Ribeira Grande, com a Associação de Surf da Terceira (AST) e com a Save The Waves Coalition,’ apresenta ‘uma mostra de cinema relacionada com a literacia sobre a proteção dos oceanos, das ondas e da sustentabilidade, da qual o surf é parte activa.’ Voltando a 2023, na recepção à visita da ‘(…) Associação para a Formação, Investigação e Desenvolvimento Social dos Trabalhadores, sobre o teletrabalho e os desafios laborais que se colocam no pós-pandemia’ Alexandre Gaudêncio voltara a referir ‘a aposta na atração de nómadas digitais e na valorização da marca Ribeira Grande enquanto capital do surf.’ Na BTL, a autarquia (que entende a atracção turística de forma bastante abrangente) volta a colocar em grande destaque (além das provas de ilha e regionais) a aposta no Surfing: uma etapa do nacional de surf, o Allianz Ribeira Grande Pro e a World Surf League, com o Azores Pro.
Prova (mais uma) de que as praias da Ribeira Grande eram essenciais ao surfing, vem no Edital de 1 de Junho da Capitania do Porto. Dos 28 ‘corredores’ disponibilizados aos desportos ‘de deslize,’ 17 situam-se nas duas praias gémeas da Ribeira Grande: Santa Bárbara (8) e Monte Verde (9). Enquanto se (re)confirma a (estreita) ligação entre as actividades no litoral e a (construção da) via litoral, em Junho desse ano de 2023, confirma-se o (renovado) empenho da autarquia pelo (marginalizado) Monte Verde. A autarquia ‘aprovou por unanimidade a nova unidade de execução do Monte Verde (…).’ A propósito dessa praia, André Rosa, surfista e arquitecto, que a conheceu bem de perto, deu lá aulas de surf, diz: ‘tem condições melhores ainda do que as de Santa Bárbara.’ Porquê? ‘Porque tem vários pontos de acesso. Está dentro da Cidade e está perto de tudo.’ Conclui: ‘Precisa somente de estruturas de apoio e de resolver o saneamento básico. ’ E diz ainda: ‘São – no mundo inteiro -, poucas as cidades que têm dentro de si praias. Qualquer autarca do continente roer-se-ia de inveja do colega que tivesse uma praia dentro da sua cidade.’ O que propunha a unidade de execução do Monte Verde? ‘(…) Um novo acesso à zona litoral, através da rotunda do surfista, mas também (da) criação de novas zonas públicas como um amplo parque de estacionamento para a praia do Monte Verde e um parque urbano que servirá de apoio à praia e toda a zona envolvente.’ Ainda em Junho, ‘devido às condições do mar,’ a praia de Monte Verde foi ‘o local escolhido pela organização’ da Liga MEO Surf, o Allianz Ribeira Grande Pro 2023. A autarquia garantia que ‘as análises à qualidade da água são excelentes, pelo que é seguro fazer-se a prova naquele local.’ Informava (na mesma nota) que iria ser lançado até ao final do mês o concurso público para a requalificação de uma zona envolvente à praia do Monte Verde ‘pelo valor de 4,1 milhões de euros.’ Numa entrevista a um jornal da Ribeira Grande, Gaudêncio repetia (ainda) a intenção da autarquia em resgatar aquela praia: ‘(…) estamos a terminar as obras de saneamento básico da cidade que vai permitir limpar definitivamente aquela praia.’
Mais uma boa notícia. Em Outubro, é inaugurado um ‘alojamento turístico para surfistas, o Surfin Azores, o novo Eco Surf Lodge localizado na freguesia da Ribeira Seca,’ algo que poderá vir a ter (bastante) impacto no futuro. Que é ‘o único surf camp desta empresa internacional nos Açores.’ O Presidente (na ocasião) destacou (ou volta a destacar) a tentativa (entretanto já com algum sucesso) em atrair ‘nómadas digitais,’ adiantando um (novo) motivo adicional: ‘a abertura da Incubadora de Empresas da Ribeira Grande.’
Ora, se a autarquia (com a demissão da Direcção da AASB) tinha motivos para estar apreensiva, outro tanto teriam os pais da Ribeira Grande – que desejassem pôr os filhos no surf -, e os surfistas (da primeira e segunda levas). Acusam os clubes/empresas: de só quererem ‘dinheiro.’ Acusam a autarquia e a ASSB: podiam fazer melhor. Sei, de fonte segura, que (ambas) prometem (tentar) fazer mais. E criar um clube (de preferência escolar) de surf da e na Ribeira Grande? Luís Melo conta que um dia, estando com Rodrigo Herédia a surfar na praia do Monte Verde, defronte da Vila Nova, Herédia lhe terá dito: ‘Não tardará muito a sair dali campeões.’ Será que (um dia) iremos lá chegar?
Café Lectus – Cidade da Ribeira Grande (continua)