O Macaco, a Matrix e Eu

Por razões que desconheço, hoje me vi envolvido por dois pensamentos, duas cenas, duas possibilidades de existência que antes não me dera conta. Talvez por supor que tais pensamentos pudessem suscitar questões que eu não estava preparado em responder, fui, sem consciência, deixando que elas dormissem no canto inexplorado de um Eu que, quase sempre, prefere a quietude.

Fato é que hoje o meu Eu, como se quisesse gritar, resolveu soltar seus (meus) cachorros.

E hoje duas cenas, ou possibilidades de existências, resolveram dar as caras. Então, vamos a elas e se possível, procurar dar algum sentido (se é que há sentido) no que me parece ser a descoberta de um Eu que não imaginava possível.

A primeira cena que me ocorreu é conhecida e se tornou clássica. Trata-se da cena de abertura do filme 2001 - Uma Odisseia no Espaço. Um macaco joga um pedaço de osso no espaço que logo se transforma numa nave espacial. Penso nessa cena como a transposição do macaco - nosso ancestral - para o homem moderno que explora o espaço com suas tecnologias e conhecimentos. O salto proposto pelo arremesso do osso, me suscita pensar no quanto rápido se deu nossa caminhada.

A segunda cena se refere ao tema do filme Matriz. O tema central indica que hoje (o tempo do filme não fica claro) vivemos numa Matriz, ou seja, nossa vida e existência não é nada mais que meras percepções, simulacros, de uma "existência" programada. Nada acontece sem estar previsto na matriz. A tentativa, ou busca, de superação, depende de um "escolhido" ( essa referência, de certo modo, me leva a pensar num Jesus para os nossos tempos) que saberá o caminho da saída da Matrix.

A primeira cena, a do macaco, me faz pensar num tempo que a evolução seria um processo inevitável. Saímos de um caminhar curvado para o ereto e daí o mundo surgiu a partir do nosso horizonte.

No mundo da Matrix, tudo acontece num universo dominado pela conectividade.

Esse mundo da super exposição, da hedonização como medida de existência, me assusta. É assustador imaginar que minha existência só terá sentido se o Outro referendar. O Outro aqui não é o mesmo da psicologia (esse nem existe nesse espaço), que existe para que juntos o Eu e o Outro, existimos concomitantemente. O Outro, desse mundo da hiper-exposição, existe e me dá existência se eu existir enquanto possibilidade de renderização, ou seja, enquanto eu for renderizável para um mercado marcado cada vez mais pelo consumo enquanto medida de todas as coisas, eu existo. Eu sou os algoritmos que me são. Nesse amálgama de infinitude, isto é, de indivisiblidade e invisibilidade, a possibilidade do indivíduo cede lugar para um falso apelo ao coletivo. Falso porque o que se busca não é um coletivo como sinônimo de compartilhamento.É um coletivo vigilante como um Outro, um Big Brother, que mapeia cada ação como um passo rumo à renderização. Nesse coletivo, falso porque, de fora, é controlado por alguém de olhos no quanto poderá ganhar com cada ação renderizada, o indivíduo morre em nome de uma suposta vida em comunidade.

O direito de ser esquecido - movimento espanhol que enfrentou ou Google, em 2011 - foi um grito de alerta. O direito de ser esquecido é tão necessário quanto para Neil o é para sair da Matrix. Todavia, outra questão aparece: teria o macaco jogado o osso para o alto como um sinal de que somos só ossos. Que, tal qual o osso que flutua no espaço, não é sinal de que somos osso e espaço num só, a mistura cósmica? E a Matrix, nosso mundo conectado e caótico, não seria outro sinal? O sinal de que romper os fios podem ser nossa salvação?

Enfim, só perguntas.Respostas? Dê a sua.