Devir selvagem na academia e na klínica

     A invenção do Esquizodrama marca a obra de Dr. Gregório Franklin Baremblitt, foi o momento em que ele realmente assumiu um "nome próprio", quando se tornou um "autor", pois cria um novo regime de enunciados e práticas original e singular. Não se restringe a reproduzir ou aplicar conceitos da Esquizoanálise, mas sim a produzir novos conceitos, instrumentos e máquinas abstratas que fomentam processos de desterritorialização e transformação. 

 

     Ele foi o "guerreiro do devir", e sua obra está marcada pelo agenciamento de sínteses diversas entre klínicas, políticas revolucionárias, ética da amizade, rebeldias e agires como realização conectiva de processos de transform-ação, pensar em clínica com "k‟ é pensar numa klínica do diferente, uma clínica que coloca a frente um espaço para que sejam experimentadas outras formas de viver, espaço a ser construído criativamente por todos os agentes envolvidos. A klínica com k está à altura do acontecimento, de fazer uso de um processo histórico para romper, criar bifurcações, em movimento de exercício da invenção de si. A klínica seria, portanto, um conjunto de práticas voltadas a pensar o desejo e suas produções, não se restringindo a uma teoria psicológica propriamente dita. Tratarse-ia de um saber-fazer preocupado com a variação na potência de si; um saber que, para além de pensar as “curas”, volta-se para a produção de subjetividade e, sendo assim, também às formas de sofrimento e de empobrecimento da vida.

 

     Pensamos numa klínica para prestar atenção às várias linhas que o sujeito é atravessado, não somente às linhas duras (aquelas que vêm ensinar formas corretas de vínculo, sobre o papel de mãe, etc.), como também às linhas flexíveis (dar voz para as diversas formas de ser mãe hoje).

 

Porém, como pensar isso em um lugar onde as dores são tão marcantes e onde existem encarceramentos sobre a concepção de maternidade?

Como pensar em linhas de fuga para o papel de mãe entre grades de linhas duras?

Ou então, quando a separação se torna iminente e lhes é tomado o direito de abrigar seu filho, como desconstruir o conceito de maternidade estando em meio a mudanças rápidas e dolorosas e em meio a estereotipias sobre ser mãe?

 

     Alguns formatos de respostas surgem, falas que trazem em si linhas tênues e flexíveis, de aceitação das condições consequentes de sua situação ou rupturas, onde linhas de fuga estão se formando a todo o momento. Dito de outra forma, a klínica se constituiria para ouvir essas vozes encarceradas... para "autorizar" outros tipos de maternidade, para dar apoio, produzir uma escuta flexível.

 

O desejo não parte de uma falta originária, é positividade e produção;

O delírio não é familiar, mas é histórico-universal;

O inconsciente não é figurativo-representativo, mas sim pragmático-produtivo, atuando como uma usina de intensidades (Deleuze & Guattari, 1980/1995).

 

     Para Baremblitt (1998) "o Inconsciente Esquizoanalítico estará pensado como um processo produtivo puro, não formado de representações nem de forças econômico-dinâmicas que mobilizam as representações ou papéis, seja de um Teatro ou de uma Linguagem, sendo como um incessante produzir caótico que, ademais, se produz a si mesmo e produz a realidade como renovados"(p.114). Portanto, nessa perspectiva "o inconsciente extravasa, não cessa de se desterritorializar e não partilha da lógica da negatividade, mas sim das multiplicidades positivas e contínuas".

 

     Gregório, com suas teorias e práticas, figura como uma máquina de guerra (Deleuze & Guattari, 1980). Gregório é a expressão de um pensador e klínico nômade, sempre em movimento, compromissado com a transformação, os fluxos desejantes, um novo mundo, novos sujeitos e na realização de uma Utopia Ativa. E nos deixa com uma maquinaria conceitual e de intervenção klínico-social, o Esquizodrama, que é um convite para que possamos exercer a inventividade da potência de nossos pensamentos para criar novas práticas, novos regimes de enunciados e processos de subjetivação.

 

Baremblitt, G.F. (2004). Psicoanálisis y esquizoanálisis (un ensayo de comparación crítica). Buenos Aires: Argentina: Asociación Madres de Plaza de Mayo. 

Deleuze, G. & Guattari, F. (1972/1976). O Anti-Édipo. Rio de Janeiro, RJ: Imago. 

Deleuze, G. & Guattari, F. (1980/1995). Mil Platôs: Capitalismo e Esquizofrenia, Vols. 1 a 5. São Paulo, SP: Ed. 34.

Deleuze, G.; Parnet, C. (1998). Diálogos. Trad. E. A. Ribeiro. São Paulo: Escuta.