Segurança e liberdade
Freud, em “A civilização e seus descontentamentos”, citou uma frase de Goethe, “Nada é mais difícil de suportar que uma sucessão de dias lindos”.
A felicidade, sabemos, são momentos e é vivida quando o sofrimento é interrompido. Freud continua, sofremos a maior parte do tempo, e neste mesmo tempo tememos o sofrimento.
Freud, Hobbes, e Bauman definem nossos sofrimentos como inevitáveis e veem nele a busca e o início do nosso processo civilizatório que nada mais é, dizem eles, que evitar sofrer construindo um mundo mais hospitaleiro e menos perigoso.
Aí entramos em um jogo de custo-benefício em que a segurança é inversamente proporcional à liberdade. Os nossos impulsos conflitam com os ideais de uma civilização determinada a enfrentar e vencer as causas do sofrimento humano. A hostilidade cessaria se fosse possível atender, ao mesmo tempo, às demandas coletivas de uma sociedade segura, com as liberdades individuais. Mas isto não ocorre.(Texto adaptado Zygmunt Bauman, Cegueira moral, a perda da sensibilidade na modernidade líquida, Ed. Zahar,2013. p. 119-122)
Segurança sem liberdade é escravizante e liberdade sem segurança é o caos social, um mundo de olho por olho, dente por dente. Liberdade e segurança são e sempre serão mutuamente inconciliáveis. Há que se pesar e dosar as duas em diferentes momentos e espaços sociais.
Estamos presenciando à distância duas guerras que podem se encaixar neste cenário traçado por Freud, Hobbes e Baumann. Onde está a liberdade e onde está a segurança de uma nação? No meio da barbárie existe possibilidade de negociação? De que modo o Estado pode assumir o seu papel civilizatório e assegurar a liberdade individual de um povo? Nosso processo civilizatório está ou sempre esteve em crise? Quais instituições e quais valores estão vigorando hoje, em diferentes partes do mundo?
Márcia Cris Almeida
19/10/2023