DA FOTOGRAFIA MONOTEMÁTICA DO CINEMA BRASILEIRO

Aqui a descrever meu pensamento, cujas perguntas e respostas me permeiam há tempos, começo a dizer que o meu presente texto se concretiza a partir do momento em que, há pouco, me deparei com um belo documentário intitulado, "DE SALTO PARA O CINEMA", feito pela TV CULTURA nos idos de 2001 e que, a princípio, fala da vida e obra do Cineasta Anselmo Duarte. Mas, na verdade, ali se fala muito, MUITO MAIS !

Ali encontrei o fio da meada para os meus questionamentos sobre os caminhos do CINEMA BRASILEIRO.

Entendi ,principalmente, que falar de Anselmo Duarte, não é apenas falar da arte, mas sim, falar do âmago da antropossociologia brasileira.

É falar dos alicerces...e das batutas. É explicar o todo do que viria depois...

Ali, de súbito, vendo e ouvindo a História do nosso Cinema, encontrei várias respostas aos meus sentimentos angustiantes que, cada vez mais, englobam meus tantos porquês.

Costumo sentir que, nas artes em geral mas principalmente nas telas do Cinema Nacional, estamos MONOTEMÁTICOS.

Impressionantemente repetitivos. Chatos até.

Como se desenhássemos a cinematografia da ineficiente mesmice sócio-política histórica.

É como se (peço licença para expressar o que sinto) contando histórias, fizéssemos uma auto difamação inconsciente.

SInto que , pelas telas, somos quase depreciadores da existência de nós mesmos.

Lamentamos...ao mesmo tempo em que " empoderamos", vendemos e difundimos ao Planeta as nossas tantas misérias holísticas, as que parecem insolúveis a um acurado observador que compara a tela do cinema às sempre mesmas telas reais.

E sentimos orgulho delas. Isso é uma arma política surreal, a meu ver.

Uma indústria que nada lucra ao meio, a não ser o possível lucro ao que não se vê tão claramente...por detrás das telas.

Falamos sempre das mesmas coisas, das mesmas surrealidades, maquiamos nossas falências estruturais e humanitárias, e damos "pseudo" dignidade artística aos temas indignos.

Desviamos todas as atenções como se num palco inconsciente, onde as cortinas se fecham com aplausos efusivos às nossas dores.

Confundimos dignidade da pessoa humana, a que todos temos, com "empoderamento" do cenário de vida indigna.

E sonhamos com prêmios e bilheterias que não enxergam a triste realidade dos bastidores.

E o mais triste até hoje: sessenta anos depois , desde que o PAGADOR DE PROMESSAS, filme que contou com imensa repercussão política na época e que explodiu sucesso aqui e no mundo, sendo premiado em vários festivais de cinema, ainda não conseguimos mudar o nosso tema, a despeito de tanta temática "progressista". Por quê? Por quê?

Deve ser porque realmente a arte se sustenta das vidas...não apenas no sentido figurativo.

A figuração apenas existe ao contrário, quando AS VIDAS MONOTEMÁTICAS TENTAM SE SUSTENTAR DA ARTE.

Como na insistente procura duma , quiçá, existência boa, ainda que numa tela fictícia.

Por quê?

Sinto que...se se acabasse como o sofrimento dos atores das vidas acabaria também o nosso Cinema de tema único.

Posto que...mais que MONOTEMÁTICOS, estamos engessados na mesma triste fotografia de meio real, na AUTO PIEDADE dos mesmos cenários da paisagem de tela sofrida e degradada, cada vez mais "em fade"; duma "vintage e violenta existência", a que se prolonga no tempo sem muitas mudanças sociais e estruturais a melhor; estamos numa couraça hermética que nos emoldura, de forma cada vez mais perene, às nossas crescentes adversidades de gente que parece ter se perdido de seus próprios caminhos de futuro.

Aos poucos, também através do Cinema, vemos que perdemos o poder de comparação dentre o que é ruim, bom e melhor...às nossas vidas.

Qualquer coisa serve! Aplaudimos o recebimento de migalhas daquilo que já nos é DIREITO FUNDAMENTAL DE TODOS.

Podem observar: Não mais conseguimos enredos que levantam as plateias!

A sensação de expectador é sempre aquela , a mesma que hoje sentimos ao assistir às deteriorações das vidas pelas ruas, calçadas e marquises: "hum...acho que já vi esse filme..." -Roda outro!!

Por quê?

Porque os temas e as direções dos roteiros não estão apenas nos instrumentos, nas boas técnicas de se fazer arte cinematográfica. É preciso cumprir a tarefa.

Pelo que vi -e tão bem senti ali no documentário- é sempre preciso saber qual o senhor a se servir...ou a se refutar nas telas.

É preciso nelas traçar os caminhos sócios políticos dum era fadada a não mudar nunca!

Tanto quanto aquela GENTE HUMILDE da famosa e sensível letra da MPB , a que vive na carne a dramaturgia DOLORIDA E DOLOROSA , gente sempre campeã "empoderada de si mesma", pelas telas "on line" das nossas vidas.

-Ah, que vontade de chorar...

...e choramos, sempre.

Gente que não consegue caminhar para frente porque perenemente é lhe subtraído o tudo que é fundamental à existência.

No documentário, alguns diálogos do próprio cineasta me chamaram a atenção sobre o que discuto aqui :

" O MUNDO PRECISA SABER QUEM SOMOS NÓS"

Sim, Anselmo Duarte, faz tempo que o mundo já sabe. E, decerto, arregala os olhos...

De repente, por ali, TÕNIA CARRERO , no final do documentário opina sobre os tais temas sociais cinematográficos e, finalmente e também sem perceber, me explica o porque da nosso "status" tão monotemático:

Das telas, ela disse, é o "Brasil das histórias que assombram o mundo!"

Ela foi cirúrgica! É isso mesmo!

Sessenta anos depois, tudo igual , aliás bem "multitelado", não fossem a evidente piora das enredos monotemáticos e a notória perda da qualidade dos artistas da dramaturgia brasileira.

A cada dia fazemos uma história de horror mais assombrosa do que a outra...

E eu pergunto: Como, afinal, mudar o nosso tema...da vida real para o cinema?

Posto que é preciso entender que nem toda audiência explosiva sobre uma tela , ou sobre as realidades vividas, inspira a crítica a lhe ratificar a excelência da obra ou a dos grandes feitos.

O que assombra pelo ruim sempre dá mais olhar ao que parece ser o óbvio corrente do melhor.

Do que deduzo que somos , ao menos, campeões das "assombrações".

Concluí que o sucesso do PAGADOR DE PROMESSAS , a despeito da qualidade irrefutável do filme, talvez nos tenha sido como tirar a grande sorte num jogo dum iniciante.

Nunca mais repetimos o grande feito...porque não sabemos inovar. Sinto que estamos apequenados.

Paramos no tempo para só protagonizar as nossas tragédias.

O andamento do nosso cinema pelo tempo explicita o gelo social, sempre de embasamento político, que enxugamos gerações após gerações...

Continuamos congelados.

Até quando , tão enfadonha e monotematicamente, exploraremos nossas dores para sangrarmos de todas as formas tanto quanto para fazer e vender cinema do sempre igual e surreal?

Até quando um exército de "bondades artísticas" se fartará de endorfinas circulantes a apenas contar histórias socias que não mudam nunca e que, a bem da verdade, ninguém as pretende mudar?

Afinal, quem apagaria seu próprio cenário, palco de sobrevivência, ainda que tão degradado?

Somos duzentos e dez milhões de brasileiros, dotados de cérebros inteligentes, em "software" neuronais configurados pela multidiversidade genética do Planeta; então, será que não temos mais nada de melhor a criar para assombrar o mundo ao contrário, ao menos nas telas?

Fica a pergunta cidadã, de quem adora cinema.

Decerto deva ser bem mais impossível , mesmo com bons contrarregras, consertar um pouquinho da vontade e dos olhares dos bastidores.

Afinal, no ensaio pelas telas da vida, jamais saberemos todos os porquês...

Seria preciso um binóculo microscópico às almas para entender o macro do todo.

E às tantas perguntas diante da mesma cenografia montada pelos tempos... só a Deus pertencem as verdadeiras respostas.