Sobre o livro e a minissérie Todo dia é a mesma noite de Daniela Arbex, Ed.Intrínseca, 2018

Assistir esta minissérie é assistir a dor de seres humanos que lidam e tentam superar a perda abrupta de seus filhos. É testemunhar, gradativamente, com as provas apresentadas que a tragédia poderia ser evitada se cada um fizesse o que devia ser feito. A legislação legislar, o executivo executar e fiscalizar, o judiciário julgar, doa a quem doer, e os empreendedores cumprirem a lei. Foram 242 vidas perdidas, há dez anos atrás. Até hoje a justiça não resolveu e puniu os responsáveis.

O nome do livro e da minissérie me lembrou a noção de Nietzsche (filósofo alemão, 1844-1900) de eterno retorno. Para ele tempo é cíclico e vivemos várias vezes situações do passado. A fala final de um dos personagens lembra este ciclo. Ele referencia vários acontecimentos que foram julgados culposos, assassinatos sem intenção de matar e que por falta ou escassa punição, continuam acontecendo. O que muda é o cenário e os personagens: ..."se um carro derrapa na chuva e bate em um outro é um acidente, mas se um motorista bebe uma garrafa de pinga e atropela um pedestre, ele assumiu o risco de matar. Se um barco vira no mar bravio é um acidente, mas se alguém coloca 142 pessoas em um barco que tem capacidade para 62 e o barco naufraga por excesso de carga e não tem colete salva vidas para todos, ele assumiu o risco de matar. Se chove e há um deslizamento, é um acidente, mas quando um executivo coloca um restaurante no caminho da barragem de Brumadinho, ela rompe e mata todos que estavam lá dentro, ele assumiu o risco de matar"...

Até quando nossa humanidade assistirá e suportará este eterno retorno? Exigir resposta a esta pergunta e usar os recursos da sociedade para resolvê-la, é um ato político que vai além desta política partidária de discutir fatos e pessoas. Precisamos pensar grande se quisermos destruir comportamentos e construir algo . Sem isto, continuaremos a discussão rasa em que só mudam os nomes. Ficamos presos em um eterno retorno.

Márcia Cris Almeida

14/02/2023