pés descalços
dela parte#
Certos dias acordo e demoro para perceber quem sou. Aflita, antes de abrir os olhos, canto. Suspiro aliviada ao ouvir minha voz ainda rouca, rasgada, alcançar os agudos que antes não podia nem sonhar. Ainda de olhos fechados, procuro meu sexo, e sinto na ausência do que não palpo a alegria do prazer antecipado. Já posso olhar, não tenho medo, estou certa de encontrar meus novos peitos perfeitos, redondas maçãs deliciosas que mais que tudo me fazem bem. Meu corpo é todo fêmea. O titubear matinal é só reminiscência do que fui, já não sou mais. Levanto, tenho corpo e nome de mulher. Sou Catarina que dança nas noites de lua nova, trança as pernas ainda bambas, não acostumadas aos saltos altos, mas roda a saia e dança. Toda menina sabe dançar, não fui menina, ainda tenho muito que aprender, sou mulher que não foi menina. preciso ter paciência comigo. Saio do quarto em passos lentos. A cozinha, a sala, estar, jantar, tudo novo para uma nova mulher. Caminho firme pela casa, é cedo ainda, pés descalços.