UMA DISPOSIÇÃO GOSTOSA
Guardei-a para dias realmente ruins, a disposição gostosa. Aquela que nunca acontece quando o assunto é encarar a sociedade.
Guardei-os (os dedos nos bolsos), pequenos, finos e delicados, mãos de quem já entardeceu (ainda que na flor da idade), pois minha alma é uma velha caduca e cansada na fila do pão. Quero os mais acendidos nas trevas do forno, bem moreninhos. Repousam acariciados pelo calor e fermentam como juntas de gravetos na lareira. Gosto assim, quanto a mim, transcendo, agonizante, passo a passo enquanto ouço papos tão suaves como um soco sobre um programa que acompanha celebridades que graças ao bom Deus não conheço um nome sequer. Chagas em meus ouvidos. Mas enfim...
Dia desses, um dos comentários me dizia sobre o quão bela é a vida... Eu, em meu estado neblina, apenas li sem maiores pretensões, como respondê-lo. Hum, tão finos argumentos. Coisa de jovem composto de células ainda tão sedosas. As minhas pálpebras já acariciadas pelo sono... não consegui chegar ao fim daquelas letras peregrinas. Que pena... Logo eu, tão calma feito a neve, e gélida. Palavras que pareciam borboletinhas entre jasmins, ignorando os mistérios alegóricos da morte! Espirrei gostoso sobre todas elas.
Ainda não usei daquela disposição gostosa, fui impedida pela sociedade que despreza os meus suspiros preguiçosos. Nada, onde ela está, existe de bom para mim. E... dou-lhe, muitos obrigadas, desde já, se expirar em sua boca as palavras felizes. Mesmo um oi me parece levemente comprido e melindroso, que sei, à espera de resposta. Me dá desgosto só de pensar. Que nada, estou brincando! Não. Tentei agora mas falhei miseravelmente. Não quero ser simpática hoje. Mesmo que diante da sua divina formosura sempre otimista a desmaiar de gozo apenas pelo fato de existir e que sem você todo o resto morreria. Ah, essa ideia que temos! Sonhamos sempre uma importância que não temos. Mas sonhamos. E sonhar custa bem menos que o pão. Mas não consigo viver sem pão. Sem a sociedade, sim; sem pão, jamais. Mas Deus abençõe o padeiro! Os agricultores, e todos que estão envolvidos na logística do pão. Amém. Aspiro, adoro esse perfume morno do pão sendo feito! E sigo, até me perder da fila na volta para casa. A civilização me cansa.
Dido - Thank You
Guardei-a para dias realmente ruins, a disposição gostosa. Aquela que nunca acontece quando o assunto é encarar a sociedade.
Guardei-os (os dedos nos bolsos), pequenos, finos e delicados, mãos de quem já entardeceu (ainda que na flor da idade), pois minha alma é uma velha caduca e cansada na fila do pão. Quero os mais acendidos nas trevas do forno, bem moreninhos. Repousam acariciados pelo calor e fermentam como juntas de gravetos na lareira. Gosto assim, quanto a mim, transcendo, agonizante, passo a passo enquanto ouço papos tão suaves como um soco sobre um programa que acompanha celebridades que graças ao bom Deus não conheço um nome sequer. Chagas em meus ouvidos. Mas enfim...
Dia desses, um dos comentários me dizia sobre o quão bela é a vida... Eu, em meu estado neblina, apenas li sem maiores pretensões, como respondê-lo. Hum, tão finos argumentos. Coisa de jovem composto de células ainda tão sedosas. As minhas pálpebras já acariciadas pelo sono... não consegui chegar ao fim daquelas letras peregrinas. Que pena... Logo eu, tão calma feito a neve, e gélida. Palavras que pareciam borboletinhas entre jasmins, ignorando os mistérios alegóricos da morte! Espirrei gostoso sobre todas elas.
Ainda não usei daquela disposição gostosa, fui impedida pela sociedade que despreza os meus suspiros preguiçosos. Nada, onde ela está, existe de bom para mim. E... dou-lhe, muitos obrigadas, desde já, se expirar em sua boca as palavras felizes. Mesmo um oi me parece levemente comprido e melindroso, que sei, à espera de resposta. Me dá desgosto só de pensar. Que nada, estou brincando! Não. Tentei agora mas falhei miseravelmente. Não quero ser simpática hoje. Mesmo que diante da sua divina formosura sempre otimista a desmaiar de gozo apenas pelo fato de existir e que sem você todo o resto morreria. Ah, essa ideia que temos! Sonhamos sempre uma importância que não temos. Mas sonhamos. E sonhar custa bem menos que o pão. Mas não consigo viver sem pão. Sem a sociedade, sim; sem pão, jamais. Mas Deus abençõe o padeiro! Os agricultores, e todos que estão envolvidos na logística do pão. Amém. Aspiro, adoro esse perfume morno do pão sendo feito! E sigo, até me perder da fila na volta para casa. A civilização me cansa.