DO MEDO E DA IDADE
A idade abre caminhos. Não! Não é bem assim. A idade desafia a mente, abala a autoestima, o corpo, a coragem, a força... aguça o medo. A idade, no outono da vida, reinventa a mulher madura, sim. Inspira e desabrocha determinadas escolhas, encoraja o não, ainda que tardio. No entanto, a velhice apavora. Envelhecer de maneira ousada requer explorar a liberdade para caminhos cada vez mais solitários. Então, aqui vou eu, envelhecendo, apavorada diante da perspectiva do mundo. Se pudesse, envelheceria numa caverna, longe de tudo, de todos, para me render cada vez mais, em paz, ao crescimento espiritual, talvez, numa batalha vencida na arena dos ponteiros.
Não sou fã dos cabelos grisalhos e o sorriso das rugas, e não tenho em mim a bravura de poetizar o esquecimento, a demência. Certo dia, decidi que seria boa na arte de envelhecer, falhei. Miseravelmente. Falhei. Estilhaçada em mil pedaços diante do espelho. Foi-se embora toda energia do meu ego. Por outro lado, tenho hoje o que nunca havia experimentado quando bem jovem: o prazer de dizer não para tudo que não quero. Foi como experimentar um grito de guerra. Não há nada mais intenso do que conhecer essa liberdade.
Envelhecer muda o corpo, leva a resistência dos ossos, dos músculos, e a disposição que tínhamos quando na primavera da idade. As horas passam surradas, e ficar em casa ou longe de multidões é bem mais gratificante. Querendo ou não, até o cardápio precisa mudar.
Não, não tenho mais do que 50 anos, nem 47, nem para mais. Mas meu espírito caminha pela classificação da quarta idade. Minha fé também. Claro, muitos são os que mantêm em si toda força e juventude e todo aquele movimento do "envelhecer está na mente". É, sou muito ruim nesse quesito.
Sempre detestei exercícios, e o olhar penetrante diante do espelho em prol dos músculos. Sempre despenquei sobre mim diante de livros. Eu também odeio todo aquele papo fitness. Deus é testemunha do quanto! Sou do tipo que odeia praia e quando sai desse rebanho quente é cuspindo toda a água salgada. Eu gosto de frio, e simplesmente desisto quando o assunto é uma saída graciosa pelo mundo se eu tiver de me deparar com filas. No ano que vem, quem sabe... O pior de tudo é a seleção que vai se fazendo naturalmente em relação a tudo. Pois tudo vira uma questão de poupar o tempo, em pensar prioridades. Nem todos os assuntos interessam mais, não são mais engraçadas todas as piadas, certas relações vão se distanciando, as ideias mudam, vem o desejo crescente de paz, e a razão vai ficando cada vez mais para o fim da fila.
Mas na contramão do que você pensa, provavelmente, tenho humor excelente! Não sou do tipo carracunda, e celebro cada detalhe simples, choro vendo propagandas fofas e continuo a remar mesmo que naufragando.
Envelhecer é uma merda! Tudo começa a parecer um breve momento, talvez o último (e, de fato, é!), mas me tornei uma sobrevivente melhor. Não boa, mas menos pior. Sempre me percebi no movimento contrário da maioria, rejeitando os planos de saúde criados pela mídia, e um cotidiano rico em sedentarismo. Desenvolvi o meu próprio estilo de envelhecer livre da pressão social, pelo menos tento, e continuo aprimorando a minha técnica. Em pouco tempo, mentalmente já terei passado dos 100 anos. Mas em paz do resto do mundo, que é o que verdadeiramente me interessa.