no táxi
só parte#
Voltando pra casa senti tua falta. Inusitado. Pensei. Estamos no táxi. Eu e Francisco. Ele deveria ter em torno de cinco anos. Dormia recostado no meu ombro. Era noite e o contraste do escuro do carro era presente com as luzes dos postes da cidade. Olhei com atenção aquele momento. Era reconfortante sentir o peso e o calor do meu filho junto ao meu corpo. Olhei com um distanciamento. Como se fosse outro eu olhando de fora. Um passo para trás ou para cima. Tanto faz. Olhei com admiração. Como quem contempla uma obra de arte. Aquele corpo miúdo crescia. Não era mais um bebê. Surpreendeu-me olhar para o que via todos os dias. Naquele instante soube que crescia. Tive uma epifania. Não importa se o tamanho do sapato muda. Não importa se ele entendia. Entendi que Francisco era algo fora. Olhei meu filho crescer. A maior odisseia da vida. Admirei-me. Insuflei o peito. Achei que havia feito o que dava para fazer. Isso era mais do que razoável, era exemplar. Criei um ser humano para ser humano. Olhei com alegria. Pensei. Consegui sem ninguém me dizer que conseguiria. Tudo foi rápido. Um presente. Um sorriso. Porém, rápido como uma flecha, meu pensamento pensou em você. Queria você ao meu lado. Encostado no Francisco adormecido. Procurei teu olhar. Como um cúmplice do que havíamos conseguido. Depois de tudo que fizemos e sonhamos construímos outra vida. Incrível saber que você fez algo que pode ser mais do que você. Incrível é amar mesmo sem saber que pode não ser correspondido. Amar por amar. Sem álibi ou justificativa. Amar sabendo que amanhã ou depois será esquecido. Isso não dói. Sentir falta de você neste contraste das luzes da cidade, dentro daquele táxi, é a triste realidade de não ter com quem compartilhar algo insignificante e ao mesmo tempo imensurável. Você não existe mais. Não tem nome e nunca terá. Está tudo bem. Sem lamúrias ou lágrimas. Tudo no destino se diz turno. Não sei. O que sei é procurei um amor ao lado para ter outro olhar sobre a vida que sou capaz de fazer.