EI VOCÊ AÍ, É IDOSO...OU AINDA É GENTE?

Meu intuito é conversar com quem me lê...gente de todas as idades.

Assim, vou lhes relatar fatos do dia a dia para a necessária reflexão sobre O TEMPO nos nossos tempos.

O meu tema não é novo, em absoluto, e surge principalmente a partir da vivência profissional e da observação do meu presente título pela vida que segue também para mim.

Todos caminhamos por ela, é fato; e não há como, a despeito de tantas parafernálias propostas, interromper as transformações , tão complexas em tantas vertentes, operadas pelo fenômeno natural chamado "tempo que segue".

Outra pontuação: não é mérito nem demérito de ninguém qualquer tempo que carreguemos no nosso Registro Geral ou no nosso DNA; tanto quanto não o são a nossa raça, a nossa filiação, a nossa cor, a nossa altura, a nossa escolaridade, a nossa condição social, a nossa convicção política.

Somos o que somos e a nossa Constituição nos assegura o respeito ao pé da nossa igualdade de Direitos, Civis e Humanos.

Tudo que foge disso...penso ser apenas interesse de alguém em manipular o pensamento alheio para obter vantagens quase sempre muito claras.

Todavia, hoje em dia, mais do que nunca, momento em que toda a atenção midiática tanto se foca no necessário combate aos tantos preconceitos sociais, inclusive como bandeira política da promoção da dignidade humana, pouco se vê a discussão dinâmica do "envelhecimento em sociedade" na pauta das "ideologias" muitas vezes apenas militadas "da boca para fora", sem grandes transformações a melhor nas tantas vidas a beira da vida.

Observem: a própria imprensa quando lança uma notícia que envolve "idosos" raramente os identifica como pessoas que possuem nome, sobrenome, endereço, corpo, alma, espírito e história.

Apenas se restringem a informar: "um idoso sumiu nas águas"; há pouco tempo, numa notícia, ouvi um ato falho assim:

" bombeiros resgataram duas pessoas e um idoso". Caramba. Era a fala que eu precisava para ancorar minha reflexão.

Mas, o fato que realmente me deu um torque inspirador final a esse meu pequeno ensaio foi um comentário que há poucos dias li numa rede social.

Um pessoa jovem postava suas belas fotos, onde se via ela e seus pais em férias numa praia paradisíaca.

Num comentário, alguém escreveu assim: "aê, cara, é bom mesmo levar essa VELHARADA PARA FAZER VITAMINA C".

A pessoa que recebeu o comentário apenas e delicadamente escreveu como retorno assim: "muito obrigado, amigo".

Vamos à análise dos poderes conotativo e denotativo da comunicação da língua. Literalmente.

O mais importante é operar a comunicação, dizem os especialistas. E como comunicou...

Bem, aqui, além do meu ensaio sobre o tema que até poderia ser " se ter ou não noção de respeito e educação", seguem uma correção bioquímica e uma outra semântica: banho de sol vale para qualquer idade...mas é para fazer vitamina D, ok?

Para obter vitamina C, que é um antioxidante irrefutável (talvez tenha sido essa a boa intenção da postagem do comentário) podemos conseguir num suco de laranja, limão, ou de acerola, a exemplos. O que longe está de nos garantir juventude eterna.

Já o termo informal "velharada" (reunião de idosos) parece não existir na língua culta, apenas encontramos no dicionário o vocábulo "velharia" que, neste caso, comunicaria ainda de forma mais direta e pejorativa o que aqui proponho discutir, ou seja, uma certa despersonalização flagrante, isto é, o que é ser idoso na nossa sociedade.

Registro, a título de ilustração aqui no meu texto, mais algumas falas que lembro ter ouvido e que muito contribuíram, embora lamentavelmente, para reforçar o pensamento do meu presente ensaio.

Certa vez, foi uma senhora a me lamentar o fato de que acabara de sentar no Metro de São Paulo e um "bando de adolescentes", disputando o mesmo lugar, lhe dissera assim:

"ei, vó, você já sentou muito na vida, agora é a nossa vez!"

Eu a senti profundamente consternada.

E ainda outra vez ouvi assim:" minha depressão retornou desde que passei a procurar emprego e percebo que quarenta anos é tempo demais para o mercado de trabalho".

E mais recentemente, quando tive que adentrar um recinto onde se encontrava uma pessoa doente:

"você não repare porque aqui tem cheiro de velho".

Eu perdi a fala...diante do que ouvi. A frase, dita por uma pessoa quase na sétima década da sua vida, parecia navalha.

Assim, pude aprender e colocar à discussão o fato de que o tal preconceito de tempo, tão crescente e prevalente quanto tão pouco lembrado por aqueles que gritam pelo direito das minorias, não tem identidade nítida. Ou talvez esconda sua identidade.

Segue camuflado como os tantos outros.

Parte ele de todas as gentes, independentemente de raça, de idade, de escolaridade, de condição social e existencial.

Talvez, a única intersecção de déficit humanístico, que por ora consigo identificar entre os protagonistas de todos os fatos que aqui citei, seja a falta de "construção pessoal e social" como "ser humano integral e integralizado", aquela que toda pessoa faz jus pelo tempo de sua vida.

E cuja falta, cada vez mais, grita mudamente e sem ouvidos entre nós.

Em tempo:

Uma sociedade que precisa de Estatutos (como o Eca e o do Idoso) para escrever o óbvio da Cidadania negada por tanto tempo e a todos os tempos... precisa urgentemente rever a gênese dos seus tantos dramas.