Parte 2 do texto ANTÍTESE DO SAGRADO

*Por Antônio F. Bispo

Caso seja do vosso interesse ler a publicação de nº 1 dessa série, favor visitar o perfil dessa mesma página com data de até uma semana anterior e o encontrará.

Nesta série apresento pontos específicos pelos quais uma crença religiosa pode ser refutada (aos que assim desejam ou querem liberta-se disso sem culpa) ao mesmo tempo em que mostro como as relações humanas podem ser aprimoradas e bases de uma civilização mais digna e racional possam ser construídas sem a terceirização de nossas obrigações.

Na ausência dos deuses (ou de suas ideias pervertidas) o homem (ser humano) ocupa o espaço principal e passa a ser o protagonista da própria história, sendo desse modo responsável por suas próprias ações, não lhe restando alternativa alguma a não ser a de viver e tornar melhor o mundo real (em que se vive) ao invés de apostar tudo o que tem (ainda que de mentirinha) num suposto paraíso futuro que nunca virá.

Enquanto gastarmos nosso precioso tempo ensaiando relações de diplomacia e submissão aos seres invisíveis (deuses), nossas relações pessoais definharão ou se tornarão hostis pois toda fé num deus salvador costuma ser competitiva e desastrosa, levando os homens a uma corrida maluca de insanidades enquanto se destroem mutuamente à fim de provarem uns aos outros quem entre eles tem um modelo mais bizarro de devoção.

As pessoas que foram ensinadas à buscarem loucamente por um descanso celestial no futuro enquanto desprezam o agora, terão como recompensa as loucuras do presente, não forma de castigo divino mas por imposição própria, como condição de uma imaginária recompensa aos que se sujeitarem aos fardos, abusos e explorações impostas pelos líderes de suas seitas.

As oferendas, devoções, atenção e recursos investidos tentando agradar aos deuses é justamente aquilo que precisamos para que os oprimidos, sem tetos, famintos e enfermos desse mundo sejam assistidos. Somos capazes de construir nosso próprio céu e inferno ou de imputar aos outros parte disso de acordo com nossas ações ou omissões.

Vamos então a continuação do assunto:

1. Deus não é o nome um ser (narrado no outro texto)!

2. O deus bíblico é apenas um entre os milhares de deuses já venerados pela humanidade! Não há deus verdadeiro e nem deus original. Comumente os povos tomam traços das divindades que consideram pagãs (falsas, demoníacas) e agregam às suas próprias, tornando-as mais “poderosas e eficazes” do que anteriormente eram. Aquilo que na outra divindade era tido como um poder das trevas, nesse novo rito será algo do bem. Hoje temos a economia, a indústria, a tecnologia e o material bélico de um povo que definem previamente o quão poderoso este é. No passado tínhamos os deuses imaginários (bem como os ídolos representados) para fazer esse contraponto de julgamento do poderio celestial que eles “possuíam”. Tais seres eram adornados com características surreais e histórias mirabolantes que serviam para controlar os povos de um império e intimidar seus inimigos. Por mais que o desejo dos crédulos seja intenso e a paranoia seja coletiva fazendo parecer que estes sejam reais, as divindades metafísicas são apenas frutos da imaginação humana. Na tentativa de representar o desconhecido numa época em que a compreensão humana quanto ao cosmo e a si mesmo era limitada e o vocabulário para descrevê-los era ainda menor, a referência aos deuses servia para explicar tais fenômenos, além de inflar o intelecto do humano primitivo, que na busca por terras cultiváveis e parceiros sexuais para acasalar eram capazes de dizimar tudo o que estivesse ao seu redor, inclusive os de sua própria espécie quando achavam que os deuses estavam com eles. Usar uma divindade como pano de fundo nessas horas faria com que o fracasso fosse visto como algo concebível (por que deus quis assim) e a vitória serviria de aviso, atestando que aquele líder era um tipo de ungido de deus, podendo inclusive ser (ou se tornar) rei, sacerdote e juiz simultaneamente quando bem entendesse ou contra quem desejasse. Tem sido assim desde então. As sociedades mudam e a compreensão do mundo também, porém o intelecto primitivo será sempre a marca principal de qualquer pessoas ou grupo que tenha como primazia a defesa de uma crença religiosa. Em qualquer nação em que deus estiver “acima de tudo”, a miséria, a manipulação e a exploração do homem pelo homem estará “acima de todos. Toda religião tem um deus criador e mantenedor universal e a este dizem servir. Ao repetir a história desses mitos, o fiel acredita estar vivendo e proferindo a verdade ao mesmo tempo que acha estar no centro dela. Desse modo, sentem vontade de esfregar na cara de todos essa “verdade” que “vivem”. É quase regra geral às religiões. Todas se comportam do mesmo jeito. Em casos raros, uma ou outra prefere manter o círculo fechado apenas aos seus membros e suas proles. As igrejas (que são o produto de uma religião local) por sua vez, além de achar que servem ao deus verdadeiro, julgam também deter o modo correto de servir a esse deus e por esse motivo desprezam ou perseguem as demais (ainda que disfarçadamente). Além do ódio, da ganancia e da ignorância, a falsa promessa de um paraíso no além vida possibilita que o miserável e o oprimido não se rebelem contra os seus opressores e que permaneçam unidos sob uma mesma bandeira, ainda que esta seja a bandeira da morte (como no caso dos crédulos radicais). A ideia de estar sendo vigiado por um deus também serve de contentor para os falsos moralistas, àqueles que precisam de um policiamento invisível para serem pessoas “boas e amáveis” na sociedade. De certa forma essa cerca invisível aprisiona a besta adormecida que há dentro destes, do mesmo modo que ajuda os maus intencionados a esconderem-se debaixo do manto da sacralidade enquanto fazem às escondidas aquilo que reprovam e condenam nos outros. Entre os hipócritas de todos os povos, os líderes religiosos (à grosso modo) costumam ser os maiores predadores entre os crédulos e são estes os responsáveis pela ruina do grupo e descredito do deus qual professam, não os ateus, o diabo ou as tentações mundanas como eles afirmam. Ao perceberem como tudo funcionam, que a igreja é apenas uma instituição humana regida por humanos e não por deuses, os tais podem mentir, explorar e enganar de forma aberta e mesmo assim receberá o apoio dos fiéis e cobertura das leis vigentes de um país. Poderão construir fortunas explorando a ingenuidade alheia e ainda receberão incentivos do estado.

3. A bíblia não é sagrada! É apenas um livro comum, escrito por mãos e vontade humana, não por deuses como muitos são levados a crer. Ela é um compilado de escritos escolhidos à dedo entre centenas de outros, cuja narrativa fizesse parecer linearidade e planejamento por um ser superior, cuja impressão de povo escolhido aos que se apossassem dela livro pudesse ser mantida. A bíblia levou quase dois mil anos para ser totalmente concluída (escrita e selecionada). Povos de diferentes épocas, locais e funções tiveram participações em sua redação, seleção e “milagres divinos”. Alguns de seus escritores podiam estar sob condições psicológicas alteradas por uso de ervar, jejuns prolongados ou alucinações derivadas destes (como era comum a alguns profetas do passado). Outros estavam sob circunstancias físicas adversas, a exemplo de fome, escravidão, perseguições, deportações etc. Abusos de poder e interesses políticos também fazem parte de todo enredo escrito de um povo quando os que estão no comando escrevem a história. Este último (fator político) é sem dúvida o maior de todos os motivos que faz com que a fé de um povo subsista, pois é na unidade da fé que a unificação política de um território (ou povo) se torna possível. A intenção de consanguinidade de uma gente é outro fator preponderante da religião, eliminando por esta feita, os impuros, os pecadores e os amaldiçoados por um deus qualquer. A unidade da fé podia amenizar os conflitos de algumas tribos, quando por meio desta se construíam um mito, deus ou inimigo comum ou quando a ideia de um mesmo patriarcado era validada. Como em quase todo “livro sagrado”, o povo que escreveu a bíblia se fazia perceber como povo escolhido e exclusivo de deus. Cada grupo ou pessoa que lê apenas um versículo desse livro e finge que o entendeu, também tem a mesma impressão de filho privilegiado, baseado apenas na própria presunção e desejo egocêntrico. Nesse livro (assim como tantos outros do passado), há narrativas, epopeias, mandamentos, julgamentos, provérbios, ditados e conjecturas de todos os tipos, tudo isso baseado naquilo que supostamente alguém ouviu dizer sabe-se lá quando. Um deus invisível de múltiplas faces, forma de agir e feito de puro ódio no antigo testamento terá sua imagem sublimada por meio do seu suposto filho, Jesus, o Cristo, logo que Roma passou a dominar o mundo. Na bíblia há mágica e confusão proposital justamente nisso: cada um toma para si o que mais gosta (ou é mais fácil de cumprir), rotula-se a si mesmo de santo e põe a pecha de pecadores nas demais pessoas que não sabem, não podem, não querem ou não aceitam interpretar desse ou daquele modo tal “ordenança divina”. Todos querem tirar proveito próprio em suas interpretações particulares no que diz respeito a bíblia. Á partir de tal interpretação vale-se tudo, inclusive perseguir, humilhar, maltratar e até matar os infiéis, que no caso seriam todos os demais que não pensam ou aceitam como o “escolhido”. Um grupo com apenas 10 pessoas por exemplo, é capaz de entender que o cosmo e todos os acontecimentos históricos do planeta existem (ou existiram) apenas para que este grupinho pudesse encontrar tal verdade e ser salvo por deus no dia do juízo, quanto que outros 8 bilhões de pessoas do presente e tantos outros bilhões do passado e do futuro serão condenados por que não encontraram tal “verdade”. Não há dedução de juízo divino tão perversa quanto essa. Porém ela é basicamente a visão de um “escolhido por deus” sobre si mesmo. A visão medíocre de mundo do fiel que interpreta a bíblia desse jeito não seria problema algum para ninguém a não ser para eles mesmos. A grande questão é que todos eles à medida que crescem, querem subjugar todos ao redor, trazendo-os para esse modo tosco de pensar. A conversão forçada começa com alguém da família, depois um vizinho, um colega de trabalho e por aí vai... Quanto mais poderoso eles se tornam, mais manipuladores serão. Quando menos se esperam, eles constroem partidos políticos, bancadas evangélicas, tribunais da inquisições e abrem franquias de suas igrejas em cada rua da cidade ou em outros países. Ainda que suas atitudes e falas sejam piores que as de um demônio, baseado na “margem de erro” que a bíblia dá, eles sempre autodenominarão santos. A margem de erro da bíblia é de mais ou menos 1000% para o lado que a pessoa desejar. Desse modo, guerras, dissensões e intrigas geralmente seguem os que dizem cumprir a bíblia ao pé da letra. Além disso, consequência irreparáveis serão trazidos aos que são perseguidos por esses paladinos da fé. Mortes, lixamentos, perseguições, cobiças, intrigas, decapitações, estupros, extorsões e tantos outros desvio morais foram e tem sido praticados há muito tempo por meio desse livro ou de sua interpretação tendenciosa. Quando no passado um livro era capaz de produzir esse tipo de comportamento nos leitores, o livro era tido como livro maldito e logo era banido ou guardado às sete chaves. A bíblia é um das poucas obras literárias que continua recebendo o título de livro santo apesar do seu conteúdo induzir em partes à perversão humana. O problema em si não está somente no livro, mas na forma licenciosa, possessiva e pervertida que cada grupo ou pessoa é capaz de fazer dele. Baseado na fé, cada um fala e pensa o que quiser e o mal de suas ações será nulo quando dizem crer no divino, nos escritos e nos profetas. A melhor maneira de cometer um erro grave e ainda ser aplaudido por isso é e fingindo praticar o bem. Portar ou defender esse livro por si só já induz a ideia de bondade aos que o fazem. Defender uma lei e não cumpri-la serve de cortina de fumaça ao suposto defensor. Os que defendem a santidade da bíblia e profanam a santidade dos homens (o respeito mútuo, o cumprimento do trato, a honra nas palavras, intenções e ações) ajudam a destruir os princípios civilizatórios e trazem à ruina à qualquer nação. Cedo ou tarde uma nação caíra pelo culto aos deuses que veneram. Estes (os que preferem os deuses aos homens) profanam a sacralidade das nossas relações enquanto fingem manter intimidade com seres do além. Eles não veem problema algum em derramar sangue inocente, mas sentem-se ultrajados ao perceberem que alguém escreveu deus com letra minúscula, não pronunciou de forma correta o nome do messias ou não chamou pelo nome o líder religioso ao invés de chama-lo pelo título. Invocando a sacralidade deste objeto é possível obter todo tipo de concessão pública para a exploração coletiva. Do mesmo modo que uma grande empresa recebe a devida licença para explorar os minérios de uma região, os religiosos recebem do estado a devida licença para explorar o povo se alegar defender deus, um livro sagrado e a religião local.

CONTINUA...

Texto escrito em 9/1/2022

Ferreira Bispo
Enviado por Ferreira Bispo em 09/01/2022
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