Sertão nonada
Só parte#
Vou brindar à desgraça. Última face do destino. Cantar a tristeza do dentro. Antes tomarei um banho. Sair do dentro e escorrer no fora. Espero deixar um pouco por lá. Tenho raiva de ter vontade de chorar. O acontecimento em cada passo. Cada instante. Cada clique. Mesmo assim piso. Chuto. Maldição. Intuição. Nada falha. A tentativa é ignorar. Ando cansado de seguir com paciência. Ignorante. Não abraço a dor. Repudio à raiva. Há raiva. Desgraço-me. Desgraço os anjos. Desfaço protocolos. Tornei-me um desgraçado. Não me preocupo. Basta lavar a louça. Há desgraça. Escorre pelo ralo. Se sigo assim nem vou precisar de um carrasco. Acabo em mim. Me acabo. Acabo. Termino de lavar esta louça que insiste em invadir minha pia vazia e fim. Serei um homem semnada. Sem teto. Sem casa. Sem língua. De bolso vazio. De cara lavada. Um corpo estendido no meio da estrada. No sertão nonada. E ela. Ah ela é imarcescível. Pura graça. Aglaia, Eufrosine e Talia. As três em uma. Catarina era uma graça. Ela-com-graça refloresce. Transborda. Ri de mim. Faz troça. Espezinha. Disse um dia que iria matar morrendo de rir. Disse que podia sozinha. Ser ela é ser eu. Todinha nós, sozinha. Catarina a grande. Grandeza. Firme forte sadia. Não prego mais os olhos. Tenho medo de não existir ao acordar. Levantar na aurora e já não ser mais. Vencido. Por uma mulher com língua, com graça, com nome. Há um resto de mim dela. Como um bicho que se estima, de estimação. Abandonado pela dona, na beira da estrada. Se-me reconheço nela. Sou um cão-sem-dono vivendo no corpo dela. Que quer meu corpo porque já se desfaz da pele usada. Descasca sua pele de cobra e me despedaça em si. Sou sem pele, pelo avesso dela. Sou ela sem mim. Adormeço ainda aqui. Amanhã serei morto, passado, um nome sem homem, um coração transplantado.