Francisco Papa
Só parte#
Se queres um corpo precisas montar o esqueleto. Disse um anjo torto. Um anatomista obscuro. Já não sei mais quem sou ou quem fui. Confesso. Até riria de mim se conseguisse. O que resta de mim além de você meu filho? Outros restos viraram pó ou sal. Meu filho. Para te parir preciso explicar a mim mesmo. A nós todos quem sou. De que carnes sou feito. Uma costela de mim ou inteira criação? Já não sei o que digo. Leio as páginas de diários escritos por mim e por ela. Sou Domenico. Reconheço minha caligrafia torta. Só há um no espelho e este sou eu sou eu eu mesmo. Mas preciso achar uma explicação para meu ventre grávido de ti Francisco. E eu, autor de mim mesmo, não encontro o enredo correto. Um cãozinho sem patas. Tudo começou com o teu pai. O Homem sem nome. Aquele que parecia um natimorto dentro de um apartamento. Onde era mesmo que ele morava? Agora já não sei. Meu clitóris se avantajou num pênis entumecido. Uma visão cruel da paixão a três. Prostituo meu corpo. Não darei a luz até escrever a história correta que ouvirás desde berço - até que te convenças que foi assim. Explico, um dia, para você Francisco o imbróglio todo. Quero ver. Não sei se por ironia ou por amor só tem um jeito. Serás papa. Sim papa. Não qualquer papa. Papa Francisco. O primeiro. Papa filho de um homem trans. Cujo o sobrenome será Jesus, de filho do pai sem nome. Francisco de Jesus. Sobrenome dos sem pai.