Torre da igreja

Parte#

Era uma vez uma história triste. Dentro de uma cidade submersa em águas guardadas em um vale. Onde só se enxerga a torre da igreja. O resto é água coberta. Verdejante por cima. Escura e densa no fundo. Uma lavadeira vivia com sua família nesta cidade desaparecida. Tinha seus tantos filhos e suas poucas roupas. Naquela cidade havia um córrego. Um fio d’água. Água viva. Nele se lavava de tudo. Até roupas. Um dia (como era de se esperar) uma moça, bem intencionada, apareceu. Queria ajudar. Prometeu um tanque. A vida iria melhorar. A água iria passar. A lavadeira disse não se importar. Lavar roupa é como limpar marchas invisíveis. A moça da cidade insistiu. A lavadeira deu de ombros. Depois o tanque chegou. Ficou no lado de fora do casebre. Como um troféu guardado num canto. Depois de uma chuva. O tanque encheu. A lavadeira sempre deixou os filhos livres. Até que um deles se afogou em águas rasas. Era muito pequeno. O mais pequeno dos pequenos. A lavadeira nunca quis a morte até aquele dia. A moça, depois, desejou a própria morte. O tanque continuou tanque. Um troféu num canto. Depois do enterro. Depois de um caixão do tamanho de um tanque. A lavadeira quebrou. Nunca mais se moveu do lugar. A cidade, depois de algo misterioso, sumiu. Virou um tanque cheio d’água. Virou barragem. E só a torre da igreja continuava vista. A cidade afogou suas histórias. A lavadeira se afogou nestas águas.