Relato 40) - Ayahuasca - Caminho Sagrado - (22/08/2021)

IMPORTANTE: Este local é um espaço de vivência com ayahuasca e não tem nada a ver com a doutrina do Santo Daime, embora a bebida sagrada seja essencialmente a mesma.
Por isto neste relato vou respeitar este contexto, mas vou continuar a usar o termo igreja, para definir o espaço interno onde o trabalho ocorre.

Fomos eu e a esposa.
O trabalho iria começar às 12:00. O número de participantes foi reduzido a 50, por conta do distanciamento social.
Chegamos no Caminho Sagrado por volta de 11:40 e ficamos curtindo o local.
Por volta das 12:00 o sino tocou chamando todos para entrar na igreja.
Dei um abraço na esposa, desejando-lhe um bom trabalho e entramos na igreja.
Os homens entram pelo lado direito e as mulheres pelo lado esquerdo.
Peguei uma almofada, coloquei a blusa na cadeira de uma maneira que ficasse fácil para vestir, caso sentisse frio.
Deixei a garrafa de água dentro da mochila, perto da cadeira, pois se a água fica fácil, a mente fica o tempo todo "com sede", mas na verdade é pretexto, rs. O que ela tem mesmo é medo.
Umas cinco pessoas estavam indo pela primeira vez.
O padrinho Mário fez a palestra introdutória, falou sobre a medicina e sobre o comportamento durante o trabalho.
Recomendou que todos ficassem dentro da igreja durante a primeira parte do trabalho, e que após o segundo despacho da medicina quem quisesse poderia ficar fora da igreja (fora tem um lindo gramado e muita natureza)
E que após o segundo despacho, seria acesa a fogueira dentro da igreja.
Informou também que esta ayahuasca estava mais apurada pois conforme vai sendo utilizada, mesmo preparando-a para o uso, o finalzinho sempre está mais potente.
Sugeriu que o primeiro despacho fosse copinho cheio (50 ml), e os demais (normalmente são 3) fossem meio copinho.
O fiscal (lá se chama guardião) passou e pedi o copinho cheio. Depois outro irmão vinha trazendo uma bandeja com pequenos pedaços de maça
Sentei, fechei os olhos e as músicas começaram a ser tocadas na caixa de som.
Passados uns 20 min, já senti a força chegando. Aquele sorriso gostoso no rosto, o corpo relaxando.
Em determinado momento meu corpo foi aprumado na cadeira. Totalmente ereto, perfilado.
Conduzido pela consciência de outros seres, as minhas mãos trabalhavam no ar, auxiliando na cura da corrente.
Músicas poderosas, xamânicas, indús.
O sino tocou e o padrinho anunciou a segunda dose da medicina. Pedi meio copinho.
Em determinado momento a força chegou com tudo, era a hora da verdade.
Nesta hora minha consciência é quase que totalmente colocada de lado.
O corpo começa a formigar, de baixo para cima e quando chega na cabeça, a própria noção de ter um corpo desaparece ( acho que morrer é assim, rs)
Vou entrando na dimensão astral. Luzes, cores, uma atmosfera totalmente diferente, sentindo a presença de muitos seres, em festa pela minha chegada.
Sinto muito alegria, muito amor, e uma força descomunal toma conta da minha consciência, do meu corpo.
Eu já não existo.
Começou a tocar uma música poderosa, chamando o povo xamânico, com brados dos guerreiros.
Entrei com tudo nesta dimensão. Acoplou-se totalmente sobre mim um poderoso chefe xamânico.
Enluvado em meu corpo, fazia gestos complicados com as mãos, distribuindo os benefícios vindos do astral.
Alguns irmãos lá fora fazendo suas limpezas, eu trabalhando forte.
Trabalhei bastante, com diversas egrégoras.
Mas aí... a mente conseguiu se fazer presente.
Em uma música, o ser que estava acoplado em mim percebeu que a mente estava tentando controlar seu trabalho.
Ele disse algo como "O que você está fazendo?. E sorriu.
Meu corpo se dobrou sobre si mesmo. Fiquei ali sofrendo por um tempo.
Aí aquela voz que quase vejo no ar disse algo como "Você não existe. Você é Deus".
Algo dentro de mim disse "Eu existo".
Ele disse "Você não existe, porque Eu mesmo não existo. Se eu estou em um lugar, como posso estar em outro?. Eu me perco em mim mesmo. E sorriu"
"Somente atráves de vocês, da minha criação, eu me reconheço. Você é como uma semente, que germinou e está se tornando A Árvore"
"Seu medo é deixar de existir. Se você procurar em uma árvore, não encontrará mais a semente. Ela se transformou. Teve que deixar de existir para se tornar algo muito maior"
Este diálogo durou muito tempo, mas o que me lembro é isto.
O sino tocou e o padrinho Mario anunciou o terceiro despacho da medicina.
Até pensei que deveria tomar este terceiro e resolver isto de uma vez, mas não consegui.
Olhei para a esposa, que estava do outro lado trabalhando, totalmente imersa no reino astral.
Em determinado momento "ela" fez gestos que diziam "Levanta a cabeça, reage, se apruma, se perfila"
Mas tive que sair da igreja, pois estava ficando enjoado.
Consciente do intelecto, coloquei a máscara e procurei um lugar onde não incomodasse os outros irmãos.
Tentei entrar no banheiro para fazer a limpeza (vomitar), mas não consegui entrar.
Fui conduzido para um canto, onde tem um tronco e belas árvores, distante dos demais irmãos.
A limpeza não veio, mas eu não conseguia voltar para dentro da igreja.
Fiquei entre duas vozes: A do intelecto e a do medo ancestral que vez ou outra ainda aparece na minha consciência.
A do medo estava procurando convencer o intelecto a não persistir neste caminho, que não precisava ser assim, que eu poderia continuar no caminho do meio.
Meu corpo vibrava muito. O medo não deixava eu fechar os olhos, porque se fechasse entraria com tudo no Reino dos Céus novamente.
Aí uma terceira voz disse "E como vai ser esta "nova vida"? Vai continuar cantando hinos do Santo Daime quando lava a louça, e ouvindo quando vai para o trabalho? Se cantar estará mentindo para si mesmo. A voz não sairá, ficará presa na garganta, pois para cantar, tem que ser a sua Verdade"
"Não vai mais acompanhar a esposa nesta jornada?". "Vai regredir e ficar se espiritualizando, procurando ser uma pessoa melhor?"
A voz do medo enrolou por muito tempo, sempre falando a mesma coisa. Ela dizia "Daqui a pouco isto passa". Não sei quanto tempo fiquei lá fora. 
Consegui voltar e sentar na cadeira.
Voltei a trabalhar, mas aí aquela Voz disse "Agora vem posar de bonito aqui? Na hora que Eu precisava de você aqui você não estava. Agora não há mais tanta Força para mantê-lo completamente aqui (no astral)"
Começou a tocar novamente músicas xamânicas muito poderosas, com cantos de bravos guerreiros. Racionalmente pensei " Se eu tivesse tomado o terceiro estaria trabalhando nesta força"
Ainda sentia o corpo todo vibrando nas dimensões astrais, mas não o suficiente para adentra-las.
Alguns irmãos fazendo fortes limpezas, daquelas que parecem querer virar do avesso.
Me recostei na cadeira e fiquei sentindo os benefícios do mundo astral.
Em determinado momento, olhei para a esposa que estava trabalhando muito lindamente. Então meu corpo foi perfilado na cadeira e deixaram eu entrar novamente. Trabalhei um pouco, sentindo a energia da esposa ao meu lado, depois saí.
Eu Estava triste, por não ter conseguido levar o trabalho até o final, mas esta Voz disse:
"O dia de hoje não foi de derrota, mas sim de vitória. Não percebeu que você não fez limpeza? Ficou lá fora, mas consciente de todas as vozes que fazem parte de sua experiência aí neste plano.
"Este medo está enfraquecendo. A cada trabalho ele vai ficando mais fraco"
"Está perto o dia em que você não vai mais percebe-lo, nem quando está em trabalho com a medicina e nem no seu dia a dia."
"Está perto o dia em que você poderá se declarar "um Ser Realizado", mas mesmo isto não tem qualquer importância, pois quando o ser se Realiza, não há mais uma "pessoa" para declarar nada.
"O trabalho de hoje foi o que deveria ser. Sempre é. Venha sem qualquer expectativa, sempre consciente de que será feito o possível para que você se liberte"
Fiquei por muito tempo em um diálogo com esta Voz, que é firme e amorosa ao mesmo tempo.

O trabalho foi se encaminhando para o final.
O padrinho Mário fez a palestra de encerramento. Sua fala é muito certeira. Falou da mente, do medo e de muitas coisas.
O trabalho terminou por volta de 18:30
Guardei minhas coisas, limpei o local próximo a mim, guardei minha cadeira, a almofada e fui ao encontro da esposa, que estava ainda um pouco no astral.
Comemos um pouco do que levamos (não tem mais a mesa colaborativa de lanches no encerramento, devido à necessidade de distanciamento social)
Ficamos no sítio por meia hora e fomos embora.
Chegamos em casa às 21:00