Imóvel

Parte #

Acordei assustado. Suado. Não estava atrasado. O maxilar doía. Lembrei da vez que usei propanolol antes de uma pequena cirurgia. Ainda era jovem. Engoli um palito escondido no meio de um bife à rolê. A dor no maxilar seguia. Abri a boca. Um estalo. Um som seco. Ainda tinha dois dentes de leite. Pequenos. Os outros estavam guardados. Tenho vergonha de dentes guardados. Não gostava de ir em dentistas. Achava tudo sádico. Mentira. Preguiça. Já cuspiu um dente. Era velho. Não doeu. O maxilar parou de mexer. Caneta e papel. Horas escrevendo e fumando. Fumando e escrevendo. Dor no punho. Era noite ou era tarde? Amava à noite. Notívago, segundo o dicionário. Quem lê dicionário se existe o Google? Descobri (no Google) que a realidade pode ser aumentada. Senti medo. Realidade não é ficção. Ficção é biografia do comum. Reli o que escrevi. Ver o que rever. Diálogos tortos à mão. Risquei os adjetivos e outros penduricalhos. O maxilar latejava. A mão foi até a boca. A boca não abria. Costurada. Acendeu um cigarro. Bateu na boca. A boca estava fechada. Guardou o que tinha. Lembrou do palito no estômago. Dormi pelo nariz.