AO DEUS VERDADEIRO...
Parte dois do texto:
Breve análise sobre conceituações teológicas
Por Antônio F. Bispo
À grosso modo, a visão ocidental de teologia parte do pressuposto do estudo de um “único e verdadeiro deus”, ou seja, o deus bíblico segundo a visão cristã.
Esse deus, antes de ser um deus Cristão, era uma divindade suméria que os judeus primitivos tomaram para si. Outros povos também fizeram o mesmo.
O modo romantizado com que cada conta sua própria história faz com que os crédulos da fé desse povo entendam que o seu deus seja o melhor e o maior entre todos eles. Quanto mais o tempo passa e esse povo cresce virando uma nação, mais essa crença (errônea) se torna sólida.
Praticamente toda fé (religiosa) se baseia numa mentira construída para elevar a moral de um povo ou amedrontar os inimigos em uma determinada época. Aquilo que antes era apenas uma fábula, com o passar do tempo se tornará uma VERDADE, imposta pelo estado ou pela maioria dominante se for o bastante para manter um povo unido.
Conquistar um povo nem sempre é uma tarefa fácil. Mais difícil ainda é manter unido um povo heterogêneo. O preço para manutenção da paz quase sempre é maior que os custos de uma guerra. Alguns tiranos só percebiam isso depois da conquista e a implantação de uma crença religiosa sempre servia de pano de fundo para apaziguar os ânimos dos povos conquistados.
Enquanto o conquistador se via (ou se vê) como herói ao implantar sua fé e costumes, o conquistado o verá sempre como um vilão e se tiver chance de contar sua própria versão dos fatos, terá como demônio, aquilo que o seu senhor chama de deus.
Com a fé cristã não diferente!
Mesmo tomando emprestado o deus de uma outra cultura, os pais fundadores do cristianismo remasterizou suas qualidades e poderes, e o apresentou na figura de jesus como sendo o ápice de toda deificação. Um deus trino, porém único e verdadeiro, criador de todas as coisas segundo esse modo de crer.
Esse tipo de “certeza” faz com que cristãos bem intencionados pensem estar fazendo o certo de modo correto e que todas as outras religiões do mundo estejam no engano. Por isso essa vontade (boba) de evangelizar o mundo, achando que todas as pessoas que não são de sua igreja irão para o inferno sem conhecer o “verdadeiro deus”.
Fica subentendo desse modo (para um cristão) que um teólogo lida de forma direta com aquilo que há de mais fino e puro no universo: o deus cristão e sua essência.
Apesar de ser um conceito infantil (deus verdadeiro), esse ainda é o termo mais usado pelos crédulos para definir o objeto de estudo desse campo de conhecimento (teologia).
Direta ou indiretamente os que aceitam esse conceito tratam com desdém todas as demais correntes teosóficas que não sejam as de sua bolha.
Dento do próprio cristianismo porém, há diversas vertentes de entendimento daquilo que dizem ser o deus verdadeiro (ou pelo menos o modo correto de servi-lo. Pensadores Cristãos se engalfinham por mais de 18 séculos seguidos e ainda não chegaram a um consenso sobre isso.
Além disso, várias denominações (igrejas e ministérios) surgem todos os dias e todas elas alegam fazer o certo de modo correto. Há uma versão de deus para cada um que se auto intitula (ou foi intitulado) ungido do senhor e a todos eles deus fala de modo particular, dando as mais variadas instruções para pedir dinheiro, abrir igrejas e tornar seu nome em um marca, uma franquia mundialmente lucrativa.
Um só deus (único e verdadeiro) que se permite dividir, confrontar e anular-se de igreja para igreja, de ministério para ministério, de cultura para cultura e aquilo que para uns é pecado extremo (comer carne de porco, curtir os sábados e beber álcool por exemplo), para outros, é uma dádiva de deus que pode e deve ser aproveitada.
Um deus que zela pela sua palavra para cumprir, mas que ao mesmo tempo permite que os seus servos definam o seu modo de ser, agir e salvar, e não o contrário.
Um teólogo (quando lhes permite) pode trazer luz a todo esse embaraço, evitar conflitos megalíticos e trazer harmonia aos ânimos exaltados dos que são capazes de travar qualquer tipo de guerra em nome de uma conceituação tão variável.
Hoje em dia segundo os “novos pensadores da fé” e os “you tubes apologetas”, até um erro de pronuncia do nome do criador poderá levar o homem ao inferno, mesmo tendo este crido em tudo o que dizem ser santo ou mesmo tendo vivido toda uma vida justa e honesta diante dos homens.
O deus que desde sempre sabia o que havíamos de dizer mesmo antes de pensarmos, agora está penalizando os homens por um erro de fonética.
Melhor ter cuidado! Em outra época ele autorizou que anjos fossem ao acampamento do "povo escolhido" para assassinar Moisés, só por que este tinha esquecido (ou não sabia ser necessário) cortar a pele do próprio pênis.
Depois de ter realizado feitos grandiosos para o criador, ele seria morto à mando do próprio deus por uma “gangue de anjos” irados depois de um pequeno vacilo... Com deus não se brinca!
Pois bem, é em momentos como esses (em que o número de baboseiras em nome de deus é dito ou feito) que um teólogo pode entrar para trazer um pouco de luz e evitar que uma nova escuridão cubra a terra. A escuridão da fé é a pior de todas, principalmente quando alguém importante afirma estar ouvindo vozes direta do próprio deus dando-lhes ordens direta.
Em vários momentos da história isso já ocorreu foi justamente um teólogo (Martinho Lutero) o principal responsável pela quebra parcial do poder da igreja, fazendo com que saíssemos da idade das trevas (idade média) para a idade moderna.
Ao escrever e publicar na porta da igreja suas 95 teses sobre o que seria (ou poderia ser) a vontade do divino e o papel do homem, um novo marco na história da humanidade foi posto e à partir desse ponto, várias outras revoluções foram possíveis possibilitando os avanços científicos e tecnológicos que hora dispomos.
Um teólogo não é e nem precisa ser um guardião da fé (de deus, igreja ou povo algum).
Se o fizer é por livre e espontânea vontade ou pressão (dos familiares, da igreja ou do grupo que o amará por conveniência, até o dia em que este zelar pela “sã doutrina”).
O fanatismo religioso não é uma a um obrigatoriedade a um teólogo. Espera-se acima de tudo, que este seja um pensador não e um sacerdote ou um apologista qualquer.
Para ser um apologista, basta defender (pela fé) um conceito mesmo contra as evidencias. Não se faz necessário nenhum tipo de escolaridade para assumir esse perfil. Nas redes sociais esse tipo tem surgido todos os dias.
Mas isso não é o papel específico de um teólogo. Este não se torna um crente por estudar como os crédulos pensam e se comportam.
Um perito policial por exemplo, estuda a mente criminosa. Nem por isso ele se torna ou deve se tornar um criminoso. Ele apenas aprende o modus operandi dos psicopatas para auxiliar toda uma sociedade a se defender destes, ou a solucionar crimes quando esses ocorrem.
O mesmo pode ser dizer de um teólogo. Ele não estuda deus pois, deus não se estuda (já o disse em outro texto). Ele estuda aquilo que as pessoas pensam e tem pensado sobre deus ao longo dos séculos e o que fazem baseado nessas crendices.
Por outro lado, um biólogo estuda a vida. A vida em geral gesde um ser microscópio até o maior de todos os seres vivo que habita neste planeta (e além dele se for descoberto).
Ele não precisa se tornar uma ameba ou uma Baleia Jubarte depois do curso para provar que fez biologia. Ele não criou a vida e nem a detém, mas será capaz de nela interferir por conhecer a estrutura básica de como os organismos se comportam sob determinada influencia.
É imprescindível nesses termos conhecer do ser estudado o seu habitat, suas fontes de alimento e seus principais predadores para entender o estado evolutivo desse ser e de outros que o cercam. Na biologia, tudo está relacionado. A vida é uma simbiose, e um organismo sempre depende de outro.
Chegar a uma conclusão desse tipo só é possível por meio de uma análise. Não é um dom, é um percurso que tem início, meio e fim e tem um método de observação. O nome disso é estudo.
Estudar é conferir, averiguar e comparar comportamentos de um corpo ou matéria para se chegar a uma determinada conclusão. Por método estabelecido, outros estudantes ou pesquisadores poderão dar continuidade ao estudos, corrigindo-os, rejeitando-os ou expandindo-os se preciso for.
É por meio da publicação desses estudos que uma pessoa leiga terá acesso ao mundo acadêmico e poderá de forma rápida deliciar-se (ou tortura-se) com o assunto, sendo que algumas pesquisam levam anos ou décadas de estudos e investimentos para ficarem prontas. O leitor porém, terá acesso a tal conteúdo de forma gratuita ou por um preço muito barato, caso fosse ele mesmo se lançar em tal façanha. Isso serve para vários campos da ciência (e para quase tudo na vida que envolva o processo cientifico).
Desse modo, ao estudar deus, um teólogo não se tornará um deus ou parte dele, e nem precisará precisa ser um crédulo para defendê-lo quando atacado.
Deus “é adulto o suficiente” para defender-se sozinho caso queira. Se ele não o faz é por que não quer ou não pode.
Pessoas diferentes esperam coisas distintas de um teólogo: a igreja deseja que este a defenda e torne ainda mais solida a existência de deus por meio da academia (mas isso é impossível!), enquanto que os leigos acreditam que um ele por “ter passado tanto tempo perto de deus” estudando-o, tenha adquirido poderes místicos e se tornou capaz de ler até o pensamento dos mortais ou prever o futuro destes (assim como deus).
Ainda há os “super leigos”, que atribuem aos teólogos todos os sintomas de uma mente abobalhada, inútil e servil, pré-julgando que todos os que andam com abobalhado, também se torna um. Abobalhados há todos os lugares e nem por isso as pessoas deixam viver ou existir por conta destes.
Do mesmo modo que um biólogo não ser torna uma barata por estudar uma, o que estuda deus não se tornará uma divindade!
Será apenas uma pessoa que estudou (e ainda estuda) o comportamento dos homens quanto as confabulações sobre as divindades.
Ele não terá de forma automática um poder sobre os homens só por esse fato. Se algum poder esse vier a ter, que seja pelo seu intelecto ou por mérito e nunca pela coação psicológica dos ignorantes.
Qualquer um que brandindo uma bíblia (pela simples crença) se declarar superior a quem quer seja ou com direito exclusivo de ser um guia (cego) da vida alheia, não passa de um charlatão.
O conhecimento liberta e faz crescer não apenas ao estudante, mas uma toda sociedade. Uma geração inteira poderá ser arrastada para um novo estado evolutivo mediante conhecimento proveitoso.
A ignorância oprime, e a soberba faz com que o opressor sinta-se um ser iluminado, lutando por uma causa justa.
Como dito no texto anterior, estudar deus é estudar a mente e as ações humanas que permeiam em torno desse conceito.
É notável que nos tempos modernos, a presença obrigatória de sacerdotes e outros interlocutores do sagrado para manutenção da lei, da ordem e da moral está aos poucos está se dissipando.
Percebeu-se com o tempo que “a lei dos homens” quando aplicada com rigor e justiça, tem milhares de vezes mais serventia que qualquer “lei divina”.
Percebeu-se também que a maior parte do caos social provém justamente da necessidade da implantação e manutenção das supostas leis dos deuses.
Fanáticos de todos os tipos e de todos os lugares do mundo quando se juntam para falar sobre o quanto são escolhidos e protegidos do pai, se ofendem mutuamente, sentem-se ultrajados pois, esperam serem louvados e não combatidos e desse modo, uma pequena discussão local pode arrastar parte do globo para uma guerra de grandes proporções.
Só os tolos brigam pela defesa dos poderes virtuais de seus deuses e pela necessidade de inculcar nos outros esses ideais. Poderes esses que nunca foram vistos ou comprovados por quem quer que seja.
A ameaça velada é uma constante nesse meio e até em suas orações eles pedem a morte dos que pensam diferente deles.
O maior problema é que nesse meio, a loucura é uma virtude e a tolice é uma meta a ser alcançada.
O não provocar a fé alheia é sinônimo de compactuar com o “mal do mundo” e de fazer aliança com o mundo.
Eles precisam manter-se em guerra constante para provarem que estão no caminho certo. Quando a guerra não é interna, é entre os membros da mesma fé e quando não, com o resto do mundo.
“Se o mundo não vos persegue é por que o mundo está dentro de ti...”
Essa frase apesar de simples, é carregada de um significado obscuro que pode incitar a ira dos homens e comprometer a paz mundial.
CONTINUA...
Texto escrito em 11/7/21
*Antônio F. Bispo é graduando em jornalismo, Bacharel em Teologia, estudante de religiões e filosofia.