Acontecimento Araceli Cabrera Sanchez Crespo

Se estivesse viva, hoje, dois de julho, eu estaria completando 57 anos. Minha história gira em torno do meu assassinato ocorrido em 18 de maio de 1973 no Espírito Santo, senão vocês não me conheceriam. Eu tinha 8 anos quando fui raptada, drogada, estuprada, morta e carbonizada em Vitória.

Eu tinha um problema muito grave de bronquite quando nasci. Um médico aconselhou meu pai a mudar para um lugar de clima melhor, sem poluição. Aí na época ele arrumou emprego no Porto de Tubarão. Meu irmão Carlos tinha cinco anos e eu nem andava ainda.

Ao chegar ao Espírito Santo, minha família foi morar no bairro Jaburuna, em Vila Velha. Por ter muito cuidado comigo, nossos pais sempre se preocupavam em me matricular na mesma escola que Carlos.

Estudávamos no colégio Marista, mas meu pai tinha uma casa no bairro de Fátima e depois de um tempo resolveu mudar pra lá porque ficava mais perto do trabalho dele, no Porto. A mudança para o bairro de Fátima, na Serra, aconteceu meses antes do meu desaparecimento, no final do ano de 1972.

Carlos foi estudar no colégio Salesiano em Vitória só que eu não podia estudar lá junto com ele, porque na época não aceitavam meninas. Por isso eu fui para a escola São Pedro, que tinha uma vizinha que estudava lá.

Eu fui uma menina doce e inocente, cercada de muito cuidado em casa e meu irmão mais velho tinha muito carinho comigo e apesar de sermos menina e menino convivíamos muito bem. Meu pai era muito dengoso comigo, por ser menina e a caçula, ele tinha muito cuidado comigo.

Após sair da escola, fui vista brincando com um gatinho por um adolescente em um bar entre o cruzamento das avenidas Ferreira Coelho e César Hilal, em Vitória.

Depois disso, não fui mais vista. À noite, meu pai Gabriel Sanchez Crespo (que faleceu em 2001), iniciou as buscas. Meu pai foi fazer o percurso achando que talvez eu tivesse vindo a pé. Foi meu pai e minha mãe até a escola, não conseguiram encontrar nada. Meu pai deu parte à polícia, foi aquela procura toda. E nunca mais ninguém me viu.

Lola, minha mãe, está morando na Bolívia, está muito doente, ela está com princípio de Alzheimer, meu irmão Carlos mora no Canadá.

Bom, só posso concluir que minha história tem servido para combater a violência. Não quero que chorem. Eu tive um sonho lindo, resolvi contar! Sonhei que nossa família estava no alto de uma montanha, olhando uma manada de elefantes caminharem. Vinha uma brisa leve que batia em meu rosto. Eu estava com medo, mas senti um toque doce, que olhou em meus olhos e disse: está tudo bem. Deitei um gramado verdinho e adormeci com o carinho de um anjo no meu rosto.

Não importa quem são os culpados, porque a culpa é marcada no interior de cada consciência. Colhemos o que plantamos. Lei de causa e efeito. Eu estou em paz.

LucianaFranKlin
Enviado por LucianaFranKlin em 02/07/2021
Reeditado em 08/07/2021
Código do texto: T7291414
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