DE QUE LADO ABRE A PORTA DO PARAÍSO?
Essa é uma interessante pergunta a se fazer, citada pelo Pé. Lancelotti em uma live em que ele participava. A porta em questão era a porta do metrô que dava para o Paraíso, um bairro ou uma comunidade, não um local supra-humano, ou espiritual.
Mas em se tratando de quem perguntava e a quem foi feita a pergunta e, principalmente, do momento em que vivemos não dá para ignorar o potencial reflexivo da questão.
Tratava-se, por um lado, de uma mulher humilde simples que viajava também no metrô e necessitava da informação; do outro, um homem religioso que gastou a vida inteira na luta pelos menos favorecidos, que participou de embates e sofreu perseguições, que lutou do lado de pessoas menos favorecidas, de desvalidos e desamparadas, cujo cristianismo se faz concreto na luta em favor do outro, do social.
Analisando e ampliando essa questão, indago: De que lado abre a porta do paraíso? Onde é o paraíso que se abre? E para quem ele é aberto todos os dias?
Refletindo sobre a fala de Pe. Lancelotti, Deus não é um Deus distante, imparcial, injusto que não se importa com a dor e o sofrimento humano. Antes, é um Deus do cotidiano, é um Deus que sofre com a dor humana, que deu seu sangue pela prostituta, pelo ladrão, pelo doente, pelos órfãos, pelos pobres, pelos pecadores, pelos que creem e até pelos que não creem.
Então, trazendo para o nosso cotidiano, esse Deus vivo nascido de mulher, saído da Cruz, que nos enxerga através de olhos humanizados, é o Deus do índio que sequer tem o direito de ser o dono da própria terra, Brasil; esse Deus é o Deus dos negros que, apesar da abolição, ainda são ideologicamente mantidos escravos em um jogo de poder elitista, racista e discriminatório; esse Deus é Deus daqueles que precisam do SUS, de auxílio emergencial, que engrossam as filas em busca do mínimo, de emprego, de condições sobrevivência, de vida digna; esse Deus é Deus dos LGBTs, das crianças, dos jovens e mulheres negros que morrem nas chacinas entre polícia e bandidos nas periferias, nas favelas, das crianças prostituídas, pedofiladas, abandonadas, dos desfavorecidos.
E o paraíso não é um lugar distante, não é um lugar intangível que se abre somente pelas mãos poderosas de um Deus todo poderoso (antes, todo misericordioso) que não sente. O paraíso é aqui e agora, e não se abre pelo lado de dentro, mas pelo lado de fora. E cada vez que se nega pão a quem tem fome, abrigo e esperança a quem não tem teto, um abraço a quem não tem afeto, proteção a quem não tem segurança, justiça a quem não tem direitos, tec., tranca-se a porta um pouco mais.
A porta do paraíso, desse paraíso espiritual, se abre no cotidiano de amor, de misericórdia, de perdão, de justiça social, de luta pelo bem comum. Se não formos capazes de nos colocar no lugar do outro (independente de quem seja esse outro, morador de rua, índio, quilombola, negro, idoso, mulher, LGBs, ateus, etc.).
Se não formos capazes de sentir a dor do outro, de vivenciar e de lutar pela cura do outro, pela liberdade do outro, pelos direitos do outro, nossas mãos estarão sempre trêmulas e incapaz mover a chave que abre a porta desse paraíso.
E quando o metrô de nossas vidas chegar na estação Paraíso, se não tivermos munidos das condições de abrir a porta e desembarcar nela, continuaremos o percurso pelo inferno da vida, porque a cada um é dado o direito de plantar e cada um planta o que quer mas, também colher justamente aquilo que plantou, apesar das intempéries do tempo, das pragas do mundo e das ervas daninhas...
By Nina Costa, in 10/02/2021. Mimoso do Sul, Espírito Santo, Brasil.