OS MODERNOS RITUAIS ANTROPOFÁGICOS!
Comeremos e beberemos infinitamente do vosso corpo e do vosso sangue”!
*Por Antônio F. Bispo
Sentados à mesa do escritório, da cozinha ou de um barzinho qualquer em uma roda de amigos, eles digerem as partes dilaceradas de seus oponentes, daqueles que foram selecionados e servidos como prato do dia.
Todo dia tem “carne nova na mesa”, ou o mesmo prato poderá ser comido diversas vezes infinitamente até que uma “carne mais saborosa” seja servida.
Hoje o “corpo” devorado poderá ser de algum BBB, amanha de algum jornalista, depois de um militante petista, de um bolsonarista, de alguém que saiu às ruas sem máscara ou de qualquer pessoa comum que cometeu algo que a lacrosfera considera indecente.
Nessa moderna antropofagia virtual, não há abate e nem um rito oficial de imolação como nas antigas tribos tupinambás e tupiniquins. Em certos casos não há luta, não há resistência e o inimigo só fica sabendo que está sendo comido, horas depois que a mídia começou a distribuir as suas vísceras aos abutres que fazem de uma luta inglória, um estandarte de vitória.
Esse tipo de comilança é feito com o “inimigo” ainda vivo, que contempla seus próprios membros sendo dilacerados sendo consumido por almas vazias, que saciam suas fomes com informações (virtuais) igualmente desprovidas de “nutrientes”, e deste modo vivem todo à procura de uma nova vítima para abater.
O que come contigo à mesa a carne de outrem, amanhã poderá está comendo também a sua, caso você mude de opinião ou cometa algo que a bolha considere deslize.
Essa horda de canibais não têm um rumo, um marco ou um único líder específico para os guiar. Qualquer um que tenha alcançado os trends topics da noite anterior poderá ser o novo líder hoje, decidindo assim quem deverá ser a presa do dia e como ela será dissecada e comida.
As modernas plataformas virtuais têm funcionado como uma imensa bandeja de prata para servir os pedaços dilacerados de todos os que já foram cancelados, eliminados ou falaram alguma coisa contra uma figura em evidencia ou rejeitou emprestar suas falas, imagens e personalidades para servirem de bancada de “açougueiros” que se especializaram do abate da honra, da moral, e da personalidade alheia, que não sabem distinguir a diferença entre atacar (contra argumentar) uma ideia de atacar pessoas.
Pessoas que se acham grandes quando diminuem o outro, e que aprenderam como fazer fortunas no mundo virtual, abatendo e servido pessoas para consumidores cujo vazio cerebral chega ser maior que o estomacal.
“Lula livre”; “Mito”; “Ele não”; “Salvem as girafas da Amazônia”....
Não importa a rast tag que você escolheu, se você conseguir muitas visualizações em suas postagens, “a tribo que come gente” vai te procurar e vai tentar comer a sua carne (se você na ocasião não estiver do lado do chefe deles).
Lembrando sempre que há mais de uma tribo: a da direita, a da esquerda, a do centro, da terraplana, dos passadores de pano, dos que enxergam chifre em cabeça de cavalo, dos conspiracionistas... é uma verdadeira zona de guerra, como nos velhos tempos, todos defendendo ou tentando conquistar territórios, cópulas diversas e honrarias que valem tanto quanto esterco de gato. Todos dizendo defender a democracia, os bons costumes, a ciência e tudo o que diz respeito as coisas do bem, segundo os próprios conceitos de certo e errado que eles mesmos forjaram. Há textos e falas prontas para todas as ocasiões. Os membros de tais grupos devem repeti-las sempre, pois se emitirem opiniões próprias, fora do script, ainda que em defesa do grupo, será visto como traidor e desta feita será o prato servido do próximo dia.
Alguns deles perceberam que no mundo moderno, “comer gente” traz fama, fortuna e que estar “em cima da carne seca” é o único meio para não ser esquecido pelos que patrocinam esses banquetes bizarros, sejam estes patrocinadores empresas pagantes ou sejam anônimos assinantes. Então eles pensam: “ou eu como ou sou comido” e passam a fazer da própria vida (e de outros) um inferno, um campo minado, em que uma palavra apenas dita fora do contexto o levará a ruina.
Diante dessa percepção, para não caírem em descaso, alguns desses “chefes tribais” que conduzem esses rituais antropofágicos, criam tretas entre eles mesmos ou com pessoas diversas para angariar inscritos, para ocultar um ato falho ou para esconder uma hipocrisia recém revelada do tipo “fique em casa que eu vou pra festa comemorar”!
Para estarem em evidencia são capazes de simular traições conjugais, assaltos, perrengues com os pais, ou podem até expor aquela antiga coleguinha de profissão que tomou um vestido empresado, não devolveu e ainda foi à mesma festa que ela, toda provocante e bonitinha roubando os holofotes com um “vestido emprestado”.
Caçadores comuns aprimoram suas técnicas ao perceber que as presas não caem mais nas mesmas armadilhas. Estes, como caçadores de likes e de holofotes precisam fazer o mesmo, não apenas atraindo a presa como aprendem como repelir outros “predadores de likes”.
No passado, as antigas tribos que comiam carne humana, acreditavam que ao fazê-lo, incorporava em si, todas as qualidades do que fora comido: sua força, bravura, beleza, capacidade de liderança e contato direto com os deuses venerados por estes.
Os que hoje “devoram” seus inimigos nas plataformas virtuais indiretamente pensam do mesmo modo, pois perceberam que ao atacar figuras célebres, conseguem uma enxurrada de visualizações e patrocínios em cima da exposição alheiam. Alguns até surrupiam os inscritos e os “poderes” que a estes pertenciam por meio dessa técnica, enfraquecendo-o pelo combate desleal. Os que se omitem desses ataques baratos e apoiam a censura contra um desafeto concorrente, amanha poderá ser o próximo censurado, chorando aos cantos pela desmonetização de suas obras e clamando por justiça...
Uma mãozinha com polegar apontado para cima. Um pequeno coração avermelhado ou pequenas carinhas que expressam emoções diversas: essas não são partes “arrancadas” dos inimigos, antes sim dos apoiadores como sinal de aprovação. Eles podem deixar “partes de seus corpos” simbolizando apoio ou refuta nesses tipos de banquetes.
Após o “consumo do cadáver”, a soma desses ícones mostrados no rodapé da “bandeja” será um dos fatores cruciais para o anfitrião. Isso determinará se a mesma pessoa será consumida outra vez, ou se uma nova imolação será feita usando uma outra pessoa como prato principal.
Ensandecidos, os que participam de tais banquetes dizem: “estamos tornando o mundo um lugar melhor, comendo a carne desse imprestável, desse comunista, desse direitista, desse miserável, desse lixo humano” ... e seguem sem saber que no outro dia poderão ser eles mesmos, o próximo prato, servido com muito ódio, paranoia, notícias falsas ou teorias conspiratórias.
Até grandes veículos de comunicação até então considerados falidos e suplantados por essas sociais, percebendo esse novo nicho de mercado, essa nova forma de consumo, estão acrescentando em suas pautas de realities shows, justamente aquilo que o público deseja consumir: estereótipos já consagrados, que gerem, polémicas e audiência e que acima de tudo desviem a atenção do povo no momento em que decisões importantes do país precisam ser tomadas. Enquanto o povo estiver se estapeando, defendendo coisas fúteis, projetos nefastos poderão transitar sem nenhuma barreira.
Nesses realities, o roteiro, as falas, os cortes de cenas e as atuações dos envolvidos correspondem justamente ao desejo de consumo daquele tipo de público, é isto que eles dão: várias cabeças em salvas de pratas para o deleite macabro, dos que pensam que apontando os defeitos dos outros estão escondendo os próprios.
Nesses casos, o banquete da ignorância deve continuar e as atuações devem seguir o roteiro pré definido, até por que há atores profissionais envolvidos. Entre os consumidores desse tipo de produto, há quem acredite que tudo aquilo ali é real e natural, sem nenhuma estratégia para obter picos de audiência. A crença é livre, a decepção posterior também!
Se nesse show montado, o prato do dia será um “branco hétero e privilegiado que tem vergonha de ser homem” ou se vai ser uma “Pessoas com P”, isso não importa! Nesse tipo de banquete, os que se deixam devorar poderão inclusive ter do lucro na venda de sua própria carne. Os que se deixam servir como boi de piranhas para desviar a atenção do povo para assuntos mais sérios, também!
Se vale tudo no amor e na guerra, vale tudo também quando a intenção é alienar, castrar e emburrecer as massas. O mais importante é fazer com que alguns grupos ou pessoas pensem que estão no poder por assistirem suas pautas sendo comentadas ou por estarem participando ativamente de lixamentos virtuais à nível nacional.
A ilusão de poder é dada a todos que não aprenderam como realmente conquistá-lo ou a todos que não sabem como segurá-lo por muito tempo. O sujeito pode ser a pior pessoa do mundo em todos os sentidos, mas se sentirá um ser de alma lavada ao fazer comentários de visualizações públicas, em grupo de lixamento “que fazem justiça com os próprios likes”!
Se por um lado, nesse mundo canibal, há os que estão sendo devorados sem nem se quer saber que eram o prato do dia, há os que se entregam-se ao inimigo de forma vergonhosa sem nem se quer terem lutado.
Quando estão no meio de “pessoas inteligentes”, “doutorandas em redes sociais”, mudam de opinião para agradar a maioria, rejeitando suas próprias crenças e valores, vestindo-se do mando da estupidez para não ser considerado cafona. Os tais, acham que ao ser digeridos por gente como essa, do produto dessa digestão sairá ouro puro e refinado. Mas esquecem que o produto comum da digestão é merda, seja ela fedida, seca ou em forma de diarreia...
Deixar-se digerir por esses tipos de “intelectuais canibais” pode não ser uma boa escolha. Se for pra cair, que caiam atirando pois das cinzas de um bom e puro ideal surgirá uma fênix da esperança.
Continuo defendo que falar sobre ideias é bem mais proveitoso que falar sobre pessoas e que há alimentos bem mais saudáveis nutritivos nesse mundo virtual que “comer carne humana”.
Comam livros, ensaios científicos, filosóficos ou artísticos. Comam teses e antíteses. Consumam os produtos sem envolver-se com os seus produtores, a ponto de idolatrá-los, de pensar que eles são infalíveis e donos da razão em tudo! Você vai acabar se decepcionando se assim o fizer pois ninguém é perfeito ainda que intente ser e com essa decepção tu poderás descartar uma obra proveitosa ao invés de descarta apenas o autor.
Idolatrar e demonizar pessoas também é algo indigesto, deixa as pessoas abobalhadas ou enfezadas (cheias de fezes).
O acesso total e irrestrito a todo tipo de informação e tecnologia a todos as pessoas não é um símbolo de liberdade e democracia. A maioria delas não sabem usar as informações disponíveis, muito menos a própria liberdade que possuem e confundem liberdade com libertinagem. Mas vale um punhado de informação bem aplicada que o universo inteiro delas sem nenhuma aplicação útil.
Pensem Sobre Isso! Revejam Seus Conceitos! Saúde e Sanidade a Todos!
Texto escrito em 7/2/21.
*Antônio F. Bispo é graduando em jornalismo, Bacharel em Teologia, estudante de religiões e filosofia.