O julgamento das bruxas de Bamberg
“Como explicar o mal que o ser humano –às vezes por puro prazer – é capaz de fazer aos outros seres humanos?”
Atenéia Rocha França de Araújo
“Se existir um Deus, Ele terá de implorar o meu perdão.”
Frase escrita nas paredes de um campo de concentração
Entre os muitos casos de julgamentos e execuções de bruxas ocorridos na Europa, precisamos falar sobre os ocorridos em Bamberg, cidade do sul da Alemanha, que consta entre os casos de maior escala de julgamentos e execuções ocorridos durante a Guerra dos Trinta Anos: um embate entre Católicos e Protestantes que gerou mais de oito milhões de mortos, um número superior, em proporção, às vítimas causadas pela Primeira e Segunda Guerra mundial, juntas. Vale também acrescentar que os julgamentos de bruxas que aconteceram em Bamberg constam entre os quatro maiores na Alemanha, junto com as cidades de Trier, Fulda e Würzburg. Sabe-se que, entre o fim do século XVI e o início do XVII, o Sacro Império Romano-Germânico foi atacado por uma geada, chamada de Pequena Era Glacial, que causou quedas bruscas na temperatura, levando a prejuízos nas colheitas.
Isso levou os camponeses a buscar culpados e acreditar que os culpados seriam bruxos, que teriam feito pacto com o diabo. Assim, o Bispo de Bamberg, Neytard von Thüngen (d. 1598) foi o primeiro a permitir o julgamento de bruxas, mas a sua maior preocupação era combater a Reforma Protestante e, durante a gestão do seu sucessor, Johann Philipp von Gebrattel (d. 1609), ninguém foi executado. Foi na gestão de Johann Gottfried von Aschhausen (d. 1622), que os julgamentos começaram. Apoiando-se no teólogo Friedrich Förmer, o bispo permitiu os julgamentos, tendo havido quinze execuções no período de um ano. No período de 1622, registrou-se um total de 159 julgamentos, tendo a maioria resultado em execuções.
O período mais intenso de caça às bruxas ocorreu em 1629, sob a gestão do bispo Johann George Fuchs von Dornheim e, como uma geada estava danificando as colheitas e florestas, para se preservar a madeira, construiu-se um crematório em Zeil am Main, o centro das execuções. Em Bamberg, constriu-se uma prisão especial para os suspeitos: a prisão de Malefizhous, também chamada Drudenhous na qual havia uma câmara de tortura insonorizada com centenas de Bíblias..
Entre os mortos, vale citar Georg Haan, médico, membro do Conselho da cidade de Bamberg e cidadão respeitado, que fazia oposição aberta à caça às bruxas. Sua esposa, Katharina Haan, foi presa e torturada até confessar-se culpada pelo crime de bruxaria. Logo depois, uma das filhas do casal também foi presa, torturada e queimada durante um período em que Georg estava ausente de Bamberg. No ano seguinte, outra filha e um filho de George também foram presos, torturados e executados. Não demorou a que Georg Haan fosse também preso, acusado de bruxaria, sendo posteriormente executado em 24 de janeiro. Seus três filhos escaparam da morte porque conseguiram proteção da Abadia Dominicana de Heilig Grab.
Constam quase duzentos julgamentos de 1628 e a população começou a deixar de apoiar a caça ao ver que qualquer um podia ser considerado suspeito, ser levado a julgamento e morto na fogueira. Dorothea Flock, membro de uma bem-sucedida família de mercadores de Nuremberg e segunda esposa de Georg Heinrich Flock, foi detida em Dezembro de 1629. Seu esposo tentou de tudo para conseguir sua libertação. A acusação de sua esposa se baseou em uma denúncia anônima e seu marido foi até Nuremberg em busca de auxílio para libertar sua esposa grávida. Com a ajuda de um notário público protestante e da família de sua esposa, que era muito respeitada, ele chegou a conseguir que um édito Imperial fosse feito pelo Hofrat, mas os caçadores de bruxas, cientes da entrega iminente do documento, executaram Dorothea meia hora antes que o mesmo fosse lançado.
A execução de Dorothea levou a desentendimentos entre os líderes da Igreja Católica Alemã e o Hofrat proibiu outros julgamentos. A caça às bruxas só acabou quando tropas suecas protestantes se aproximaram de Bamberg, em 1632. O bispo considerado responsável pela execução de Dorothea Flock fugiu para a Aústria. Drudenhaus, a prisão construída em 1627, foi fechada em 1632.
Entretanto, outros julgamentos foram feitos até 1680 e isso resultou num total de cerca de mil mortes.
Referências
https://en.wikipedia.org/wiki/Dorothea_Flock
https://en.wikipedia.org/wiki/Bamberg_witch_trials
https://en.wikipedia.org/wiki/Georg_Haan