EM BUSCA DO FABULOSO SORVETE CHUCHU

“Tudo vale a pena se oferta não for pequena!”

*Por Antônio F. Bispo

Pela lógica convencional cristã (me refiro aos que são cristãos por conveniência), quem concordam que deus existe, é por natureza uma pessoa boa, uma pessoa de deus, que deus o tem e ele tem a deus. Estes tipos de crédulos por força do hábito afirmam que deus é o seu pai, o seu guarda, o seu guia e o seu salvador. O simples fato de concordarem que há um deus morando em algum lugar nos céus os tornam filhos de deus. Se nem sequer sabem rezar um pai nosso, se nunca pisaram os pés em uma igreja qualquer, se vivem uma vida devassa ou se nunca leram um versículo bíblico, isso não importa! Basta afirmar que deus existe e isso é suficiente! Podem até criticar e perseguir “pessoas sem deus”, que tenham a cabeça no lugar e os pés nos chãos.

Pela lógica puritana cristã, fazer apenas uma confissão pública verbal acerca da existência de deus não basta! O indivíduo que diz ter fé, ter deus ou ser de deus, precisa expressar isso por práticas ritualísticas diversas ou esfregando na cara dos outros seus usos e costumes que na maioria das vezes para nada servem, nem para o próprio usuário nem para ninguém. A virtude, a honestidade, a civilidade, o respeito a todos...isso nem sempre importa! O não comer, não beber e não vestir isso ou aquilo de acordo com o “menu de santidade local” de cada igreja é quem torna o homem digno do apreço ou da ira de deus. É indispensável nesses casos estar sujeito a um pastor, pagar os dízimos e ofertas, ser frequente aos cultos, ser batizados e estar em comunhão com a igreja. Esse é o único meio de ser de deus, de ter a deus, e de deus os ver como objeto de seu cuidado. De outro modo é perca de tempo! Até por que, segundo estes, quem assim não o fizer será considerado ímpio e filho das trevas pelo próprio deus, e ele com sua ira descomunal castigará os tais no hoje para todo sempre.

Já pela lógica pentecostal cristã, além de ser ou fazer tudo o que diz a lógica puritana, o fiel precisa “ser cheio do espírito santo”, ou seja, falar em “línguas estranhas”, “rodar no poder”, “profetizar”, “ter dons de visão ou revelação”, ter coragem para “peitar o capeta” afrontando religiões de afrodescendentes, fazer vigílias e orações em montes, combater LGBTs e afins, além de estar pronto para em período eleitoral dar o voto em quem o seu líder religioso ordenar. Se não for assim, deus nem passa parto destes.

Entre esses existe a vertente pentecostal da teologia da prosperidade. Essa linha concorda (ou induz o fiel a crer) que, quem é cheio do espírito santo se torna mão aberta, dá tudo o que tem “para deus”, participa de todos os tipos de campanhas financeiras e compra todos os tipos de bugigangas ungidas que o seu líder lançar. Nem precisa os outros “dons do espírito”. Se tiver dinheiro e for corajoso (trouxa) o bastante para “dar tudo ao senhor”, a trindade inteira e toda miríade celestial habitará nesse crente. De onde esse dinheiro virá, para igreja pouco importa. Se virá do tráfico, da propina, se de lavagem de dinheiro, se trabalhando honestamente ou se o crente vai usar a “esperteza de Jacó” para conseguir dinheiro, isso tanto faz! Se doar parte (ou tudo) pra igreja, o espirito sando descerá rapidinho no contribuinte e este será considerado tão cheio quanto o é que tem os outros 9 dons...

Fora essas linhas, há os adeptos do sincretismo religioso moderno. Pela lógica destes, uma pessoa só prova que tem o “carimbo de deus” na vida, se além de ter as características da lógica pentecostal acima citada, acrescentar aos seus rituais de cultos e devoções diárias, simbologias e ritos judaicos e (ou) do candomblé. Para estes, além do crente ser todo “equipado”, possuindo “todos os dons do espírito”, é preciso também ter certos amuletos, ou símbolos judaicos como o menorá, a estrela de Davi, o shofar, a barba de Arão, etc. É preciso também aprender a pronunciar alguns nomes em hebraico pois o deus que tudo pode e tudo entende, não responderá se algum de seus nomes for pronunciado de forma errada.

Se a plateia for leiga o bastante para não se adaptar esses ritos complexos, basta vestir-se de um roupão branco (ou de outra cor), rodar bastante, balbuciar palavras ininteligíveis, se contorcer, revirar os olhos e dizer que “deus está baixando na igreja”. Mesmo quando eles fazem tudo o que condenam nos ritos africanos, a igreja não percebe e ainda bate palmas. Esse tipo de público gosta de folia e dificilmente um adepto do meio dirá que isso não é o mover de deus, antes sim atestarão o próprio deus em pessoa baixou naquele lugar ou pessoa.

Sempre funciona! Podem também misturar os dois juntos (judaísmo com candomblé) que o culto fica melhor ainda. Esse tipo de crente costuma se tornar um inquisidor de tudo e de todos devido a tanto “poder e comunhão” que adquirem com deus. Nem eles mesmo sabem quando é deus quem os usam ou quando são eles quem estão usando a deus...Ter deus ou ser de deus nesses casos está fora de questão...eles são a representação do deus vivo habitando entre os homens, exterminando o pecado e trazendo pureza e santidade por onde andam (é o que eles dizem).

Ainda há nesse perfil de ritos sincréticos, há os que adicionam símbolos do hinduísmo, do xamanismo, dos hare Krishnas e tudo mais que a criatividade (ou a internet) mostrar. Basta dizer sempre que é deus agindo e pouco importa se o rito antagoniza a própria crença cristã. Afinal, se deus usou uma jumenta, se falou com moisés no meio de uma moita flamejante e se engravidou uma virgem por meio de uma pomba, quem garante que ele também não se manifeste no meio de uma balbúrdia sem limites? Seus métodos teofânicos são sempre um mistério, não é mesmo?

Que o cristianismo é o resultado de vários sincretismos, isso não é novidade alguma, porém, nas duas ultimas décadas com o advento da internet e a globalização, diversos ritos de outros cultos têm sido introduzidos de forma aberta para que os fiéis permaneçam frequentando o templo, já que a concorrência aumentou e todos os dias uma nova igreja é aberta em cada esquina. Quem não inova perde público! Essa é a questão...

Por mais de 1 mil anos a igreja católica praticamente reinou sozinha entendendo a ideia de deus como bem queria. Depois teve que “dividir o bolo” com umas 15 ramificações do protestantismo por quase 400 anos depois da revolta protestante. Nos últimos 100 anos com os surgimentos dos evangélicos, essas ramificações chegam aos milhares...todo mundo querendo uma fatia desse mercado bilionário que é a “obra de deus”. Quem não inventa, aumenta ou acrescenta fica “sem moral” e de igreja vazia.

Um poeta brasileiro disse uma vez: “tudo vale a pena se a alma não é pequena”!

No caso dessas igrejas que inovam todos os dias para atrair ou manter fiéis a frase que melhor se encaixa é “tudo vale à pena se a oferta não for pequena”!

Em outros casos a frase: “se cobrir vira um circo, se fechar vira um hospício” se encaixa como uma luva nesses modelos de igreja, pois agressões verbais e outros tipos de intimidações em público são feitas o tempo inteiro com o intuito de converter o ouvinte a entrar no clima. Inclusive em alguns casos, atores são contratados para simular possessões demoníacas, vícios, testemunhos cabulosos, curas e outras coisas que leve o público a fazer doações generosas ou a permanecer na igreja.

A grande verdade é que em todos os tipos de mercado só existe a oferta se existe a procura. Nas igrejas, o líder religioso ofertará justamente aquilo que o fiel procura encontrar. O oposto disso também é verdadeiro: o fiel “comerá” somente aquilo que o seu líder religioso servir.

A analogia que fiz acima referente ao SOVERTE DE CHUCHU pode ilustrar perfeitamente esse universo religioso.

O chuchu (como a maioria é sabedora) não tem um gosto próprio e você pode dar a ele o sabor que quiser, colocando-o junto a outros alimentos que liberem sabor para que o gosto do alimento seja absorvido pelo chuchu. Até mesmo a cereja que alguns compram pensando ser a fruta original (por exemplo), na verdade é chuchu em conserva em calda de cereja

Com a fé cristã é do mesmo jeito: cada líder religioso deixa “o chuchu” ao gosto do cliente ou ao gosto de hierarquia da igreja. O cliente pensa estar comprando um produto (a fé) de excelente qualidade por estar frequentando “a igreja certa”, quando na verdade está sendo parte de uma igreja qualquer, venerando a mesma ideia de deus sob roupagens diferentes.

Outro fato é que o SORVETE, tem como característica principal a necessidade de ser consumido com rapidez, caso contrário ele derrete, suja quem o segura, ou perde toda sua beleza, sabor e textura. Se não for consumido logo, esse deverá retornar ao freezer imediatamente com a temperatura adequada para que não se estrague.

A fé em deus, segundo os ditames cristão, deve ser consumida rápida, sem questionamentos e sem muita pesquisas, pois se o fiel investigar a fundo a origem de seu grupo religioso ou do próprio cristianismo, irá envergonhar-se com a própria história, revoltar-se, ou virar-se para o “outro lado”. Nenhum dos dogmas, mistérios de fé, “profecias”, usos e costumes ou ordenanças do líder religioso devem ser questionadas, apenas crida e obedecida, senão a sua “fórmula secreta” será descoberta.

Como acontece com picolés e sorvetes, o consumo excessivo causará resfriado ou dor de garganta no consumidor. Com a crença em deus é o mesmo: eles empurram diariamente seus “sorvetes de chuchus” nos crentes e quando esses estão adoecidos com a ideia de pecado, da condenação e morte eterna, eles mesmo oferecem o remédio, a dita salvação que custará 10% da renda mensal do fiel além da obediência cega ao sistema por toda uma vida...

A mais leve brisa da ciência, da lógica e da razão é capaz de não apenas derreter esse refresco, como também fazê-lo evaporar diante do consumidor que ficará furioso e partirá para o ataque a quem o fizera dissolver-se. Todo o universo do fiel desmorona quando esse picolé derrete ou evapora. Alguns ficam sem chão, outros pensam até em tirar a própria vida ou a vida de outem.

Para os que procuram esse tipo de paliativo, sempre haverá um vendedor ambulante em cada esquina, oferecendo o sorvete fresquinho ao gosto do freguês, tem como base a mesma fórmula e efeitos colaterais ao consumidor, apenas a cobertura é diferente.

Há crianças que nunca amadureceram apesar de adultas e se o sorveteiro não passar no dia e hora certa, eles farão birras e se comportarão como crianças más.

Para outros desse tipo, a certeza que receberão no fim de suas vidas das mãos do “sorveteiro chefe” o “grande sorvete supremo” é o motivo de eles não roubarem, matarem ou fazer tudo que é danoso aos outro ou a eles mesmos. Alguns até matam e morrem por esse sorvete ou para que ele não derreta no calor das evidencias. Outros chegam a confessar publicamente que se o “sorveteiro-mor” não os assistisse do alto de sua sorveteria celestial a fim de puni-los por leviandades, eles seriam crianças bem rebeldes e malvadas, tacando fogo em tudo e em todos por pura diversão. Ainda bem que para essas “bestas enrustidas” o sorvete de chuchu tem alguma serventia real, já que o medo da punição é maior que a necessidade de respeito e cooperação mutua com outros seres viventes.

A realidade é clara: quem não amadurece, cresce e evolui, será sempre dependente desses sorveteiros, suas sorveterias e seus picolés de chuchu para adoçar a própria vida.

Outro fato é que se ficares entre um traficante e um viciado achando que vai salvar um ou outro, vai acabar atraindo a ira de ambos. O melhor é evitar que eles andem em suas “quebradas”, que contaminem seus filhos com os seus vícios e que faça com que sua região se torne uma zona desvalorizada, perigosa e disputada por outros “vendedores de entorpecentes”.

Se é verdade que “há caminhos que para os olhos parecem bom, mas o fim deles é a morte”, considero que esse caminho tenebroso seja o da fé cega nos deuses metafísicos e a obediência irrestrita aos seus representantes, pois esses, quando não matam deixa o caminhante aleijado, dependente, viciado e paranoico.

Pensem bem: se é pra “ficar fresco” e “seguro” tomando todo dia esse refresco de chuchu, melhor é crescer e evoluir atravessando os desertos da vida. Tomar conselhos de viciados e alienados é como dirigir um carro em alta velocidade sem freios e com a direção solta. Pensem nisso! REVEJA SEUS CONCEITOS!

Saúde e Sanidade a todos!

Texto escrito em 1/1/21

*Antônio F. Bispo é graduando em jornalismo, Bacharel em Teologia, estudante de religiões e filosofia.

Ferreira Bispo
Enviado por Ferreira Bispo em 01/01/2021
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