Relato 39) - Ayahuasca - Caminho Sagrado - (28/11/2020)

IMPORTANTE: Este local é um espaço de vivência com ayahuasca e não tem nada a ver com a doutrina do Santo Daime, embora a bebida sagrada seja a mesma.
Por isto neste relato vou respeitar este contexto, mas vou continuar a usar o termo igreja, para definir o espaço interno onde o trabalho ocorre.
Site do Caminho Sagrado: www.caminhosagrado.com.br

O Caminho Sagrado retomou os trabalhos em forma de concentração com um número limitado de participantes e várias medidas de precaução: distanciamento de 1 metro entre as cadeiras, uso obrigatório de máscara, sem mesa coletiva de lanche, sem aplicação de rapé coletivamente, entre outras medidas.
Fomos eu e a esposa. Saímos de casa às 10:00 e conseguimos chegar às 11:45. O trabalho estava marcado para começar às 12:00, mas sempre atrasa um pouquinho.
Por volta de 12:45 o Padrinho Mário tocou o sino chamando todos para dentro da igreja, para iniciar o trabalho.
Havia umas 40 pessoas, 5 indo pela primeira vez. Gosto quando tem gente indo pela primeira vez, isto me dá força, rs.
O Padrinho fez a palestra inicial, explicando como é o trabalho, o que é a medicina, entre outras informações gerais.
A seleção musical começou a ser tocada nas caixas de som e foi feito o primeiro despacho da medicina. Daime bem fortinho, rs, quase igual ao do Céu de Maria em trabalho de São Miguel.
Pedi o copinho cheio (descartável de 50 ml), tomei o daime, comi um pedaço de maçã que foi servido em seguida e fechei os olhos.
Passados uns 40 minutos senti a força chegando. Sei que está chegando quando o coração começa a disparar, rsrs.
Vem aquele Sorriso maravilhoso no rosto, meu corpo fica ereto, aprumado, minhas mãos começam a se mexer sozinhas e me entrego aos seres divinos, que trabalham através de mim.
Xamãs ancestrais, deuses indus, seres de outras dimensões, todos trabalhando através de mim, conforme eram chamados nas canções.
Normalmente neste primeiro despacho a força chega e fica na superfície da consciência. A mente ainda estava presente e disse “Se for assim tudo bem, ainda estou aqui”, rsrs.
Quero ver é no segundo despacho, quando a mente não pode ficar e a minha consciência entra com tudo em um universo de cores, luzes, formas geométricas, e eu me perco nisto tudo e deixo de existir. Passo a ser um com esta Força, que não fica mais na superfície da minha consciência. Eu me torno Ela. É como morrer, rs.
Esta é a hora da verdade, e nunca sei o que vai acontecer.
Foi feito o segundo despacho e sem pensar nenhuma vez, “pedi” o copinho cheio novamente. Saí lá fora, para fazer xixi e comer uma maça. Que sabor, que gratidão, que amor para com o fruto.
Voltei para dentro da igreja e fechei os olhos novamente. Aí a força veio com tudo. É a hora da Verdade.
O coração começou a bater mais forte, senti o rosto adormecendo, depois o corpo todo, a própria sensação de ter um corpo sumiu, já não sentia mais a respiração ou a batida do coração, vi as luzes, as cores, as formas geométricas, os sons do astral, amor, caridade, o Universo todo em alegria porque eu estava chegando, minha consciência começou a se dissolver neste oceano de amor e luz, vi e senti a divindade (a quem a canção estava sendo dedicada) chegando e mudando o meu rosto, meu corpo, minhas vestes, ... mas... mais uma vez esta parte de mim que ainda tem medo não quis perder o controle e me tirou da igreja. Mas desta vez não fiquei enjoado. Ela tem medo, porque entrar no Astral é como morrer. É a morte para ela.
Sentei no chão perto da porta, em frente a uma bela árvore com uns cipós enroscados nela e encostei a mão na árvore pedindo ajuda. Pra que, rsrs. Eu já não existia mais, tornei-me um com a árvore e com tudo. Tirei a mão e não conseguia voltar para dentro da igreja.
Um irmão perto de mim estava fazenda sua limpeza e me firmei para não entrar nesta vibração. Consegui entrar para dentro da igreja e sentei. Imediatamente o meu corpo tomou uma posição de derrota, de fraqueza, de dúvida, de medo, arqueado sobre si mesmo.
Em alguns momentos ainda conseguia erguer o corpo e começar a voltar para o astral, mas logo o medo o arqueava novamente.
Aí esta parte de mim que tem medo começou a falar:
“Para que dar o último passo? Já cheguei até aqui? Não é o suficiente?"
“Não posso escolher não ser Deus apenas por este momento? Procuro ser Deus em todos os momentos, não posso deixar de ser apenas desta vez. E o meu poder de escolha?”
“Não há necessidade de dar o último passo!”
Mas isto ocorria sem nenhum sofrimento ou desespero na minha parte ainda consciente. Parecia mais um desabafo desta parte de mim. Um acerto de contas.
Aí.... rs. A Fonte falou: “Amada parte de mim ainda ignorante da Verdade e inconsciente de Quem É: se Eu escolher não ser Deus por um mínimo momento, este corpo que vocè está usando morreria em 3 minutos, pois o ar que ele respira perderia seu equilíbrio de gases respiráveis. Se Eu escolher não ser Deus por um segundo, o sol se apaga, a lua não controla mais as marés, a terra não terá mais o poder da abundância e nutrição que emana de Mim e não produzirá mais nada. Na verdade, se o poder que Eu emano cessasse por um segundo, tudo no Universo se precipitaria em todas as direções.”
“Desculpe, mas esta é a única coisa que você não consegue escolher: Não ser Deus. Isto é impossível. Eu sou tão você quanto você é Eu. Escolha tudo o que quiser para a sua experiência de Mim, mas não conseguirá não ser Eu. Pode ficar inconsciente disto, negar o quanto quiser, mas desde o Início e até o Fim, e do Fim até o Início... a única coisa que existe sou Eu”
Aí esta parte minha que tem medo seguiu por outra direção. Quis me convencer (como se fosse a parte de mim ainda consciente ( o intelecto)), de que não seria mais necessário seguir com a medicina, que eu poderia seguir por outros meios, que talvez não fosse possível transmutar o medo em amor nesta vida, que teríamos outras oportunidades.
Eu acreditei nisto e chorei muito, pois sabia que nenhum caminho seria tão verdadeiro e real quanto este. Nenhum outro me levaria a ter este contato real e inquestionável com o Divino. Seriam apenas distrações. Chorei mais ainda em pensar que não acompanharia mais a esposa nos trabalhos.
Fiquei por um bom tempo sofrendo. Pensei em abrir os olhos e olhar para a esposa para pedir força, mas com certeza ela estaria lindamente entregue ao Astral. Ouvi bem claro “Não adianta olhar para ela, ela não vai poder te ajudar. Só você mesmo pode se ajudar”
Minha parte consciente tentava aprumar o corpo, relaxar e se entregar, mas esta parte que ainda tem medo de morrer, rs, ainda relutava.
O Padrinho Mário tocou o sino e informou que seria servido o terceiro despacho da medicina. Eu estava decidido a não tomar este terceiro, e a não voltar nunca mais.
No meio disto tudo, a minha parte consciente pensava que esta resistência ocorria porque eu tomei o segundo copinho cheio, quando deveria ter pedido só a metade, que o ego havia pedido o copinho cheio. Pensei nisto porque na palestra inicial o Padrinho Mário sempre fala para termos discernimento sobre a quantidade. Aconselhava que o primeiro copinho fosse cheio, mas que nos demais tivéssemos atenção, pois teríamos que dar conta depois, e que A Força não tem um botão de “desligaistopelamordeDeus”.
Ouvi novamente, bem claro “Não tem a ver com a quantidade. Pouco ou muito, esta parte ainda inconsciente de você bloquearia a sua entrega”.
Aos poucos a força foi diminuindo e pude relaxar um pouco. Quando senti que esta parte de mim que tem medo se tranquilizou, a minha parte consciente disse : “Você vai renunciar ao seu Reinado?”. Conscientemente eu ri e disse “Claro que não. Vou vencer este medo pelo cansaço”.
Como não havia tomado o terceiro despacho, a força foi diminuindo, e aproveitei a ausência desta parte de mim que tem medo para curtir o restinho da força. Neste momento não há força suficiente para entrar no Astral, mas é muito gostoso. Sente-se apenas os benefícios que vem de lá. Alegria, Amor, Caridade.
Terminou o trabalho por volta das 18:00, ficamos mais um pouco no sítio e depois fomos para casa.
Ah, os dias seguintes são sempre mágicos. Depois que chegamos em casa eu ainda fiquei com “um pé lá e um aqui” por um bom tempo.
A noite estava dormindo e acordei assustado, sentindo um cheiro muito forte de ervas, impregnando o nariz. Quando abri os olhos ainda vi nuances de uma floresta. A mente nem teve tempo de pensar. Eu já estava consciente no astral. Primeiro veio um xamã, desenhou com a ponta dos meus dedos algo complicado no meu corpo todo, envolvendo peito, barriga, sexo.
Depois aos poucos veio Ogum. Quando vinha chegando eu já sabia que era ele. Tenho receio (medo mesmo) de trabalhar com ele, pois ele transfigura o meu rosto de tal maneira (como se os ossos da face estivessem se movendo) que parece que os ossos vão se quebrar.
Se resisto, tenho que sair da corrente com enjoo e às vezes faço limpeza. É muito forte a energia dele, parece que vai me partir no meio.
Mas desta vez pensei: Bem, morrer não vou. Se morrer também, morro feliz. E deixei que ele viesse. E veio do mesmo jeito que vem no trabalho com daime.
Ele também fez um monte de coisas com as mãos no meu corpo.
No domingo a esposa foi no chá de noivos de parentes nossos. Eu não quis ir (como é bom viver em um relacionamento onde concordamos que não há obrigações, apenas oportunidades). Sentei lá fora no jardim e aquela parte que tem medo veio e disse “Desisto de você. Não quero mais esta vida. Estou gastando muita energia por um só. Tenho mais tantos outros”. Falei. OK.
Não acredito em um demônio personalizado, com seus asseclas, lutando contra Deus. Se existisse um demônio ele ficaria com inveja da maldade da consciência coletiva criada pela humanidade.
Esta ancestral consciência coletiva baseada no medo existe desde o primeiro pensamento de separação, quando alguém na condição humana esqueceu que é um ser divino. Isto tornou-se um gigantesco ego vivo, que tem inteligência e personalidade e só existe porque a humanidade continua lhe fornecendo energia. A humanidade a criou e somente ela pode dissolve-la. Deus não vai interferir em nosso livre arbítrio e nem no resultado dele.
Na segunda passei o dia todo entre dimensões. Cheguei a pedir que isto fosse abrandado, pois estava difícil para eu passar o dia no trabalho. Fui atendido e consegui passar um dia tranquilo.
Mas sei que algo mudou profundamente na minha consciência. O estado de não-mente está mais profundo ainda. Várias vezes ao dia observo minhas mãos fazendo coisas, minhas pernas andando, rsrs. Sou apenas um interessado Observador.