O BÊBADO QUE QUEBROU SEU PRÓPRIO ESPELHO E FOI SER FELIZ!
Aos formandos da “academia celestial”.
*Por Antônio F. Bispo
Imagine que realmente houvesse um deus. Imagine por um instante que ele seja justo, imparcial, onisciente, incorruptível, auto existente e auto suficiente. Agora imagine que ele seja de fato um deus de puro amor como dizem ser. Pense ainda que realmente ele seja o deus criador de todas as coisas e que todas as “raças” humanas surgiram à partir de um mesmo tronco, de um único casal primordial criado por esse deus e posto como coroa da criação.
Baseado nessa hipótese, conjecturemos um pouco sobre a personalidade de deus segundo a visão que os ocidentais dele fazem ao nutrirem uma crença sincrética tornando místico tudo o que envolve ou se relaciona a ele como objeto de veneração.
Devido ao sincretismo e apropriação cultural de outros povos, o deus bíblico tem se tornado um ser multifacetado cada vez mais, com diferentes traços de personalidade, diferentes formas de agir e se manifestar, traços esses que oscilam entre a bestialidade de um homem primitivo, um macho alfa brigando por territórios e fêmeas para acasalar e a quietude plena de um monge em controle total de suas emoções.
Entre as várias caricaturas que dele fazem, tomemos como objeto de análise essas qualidades citadas acima, e confrontemo-las, com a lógica dos fatos e do comportamento dos que mantém enraizada tal fundamento. Estes afirmam piamente que deus possui tais virtudes e baseado em tais atributos, suas ações e decisões são tomadas o tempo todo e nós, reles mortais poderemos ser abençoados ou sofrer danos severos mediante a oscilação desse equilíbrio.
Pensem nesse “deus poderoso” e pense em todos os crédulos do mundo inteiro, de todas as épocas, a encontrar-se com ele no tão citado dia do juízo final onde eles afirmam que irão receber suas recompensas e que os não crédulos serão julgados e punidos pela falta de fé e pela “maldade” praticada. A confiança maior de um galardão que esses possuem não provem exatamente do nível de conduta moral que tiveram, mas da propaganda que fizeram de seu deus e de suas crenças.
Como bajuladores de políticos que esperam cargos e empregos por terem trabalhados nas campanhas destes, os crédulos tem por certo que deus os ama e tem um lugar reservado pra eles devido a esse puxa-saquismo.
Eles desenham deus, desenham sua vontade, imaginam aquilo que deus teria pra dizer pra eles se ele estivesse naquela situação e depois se submetem a tudo o que desenharam e diz: “deu mandou, deus falou!”
Mas sendo deus verdadeiro, o que deus daria a esses como recompensa por tanta “devoção”?
Se entre tantas qualidades atribuídas a deus, se pelo menos algumas dessas fossem reais, aqueles que julgam ser seus servos seriam os principais prejudicados. Seriam punidos e condenados por transformarem aquilo que afirmam ser o sistema que traria paz e esperança ao mundo, em uma máquina de extorquir, manipular e destruir vidas, reputações e até sociedades inteiras. Uma grande associação criminosa! É com isso que muitos desses grupos se parece! É justamente nisso que muitos desses sistemas se tornaram.
Todos os crédulos esperam ser recompensados pelas paranoias, auto mutilações, auto penitencias, danos causados a si mesmo e a outrem julgando obedecer a deus ou sua palavra.
Porém, se fosse deus real e tivesse um senso de humor elevado chamaria um a um e diria em alto e bom som: “VENHAM PEGAR AQUI VOSSOS DIPLOMAS DE RETARDADOS”. A sua frente estaria um monte de gente sem noção, esperando ser recompensadas por um marketing inverso daquilo que poderia ser sua verdadeira vontade de deus.
A esses, deus também daria como recompensa uma medalha de hipocrisia extrema, um rosto de madeira para ser lustrado diariamente com óleo de peroba, ou por piedade ele lhes daria um cérebro novo, que funcionasse direito e uma nova chance de vida criando um outro mundo sem a intervenção do diabo e seus anjos para não atrapalhar tudo outra vez.
Ainda no campo das hipóteses, sendo deus um ser justo, jamais ele deixaria que cada um fizesse o que bem entende em seu nome nem com nenhuma de suas criaturas, para somente depois, no dia do juízo final se manifestar. A inercia de suas ações teria causado dor e sofrimento a milhões de pessoas por milhares de anos.
Segundo a interpretação geral sobre a justiça de deus, quem morre é quem perde, quem vive há sempre uma chance de se arrepender e ser salvo, porém quem morreu...
Há algum tipo de justiça na inercia ou na conivência silenciosa de um juiz que vê um marginal destruir várias vidas inocentes? Com certeza não, nem mesmo ele sendo um juiz “humano, falho e pecador”. E se fosse vários deles que agem como marginais fazendo isso por centenas de anos?
Será que haveria por exemplo, algum tipo de justificativa para uma mãe entregar seu bebê à própria sorte em uma jaula com leões, chacais e abutres famintos e depois dizer: “se sobreviver é por quê tem fé em mim, por que acreditou em meus planos, por que me ama e por isso merece um lugar especial ao meu lado! Nenhuma pessoa sensata faria isso, quanto mais um deus justo, não é mesmo?
Bem, os crédulos dizem que deus criou o ser humano limitado, sem experiencia alguma de vida, sem discernimento do bem ou do mal e colocou estas criaturas indefesas junto ao diabo, o pai da mentira, o rei da astúcia, o capitão das malandragens, que tentou dar rasteira inclusive no próprio deus e por isso foi lançado à terra e deus, apesar de todo poder e autoridade que possui, poderia ter vetado a entrada desse no Éden e mesmo assim não o fez, deixo-o livre para relacionar-se com sua criação, estraga-la e fazê-la sofrer.
Logo ele, o diabo que seduzira um terço dos anjos, agora ali, livre para enganar a um simples casalzinho vegano, feito do pó da terra poucos dias antes...
Deus pôs a presa indefesa junto ao predador feroz e disse: “se vire, se não conseguir se sair bem nessa prova, eu te amaldiçoarei, não somente a ti, mas a toda sua descendência com a dor, a velhice e a morte, e logo depois o inferno!
Que teste de fidelidade mais insano, não acham? Nem o J. Kleber seria tão astuto assim com tanta tentação! Enquanto deus, além de pôr o tentador junto ao que certamente cairia em tentação, estava à espreita, esperando o casal errar para punir, ao invés de impedir o acesso da tentação àquele recinto! Que tara esquisita!
Considerando outra de suas “qualidades”, sendo real, uma poderia anular a outra, ou pelo menos aquilo que dizem ser o principal de todos os mandamentos: ADORÁ-LO ACIMA DE QUALQUER COISA!
Reverencia-lo com todas as nossas forças, recursos financeiros e mentais sob pena de maldição ou morte eterna! Só tiranos faria algo tão estupido! Até os despostas humanos tem limites quanto a essa tara, esse desejo absurdo de ser adorado, de ser lembrado o tempo inteiro, torna sua personalidade duvidosa. Só os tolos pedem pra ser constantemente lembrado daquilo que não são para que eles mesmos acreditem naquilo que sabe que não é verdade, mas pela repetição coletiva todos acabam acreditando, inclusive ele mesmo. Adoração própria é uma ferramenta usada por mentes fracas e com crises de identidade.
É ilógico pensar que um deus justo concorde que seja subtraído qualquer tipo de recursos das pessoas (necessitadas) para dar a ele que de nada precisa.
Fosse ele um ser auto existente e auto suficiente, nada do que fizéssemos ou deixássemos de fazer o afetaria em nada. Ele nem seria melhor e nem pior em coisa alguma, pois sua existência, seu estado de humor ou seu senso de justiça transcenderiam qualquer intenção impura, com intuitos de perverte-lo a um lado, desse modo à injustiça. Aquilo que damos “a ele” ou deixamos de doar “em sua casa” não faria diferença alguma na hora de julgar ou presentear alguém. Tampouco nossa pureza nem nosso “pecado” macularia sua essência
Qualquer ser inteligente com mais de dois neurônios saberia que toda forma de culto que envolva penitência, louvores, palavras de exaltação e oferendas diversas ao ser cultuado para gradar ou conter a ira deste deus, é um ato explicito de corrupção! DEUS É UM CORRUPTO E EU POSSO CORROMPÊ-LO SEMPRE QUE EU QUISER! É o que todo crente afirma indiretamente em seus atos devocionais, mesmo sem se dar conta disso!
Sob a mesma situação de apelação infame, um honesto juiz humano, “falho e pecador”, entenderia oferendas pessoais como um insulto, uma forma de suborno e teria repulsas ao objeto de investigação ao invés de sentir apreço por este.
Na cabeça de um crente, o ser mais justo do universo pode ser comprado com sacrifícios de animais, palavras vazias, louvores, bajulações ou com alguma quantia em dinheiro. Quem mais contribui ou mais o adora será mais digno do seu afeto. É o que eles dizem indiretamente.
Sendo ele senhor de todos, pai de todos e criador de todos, não haveria espaço para exclusividade alguma, de ninguém, pois todos seriam seus filhos por igual e a sua justiça o impediria dar atenção especial a qualquer grupo, pessoa ou “herói da fé”.
Nos mais variados ritos de culto, os que dizem falar com deus ou em nome dele, desenvolvem automaticamente um certo ar de superioridade em relação a todos. Todos os do grupo, da sociedade local e se deixarem ganhar espaço, vão se achando melhores que todas pessoas do mundo inteiro. Ideais supremacistas ou de eugenia, geralmente costumam nascer com o “povo de deus”. Do nada começam dar pitaco em tudo e em todos, fazendo juízo precipitados, metendo sempre o nariz onde não é chamado, achando-se sempre no direito de condenar e humilhar qualquer que julgue estar em seus caminhos ou nos caminhos de deus...Tem sido assim desde sempre...
O retrato que os crédulos fazem do seu próprio deus é semelhante a um homem bêbado, que sentado em frente a um espelho contempla o seu próprio reflexo. Por estar embriagado, ele não consegue notar que aquele que “interage” com ele é a sua própria imagem.
À medida que o álcool vai tomando o corpo e diferentes emoções são despertadas ele vai tratando a outra pessoa, ou seja, sua própria imagem de diferentes maneiras, com diferentes tons de voz, em diferentes picos de humor. Irá se dirigir a imagem como sendo uma autoridade subalterna a ele, ora como sendo seu superior. As vezes gritará com ela como se fosse um condenado, em outras vezes como um ser digno de misericórdia, incompreendido por todos e por isso faz o que faz. Irá pedir ajuda à sua própria imagem, bem como ofertará a ela o seu auxílio. Culpá-la-á pelos seus fracassos, bem como agradecer-lhe-á pelo seu sucesso. Assim, o homem bêbado, após chorar, cantar, sorrir e lamentar à sua própria imagem refletida, ele deita e dorme.
Ao acordar, sente um pouco de vergonha pelo que fez, ao mesmo tempo que sente vontade de repetir tudo de novo, pois naqueles poucos instantes de embriagues, sente-se o senhor do mundo e aquela sensação de poder temporário o seduz a embriagar-se sempre.
Durante o culto, o que cultua é semelhante a esse bêbado, que embriagado fala a sua própria imagem, é senhor desta ao mesmo tempo que lhe é servo. Como o álcool é viciante. A necessidade de culto também, pois os picos de adrenalina flutuam tanto no corpo de um fiel em “comunhão com deus” quanto uma pessoa entorpecida por álcool e alucinógenos.
O medo de quebrar o espelho e descobrir que do outro lado não há nada é muito grande. Por isso, olhando para sua própria imagem, respondendo aos seus próprios instintos, ganancias, ignorância e medo do desconhecido, o “homem de fé” cultivará sempre a ideia de ser recompensando no além por um teatro pessoal que ele mesmo montou ainda em vida.
Cada um pode reescrever a própria história após parar de “embriagar-se” e ouvir a “voz de deus” no espelho do seu quarto escuro.
REVEJAM SEUS CONCEITOS! Saúde e Sanidade a Todos!
Texto escrito em 10/10/20
*Antônio F. Bispo é graduando em jornalismo, Bacharel em Teologia, estudante de religiões e filosofia.