SOBRE A INICIAÇÃO
A Iniciação Maçônica, como sabemos, é um rito de passagem, no qual o simbolismo que ali se desenvolve tem como objetivo oferecer a quem nela se inicia uma nova perspectiva de vida. Essa, aliás, é a temática de todo rito de passagem, cuja finalidade é marcar o início de uma nova etapa na vida da pessoa. É assim que temos, por exemplo, os ritos do batismo, do casamento, o trote da faculdade, os ritos funerários, etc.
Em todos os ritos de caráter religioso ou teosófico, o elemento padrão é a ideia de admissão do neófito em um patamar de consciência superior, na qual a iniciação é um portal de ingresso, onde ele recebe a preparação necessária para ingressar nessa outra fase da sua vida. É por essa razão que em toda iniciação à maçonaria se percebe uma estrutura ternária, na qual o candidato é isolado do chamado mundo profano e colocado em um ambiente ancorado em símbolos mortuários (simbolizando a morte ritual), para que dali a sua consciência sofra a transformação ontológica que lhe permitirá emergir para a luz que lhe será dada na Loja.
Consoante o rito praticado, a iniciação maçônica apresenta, em cada um, os seus pormenores, embora, como se pode perceber, no fundo todos operem pelo mesmo princípio. Assim é que, nos Ritos Anglo-Saxônicos, (Rito Escocês e de York principalmente) a iniciação se concretiza pela passagem do profano por um recinto fechado, com pouca ou nenhuma luz (em alguns casos somente algumas velas), decorado geralmente com objetos que simbolizam a morte, a transformação e o renascimento em outro estado de consciência.[1]
Algumas distinções podem ser notadas entre os diversos ritos, como por exemplo, a Câmara de Preparação do Rito Escocês Retificado, a Câmara de Reflexões do Rito Francês, o Escocês Antigo e Aceito e o Antigo e Primitivo Rito de Memphis-Misraim. No Rito Retificado a meditação do candidato é feita na presença da Bíblia e de um quadro alegórico simbolizando a brevidade da vida humana. Já na Câmara de Reflexões dos restantes Ritos Continentais há uma variedade de símbolos presentes, conectados com a morte e a ressurreição, representação de uma experiência psíquica na qual se procura ancorar na mente do iniciado, com a ajuda de mensagens inscritas nas paredes das chamadas Câmaras de Reflexão, a transitoriedade da vida humana.
Símbolos comuns a todos os ritos são os chamados três elementos essenciais à operação alquímica de transmutação de metais, que são o sal, o enxofre e o mercúrio. Por isso eles serão encontrados, invariavelmente, em todas as Câmaras de Reflexão, para simbolizar e lembrar ao iniciando que ali se realiza a transmutação da sua consciência de profano para um mundo de conscientização superior, no qual ele ingressará depois de receber a Luz na presença dos Irmãos, no interior da Loja. É nesse sentido também que a palavra “VITRIOL”, frequentemente inscrita nas paredes da Câmara remete o espírito do neófito à uma experiência psíquica semelhante à que Jesus teria vivido nos seus três dias de túmulo, antes de ressuscitar. Essa experiência é, por consequência, a mesma vivida pelos iniciados em todas as religiões solares, desde o deus egípcio Osiris, o grego Apolo, o deus persa Mitra, e o próprio sol, que simbolicamente morre todas as noites e ressuscita no dia seguinte para iluminar toda a terra.[2]
O chamado Ritual de Luquet, 1745, documento transcrito do relatório do tenente de policia Herault, descreve uma cerimônia de iniciação praticada nesses primórdios da maçonaria moderna, onde os elementos da simbologia alquímica são destacados. Esses elementos fazem parte do mais antigo catecismo de aprendiz até hoje conhecido. [3]
P: Onde foste preparado para entrar em Loja ?
R: Nas Trevas.
P: Porquê ?
R: É para me recordar o caos donde tudo foi tirado.
Esse curioso diálogo reporta à uma das mais caras expressões simbólicas presentes na “ciência dos adeptos”, que é a alquimia: a de que no início de toda existência precede um caos, e que a consciência foi posta nos homens justamente para que ele pusesse “ordem no caos”.[4] Nessa simbologia evoca-se também o principio que é assente a todas as crenças, especialmente aquelas que tem raízes no mito solar, ou seja, o de que toda a realidade universal é oriunda de um embate de um embate entre a luz e as trevas, e que para que a luz (da iluminação) possa ocorrer, é preciso que as trevas sejam afastadas. Essa dicotomia está presente inclusive na visão bíblica da criação, na ação de Deus ao separar a luz das trevas.[5]
O caráter dialético dessa disposição é confirmado pelo Abade Pérau, na sua obra “Le Secret des Francs-Maçons”, 1742, na referência que faz de que “onde não deve haver nenhuma luz o que em todo o caso exprime já uma forma simbólica, é o desejo de colocar o recipiendário num estado psicológico apropriado”.
É por isso que encontramos na descrição de uma Câmara de Reflexão, publicada em 1801, os seguintes dizeres: “Esta câmara deve ser impenetrável aos raios do dia e iluminada por uma única lâmpada. As paredes serão pintadas de negro e carregadas de emblemas fúnebres capazes de inspirar o receio, a tristeza, e o recolhimento. Frases de uma moral pura, máximas de uma filosofia austera serão traçadas legivelmente sobre as paredes, ou suspensas, emolduradas em diversos pontos deste isolamento. Um crânio, ou mesmo um esqueleto, se se puder obter um, recordarão ao neófito as coisas humanas. Não deve haver neste quarto mais do que uma cadeira, uma mesa, um pão, um copo cheio de água, sal e enxofre em duas taças, papel, penas e tinta. Sobre a mesa serão representados um galo e uma ampulheta. Debaixo destes emblemas colocar-se- á as palavras VIGILÂNCIA E PERSEVERANÇA”.[6]
Essa descrição aproxima-se bastante do ambiente encontrado nas Câmaras de Reflexão atuais, como pode ser observada pelos Irmãos. Há, nessas âncoras de caráter hermético, uma clara alusão ao principio alquimico expresso no termo VITRIOL, evocando-se aí uma prática necessária a todo iniciado que busca o mundo da consciência superior, prática essa que é descrita na vida de todos os grandes místicos da humanidade e repetida em toda a historia humana como arquétipo imprescindível à toda jornada iniciática.Essa experiência mística, segundo acreditavam algumas seitas místicas classificadas como gnósticas, teria sido praticada inclusive por Jesus e seus discípulos e estaria na própria origem do episódio da sua morte e ressurreição.[7]
As claras referências à cultura alquímica encontradas na iniciação maçônica são mais fortes nos ritos de origem escocesa e francesa, devido provavelmente à uma estreita conexão existente entre a França e a Escócia nesse mister. Essa conexão tem raízes históricas e por estarem fora do escopo deste trabalho não serão referidas aqui. Mas elas nos remetem aos Templários, aos Cátaros e aos acontecimentos que, desde o século XII concorreram para desenhar o mapa político da Europa Ocidental. Na raiz de todos esses acontecimentos iremos encontrar referências às distintas formas de esoterismos que ocuparam o pensamento ocidental desde os primeiro séculos de afirmação da doutrina cristã tais como alquimia, rosa-crucianismo, cabala hebraica e cristã, todas as formas de gnosticismo e misticismo, que ao longo dos séculos XVI e XVII, principalmente, foram enriquecidas por uma farta produção literária até então inexistente ou oculta, como no caso dos evangelhos apócrifos e a literatura árabe e judaica, desconhecida na Europa na época. Nesse contexto avultam nomes que se tornaram famosos como Raymond Lulle, Nicolas Flamel, Roger Bacon, Arnauld de Villeneuve, Paracelso, Michel Maier, Basile
Valentin, Cornelius Agrippa, entre outros, que se tornaram famosos como alquimistas e magos, influenciadores da cultura que desembocou no chamado Renascimento.[8]
Foram eles os responsáveis pela circulação de ideias que levou ao chamado Século das Luzes, conforme se convencionou chamar o Século XVIII, onde grandes transformações culturais, políticas e econômicas ocorreram no mundo ocidental. Essa foi a razão de muitos maçons terem se interessado pela alquimia, e que muitos alquimistas tenham encontrado na maçonaria um refúgio ideal para a sua prática e principalmente para a divulgação das suas ideias. Nesse sentido a prática operativa casou-se com a especulativa, dando nascimento à maçonaria moderna.
As origens alquímicas da franco-maçonaria já aparece nas obras de alguns maçons setecentistas, especialmente na“L’Étoile Flamboyante”, publicada em 1766, de autoria atribuída ao Barão de Tschoudy. Diz esse autor que “Um exame sério de todos os objetos de pormenor trabalhados nas diversas práticas dos Franco-Maçons, e a exposição da maior parte dos seus emblemas, (…) pode talvez legitimar a opinião que a ciência de Hermes seja a origem e o fim da confederação vulgarmente denominada de Franco-Maçonaria”.[9]
Destarte, não é estranho que o florescimento das correntes esotéricas na maçonaria, sobretudo em França, tenha gerado uma enorme multiplicidade de graus e ritos concorrentes. Entre 1775 e 1780 foi reunida uma vasta Biblioteca de Rituais de Graus Maçônicos e de obras alquímicas, o que resultou na fundação de uma Loja de pesquisas conhecida como “Les Philaléthes”, da qual participaram os maiores nomes da maçonaria espiritualista da época, tais como Cagliostro, Mesmer, Touzay-Duchanteau, entre outros.[10]
Foram os autores dessa linha de pensamento que fizeram as ligações entre a iniciação maçônica e as iniciações aos Mistérios do Antigo Egito, ou aos Mistérios de Elêusis, praticados pelos gregos antigos. A esses filamentos culturais adicionaram as tradições da arte hermética, fazendo da Câmara de Reflexões uma associação bastante próxima à uma Caverna onde, nas antigas iniciações, ocorria as Provas da Terra, que em sua analogia, correspondia ao Athanor (vaso do alquimista) onde se realiza a transmutação da matéria prima na chamada pedra filosofal. Essa era, por exemplo, a interpretação dada por Jean-Marie Ragon, um dos mais respeitados autores maçons, no seu “Ritual do Aprendiz”, editado pela primeira vez em 1858.
Esta interpretação encontra-se igualmente presente nos primeiros Rituais dos Ritos Egípcios (Misraim- Memphis, 1838);
Assim, é preciso não esquecer que a maioria dos Irmãos instituidores dos ritos de origem escocesa e francesa tiveram ligações com os Irmãos da Loja“Philalétes”, e que vários membros do primeiro Supremo Conselho de França e do REAA, pertenceram, na origem do seu percurso maçônico, à Loja-Mãe Escocesa de Paris (“Saint Alexandre d’Écosse”), na qual se praticava o Rito Escocês Filosófico, que era, na origem um rito hermético. Talvez por isso tenha surgido, em 1829, a primeira descrição de uma Câmara de Reflexões do REAA, justamente numa obra de origem francesa, na qual a iniciação vinha recheada de alusões hermetistas, atribuindo-se à ela um caráter deísta, para descontaminá-la das referências culturais pagãs que lhe haviam sido apostas por Irmãos de tendências gnósticas, ligados à referências culturais dessa escola de pensamento.
No principio do século XX, os Irmãos Oswald Wirth e Jules Boucher, principalmente, desenvolveram em suas obras importantes argumentos para justificar os elementos da cultura alquímica presentes na iniciação maçônica. Para Wirt, por exemplo,“O simbolismo maçônico constitui com efeito uma estranha mistura de tradições retiradas das antigas ciências iniciáticas. Tem em conta o valor cabalístico dos números sagrados e rege o cerimonial segundo os mesmos princípios da Magia; por outro lado dispõe o Sol, a Lua e as Estrelas, tal como o prescreve a Astrologia. Mas é a Alquimia filosófica, tal como a concebiam os Rosacrucianos do século XVII, a que apresenta as analogias mais surpreendentes com a Maçonaria. Existe, numa e noutra parte, identidade de esoterismo, os mesmos domínios iniciáticos traduzem-se por alegorias retiradas, umas da metalurgia, outras da arte de construir. A Franco-Maçonaria não é, neste ponto de vista, mais do que uma transposição da Alquimia”.[11]
Os trabalhos de Wirt recuperaram para a iniciação maçônica um caráter espiritualista que havia sido eclipsada pelas interpretações positivistas que lhe quiseram dar os autores que não gostavam da face demasiadamente esotérica que a maçonaria francesa e escocesa tinham imposto à Arte Real. O positivismo, como se sabe, é uma corrente filosófica que propugna por uma visão científica da realidade e só aceita como verdade os postulados que possam ser comprovados por meios científicos. Destarte, com a vitória das teses iluministas e do verdadeiro anelo pela ciência, que tomou de assalto os intelectuais do século XIX, o apelo romântico das velhas ideias dos adeptos da alquimia ficaram relegadas a uma mera curiosidade intelectual. Nesse sentido as obras de Wirt deram uma nova dimensão á importância espiritual que o mito da Pedra Filosofal viria a desempenhar na simbologia dos Graus simbólicos e filosóficos do REAA, que até então tinha como suportes arquetípicos a cultura da geometria aristotélica e a mitologia ligada à construção do Templo de Salomão.
A alquimia é hoje, para muitos, apenas uma curiosidade histórica. Refletiu o espírito de uma época, em que a intensa procura por um caminho que pudesse levar a consciência do homem a um êxtase superior era uma preocupação constante. Como esse caminho encontrava dificuldades para ser desvendado através da religião, vários homens de espirito e preparo em ciências naturais intentaram desvelá-lo através da manipulação química. Não cabe aqui discutir o método alquímico em termos de ciência. Deixamos isso para os experts na área. O escopo deste estudo é situar a sua importância na iniciação maçônica e destacar a sua riqueza simbólica. E, mais que isso, apontar a sua virtude como âncora significativa para trabalhar o inconsciente do iniciado no sentido de provocar nele a visão de uma nova vida que começa com a sua iniciação na maçonaria. Pois essa é a virtude de um símbolo. Emular o espirito da pessoa a quem ele é comunicado, no sentido de ancorar nele um estado psicológico propício ao desenvolvimento de uma crença, uma ideia, um comportamento, ou quiçá, uma habilidade.
A simbologia é hoje um dos mais destacados campos de estudo da psicologia humana, devendo-se principalmente a Carl Gustav Jung o pioneirismo nesses estudos. Um dos seus mais interessantes trabalhos nessa área versa exatamente sobre a alquimia e os símbolos cabalísticos, onde ele nos mostra como o inconsciente coletivo da humanidade está estreitamente ligado aos mitos, símbolos e arquétipos que moldam a cultura universal. Isso porque o símbolo é sempre uma âncora que se associa a uma ideia, uma crença, uma sensibilidade que a linguagem comum geralmente não consegue expressar. É a única forma de forjar uma imagem visível de uma realidade que não se pode expressar pelos meios de comunicação conhecidos pelo homem. Destarte, o método simbólico não se assenta numa resposta codificada, mas sim num processo metafórico que oferece ao iniciado os meios de compreensão dos fenômenos inconscientes que ocorrem em nossa mente e muitas vezes, moldam nossos comportamentos.
Assim, os ritos maçônicos estão carregados de simbolismos, especialmente a iniciação. Somente decodificando essa simbologia é possível entender os ensinamentos mais profundos que essa prática contém. Ela se revela nas Palavras, Sinais, Toques, Paramentos, Números, Formas Geométricas, Cores, Jóias, Mitos e Metáforas contidos nos rituais, formando um corpo perfeitamente organizado para servir de catecismo ao iniciado.
É, pois, nesta amalgama extremamente bizarra de influências culturais que a maçonaria moderna foi estruturar as bases do seu ritualismo iniciático. Uma mistura de verdadeiras pesquisas filosóficas produzidas pelos autores iluministas, com apaixonadas buscas de elevação espiritual feitas por espíritos honestos, temperada quiçá com especulações aventureiras formuladas por alguns charlatões ocultistas, mas que de maneira nenhuma concorrem para contaminar de vícios insanáveis a arte do maçom, constitui o acervo dessa arte. Porque, como todo alquimista aprendia quando se iniciava na arte dos adeptos, é persistência, a fé e o espírito de verdadeiro aprendiz que conduz à iluminação. Para todo Irmão que se inicia na arte dos Obreiros da Arte Real, vale o mesmo conselho dado ao alquimista iniciante: ora, ora, ora, labora et invenias. Orar, Orar, Orar, trabalhar. E então descobrirás
[1][1] Essa característica dos ritos de passagem está presente em todas as crônicas que descrevem seções iniciáticas, desde os Antigos Mistérios praticados pelos gregos e egípcios (Mistérios de Ísis e Osíris e Mistérios de Elêusis) como também nas iniciações praticadas por seitas gnósticas da antiguidade. Há indicações que até entre os primeiros cristãos essa prática iniciática tivesse sido exercida. Vários autores referem-se aos episódios descritos nos Evangelhos do Novo Testamento (ressurreição de Lázaro (Evangelho de São João) e a fuga de um jovem envolto em um lençol por ocasião da prisão de Jesus no Horto de Getsemâni (Evangelho de São Marcos) como registros da realização de um ritual de iniciação. Há também indicações que os Cavaleiros Templários praticavam algum tipo de ritual de iniciação para os membros de hierarquia superior na Irmandade, que envolvia elementos de magia ritual, que iam além da mera inserção em um grupo.
[2] A palavra Vitriol é o acrônimo da expressão latina“Visita Interior a Terrae Rectificando que Invenies Occultum Lapidem” – (Visita o interior da Terra, que purificado, encontrarás a pedra escondida). Nessa expressão encontra-se um dos mais caros ensinamentos da alquimia, que acentua a necessidade de uma morte iniciática para fins de um renascimento em outro nível de consciência. Essa frase é atribuída a um alquimista alemão do século XV, chamado Basile Valentin. Este foi um monge beneditino, autor de várias obras de alquimia, entre as quais as mais conhecidas são Currus Triumphalis Antimonii (A carruagem triunfal do antimônio) e Duodecim Claves (As doze chaves).
[3] Esse documento, denominado “Recepcion d’un frey-maçon”, descreve a cerimônia de recepção de um aprendiz maçom, na qual o candidato é conduzido pelo seu padrinho a um reservado privado de luz, onde ele é interrogado sobre a sua vocação para fazer parte da Irmandade. Caso aprovado ele era preparado para a entrada em Loja, após o recolhimento dos metais, e sempre usando uma venda, na condição de “nem vestido nem despido, como ainda hoje é observado no Ritual do Aprendiz.
[4] Não por acaso, uma das divisas da maçonaria se expressa exatamente pela frase “Ordo ab Chaos” (Ordem no Caos).
[5] No princípio criou Deus o céu e a terra. E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas. E disse Deus: Haja luz; e houve luz. E viu Deus que era boa a luz; e fez Deus separação entre a luz e as trevas. E Deus chamou à luz Dia; e às trevas chamou Noite. E foi a tarde e a manhã, o dia primeiro. Gênesis 1:1-5
[6] “Régulateur du Maçon”, publicado em 1801-Supremo Conselho da França.
[7] Essa era uma crença esposada por algumas seitas gnósticas que foram suprimidas pela Igreja de Roma, quando conseguiu fazer do cristianismo a religião oficial do Império Romano. Há claras evidências documentais que mostram que os Cátaros, seita que floresceu no sul da França no início do segundo milênio e que foi suprimida numa violenta cruzada patrocinada pelo Vaticano, era partidária dessas crenças. Segundo esses cultores do cristianismo herético, Jesus não era filho de Deus, nem havia nascido de uma virgem e também não ressuscitara. As referencias evangélicas que falam sobre a sua ressurreição nada mais seriam que interpolações feitas por autores encomendados pela Igreja para provar que Jesus era o Messias esperado pelos judeus e o Cristo dos mitos solares. Tais interpolações teriam sido inspiradas na prática iniciática da morte ritual, para renascimento em outro estado de consciência, que Jesus teria instituído entre seus discípulos. Assim, o episódio da morte e ressurreição de Jesus, os três dias na tumba, etc. nada mais refletia do que uma prática ritual. Essa prática também teria sido adotada pelos Cavaleiros Templários em suas seções iniciáticas superiores, o que teria servido de motivo para a supressão da Ordem e a morte na fogueira de seus principais líderes.
[8] Para maiores pormenores sobre a cultura que precedeu o nascimento da maçonaria moderna vide nossa obra “Conhecendo a Arte Real”, Ed. Madras, São Paulo, 2019.
[9] Wirth Oswald – ”Le symbolisme hermetique par rapport à l’Alchimie et à la Maçonnerie”, Paris, 1910;
[10] Jean Palou- A Maçonaria Simbólica e Iniciática, Ed. Pensamento, 1964
[11] Wirth Oswald – ”Le symbolisme hermetique par rapport à l’Alchimie et à la Maçonnerie”, Paris, 1910; op citado. Wirth Oswald – ”Theorie et symboles de la Philosophie Hermetique”, Paris;
- Sobre a Câmara de Reflexão
A Iniciação Maçônica, como sabemos, é um rito de passagem, no qual o simbolismo que ali se desenvolve tem como objetivo oferecer a quem nela se inicia uma nova perspectiva de vida. Essa, aliás, é a temática de todo rito de passagem, cuja finalidade é marcar o início de uma nova etapa na vida da pessoa. É assim que temos, por exemplo, os ritos do batismo, do casamento, o trote da faculdade, os ritos funerários, etc.
Em todos os ritos de caráter religioso ou teosófico, o elemento padrão é a ideia de admissão do neófito em um patamar de consciência superior, na qual a iniciação é um portal de ingresso, onde ele recebe a preparação necessária para ingressar nessa outra fase da sua vida. É por essa razão que em toda iniciação à maçonaria se percebe uma estrutura ternária, na qual o candidato é isolado do chamado mundo profano e colocado em um ambiente ancorado em símbolos mortuários (simbolizando a morte ritual), para que dali a sua consciência sofra a transformação ontológica que lhe permitirá emergir para a luz que lhe será dada na Loja.
Consoante o rito praticado, a iniciação maçônica apresenta, em cada um, os seus pormenores, embora, como se pode perceber, no fundo todos operem pelo mesmo princípio. Assim é que, nos Ritos Anglo-Saxônicos, (Rito Escocês e de York principalmente) a iniciação se concretiza pela passagem do profano por um recinto fechado, com pouca ou nenhuma luz (em alguns casos somente algumas velas), decorado geralmente com objetos que simbolizam a morte, a transformação e o renascimento em outro estado de consciência.[1]
Algumas distinções podem ser notadas entre os diversos ritos, como por exemplo, a Câmara de Preparação do Rito Escocês Retificado, a Câmara de Reflexões do Rito Francês, o Escocês Antigo e Aceito e o Antigo e Primitivo Rito de Memphis-Misraim. No Rito Retificado a meditação do candidato é feita na presença da Bíblia e de um quadro alegórico simbolizando a brevidade da vida humana. Já na Câmara de Reflexões dos restantes Ritos Continentais há uma variedade de símbolos presentes, conectados com a morte e a ressurreição, representação de uma experiência psíquica na qual se procura ancorar na mente do iniciado, com a ajuda de mensagens inscritas nas paredes das chamadas Câmaras de Reflexão, a transitoriedade da vida humana.
Símbolos comuns a todos os ritos são os chamados três elementos essenciais à operação alquímica de transmutação de metais, que são o sal, o enxofre e o mercúrio. Por isso eles serão encontrados, invariavelmente, em todas as Câmaras de Reflexão, para simbolizar e lembrar ao iniciando que ali se realiza a transmutação da sua consciência de profano para um mundo de conscientização superior, no qual ele ingressará depois de receber a Luz na presença dos Irmãos, no interior da Loja. É nesse sentido também que a palavra “VITRIOL”, frequentemente inscrita nas paredes da Câmara remete o espírito do neófito à uma experiência psíquica semelhante à que Jesus teria vivido nos seus três dias de túmulo, antes de ressuscitar. Essa experiência é, por consequência, a mesma vivida pelos iniciados em todas as religiões solares, desde o deus egípcio Osiris, o grego Apolo, o deus persa Mitra, e o próprio sol, que simbolicamente morre todas as noites e ressuscita no dia seguinte para iluminar toda a terra.[2]
- A influência da alquimia
O chamado Ritual de Luquet, 1745, documento transcrito do relatório do tenente de policia Herault, descreve uma cerimônia de iniciação praticada nesses primórdios da maçonaria moderna, onde os elementos da simbologia alquímica são destacados. Esses elementos fazem parte do mais antigo catecismo de aprendiz até hoje conhecido. [3]
P: Onde foste preparado para entrar em Loja ?
R: Nas Trevas.
P: Porquê ?
R: É para me recordar o caos donde tudo foi tirado.
Esse curioso diálogo reporta à uma das mais caras expressões simbólicas presentes na “ciência dos adeptos”, que é a alquimia: a de que no início de toda existência precede um caos, e que a consciência foi posta nos homens justamente para que ele pusesse “ordem no caos”.[4] Nessa simbologia evoca-se também o principio que é assente a todas as crenças, especialmente aquelas que tem raízes no mito solar, ou seja, o de que toda a realidade universal é oriunda de um embate de um embate entre a luz e as trevas, e que para que a luz (da iluminação) possa ocorrer, é preciso que as trevas sejam afastadas. Essa dicotomia está presente inclusive na visão bíblica da criação, na ação de Deus ao separar a luz das trevas.[5]
O caráter dialético dessa disposição é confirmado pelo Abade Pérau, na sua obra “Le Secret des Francs-Maçons”, 1742, na referência que faz de que “onde não deve haver nenhuma luz o que em todo o caso exprime já uma forma simbólica, é o desejo de colocar o recipiendário num estado psicológico apropriado”.
É por isso que encontramos na descrição de uma Câmara de Reflexão, publicada em 1801, os seguintes dizeres: “Esta câmara deve ser impenetrável aos raios do dia e iluminada por uma única lâmpada. As paredes serão pintadas de negro e carregadas de emblemas fúnebres capazes de inspirar o receio, a tristeza, e o recolhimento. Frases de uma moral pura, máximas de uma filosofia austera serão traçadas legivelmente sobre as paredes, ou suspensas, emolduradas em diversos pontos deste isolamento. Um crânio, ou mesmo um esqueleto, se se puder obter um, recordarão ao neófito as coisas humanas. Não deve haver neste quarto mais do que uma cadeira, uma mesa, um pão, um copo cheio de água, sal e enxofre em duas taças, papel, penas e tinta. Sobre a mesa serão representados um galo e uma ampulheta. Debaixo destes emblemas colocar-se- á as palavras VIGILÂNCIA E PERSEVERANÇA”.[6]
Essa descrição aproxima-se bastante do ambiente encontrado nas Câmaras de Reflexão atuais, como pode ser observada pelos Irmãos. Há, nessas âncoras de caráter hermético, uma clara alusão ao principio alquimico expresso no termo VITRIOL, evocando-se aí uma prática necessária a todo iniciado que busca o mundo da consciência superior, prática essa que é descrita na vida de todos os grandes místicos da humanidade e repetida em toda a historia humana como arquétipo imprescindível à toda jornada iniciática.Essa experiência mística, segundo acreditavam algumas seitas místicas classificadas como gnósticas, teria sido praticada inclusive por Jesus e seus discípulos e estaria na própria origem do episódio da sua morte e ressurreição.[7]
As claras referências à cultura alquímica encontradas na iniciação maçônica são mais fortes nos ritos de origem escocesa e francesa, devido provavelmente à uma estreita conexão existente entre a França e a Escócia nesse mister. Essa conexão tem raízes históricas e por estarem fora do escopo deste trabalho não serão referidas aqui. Mas elas nos remetem aos Templários, aos Cátaros e aos acontecimentos que, desde o século XII concorreram para desenhar o mapa político da Europa Ocidental. Na raiz de todos esses acontecimentos iremos encontrar referências às distintas formas de esoterismos que ocuparam o pensamento ocidental desde os primeiro séculos de afirmação da doutrina cristã tais como alquimia, rosa-crucianismo, cabala hebraica e cristã, todas as formas de gnosticismo e misticismo, que ao longo dos séculos XVI e XVII, principalmente, foram enriquecidas por uma farta produção literária até então inexistente ou oculta, como no caso dos evangelhos apócrifos e a literatura árabe e judaica, desconhecida na Europa na época. Nesse contexto avultam nomes que se tornaram famosos como Raymond Lulle, Nicolas Flamel, Roger Bacon, Arnauld de Villeneuve, Paracelso, Michel Maier, Basile
Valentin, Cornelius Agrippa, entre outros, que se tornaram famosos como alquimistas e magos, influenciadores da cultura que desembocou no chamado Renascimento.[8]
Foram eles os responsáveis pela circulação de ideias que levou ao chamado Século das Luzes, conforme se convencionou chamar o Século XVIII, onde grandes transformações culturais, políticas e econômicas ocorreram no mundo ocidental. Essa foi a razão de muitos maçons terem se interessado pela alquimia, e que muitos alquimistas tenham encontrado na maçonaria um refúgio ideal para a sua prática e principalmente para a divulgação das suas ideias. Nesse sentido a prática operativa casou-se com a especulativa, dando nascimento à maçonaria moderna.
- Origens alquímicas da Franco-Maçonaria
As origens alquímicas da franco-maçonaria já aparece nas obras de alguns maçons setecentistas, especialmente na“L’Étoile Flamboyante”, publicada em 1766, de autoria atribuída ao Barão de Tschoudy. Diz esse autor que “Um exame sério de todos os objetos de pormenor trabalhados nas diversas práticas dos Franco-Maçons, e a exposição da maior parte dos seus emblemas, (…) pode talvez legitimar a opinião que a ciência de Hermes seja a origem e o fim da confederação vulgarmente denominada de Franco-Maçonaria”.[9]
Destarte, não é estranho que o florescimento das correntes esotéricas na maçonaria, sobretudo em França, tenha gerado uma enorme multiplicidade de graus e ritos concorrentes. Entre 1775 e 1780 foi reunida uma vasta Biblioteca de Rituais de Graus Maçônicos e de obras alquímicas, o que resultou na fundação de uma Loja de pesquisas conhecida como “Les Philaléthes”, da qual participaram os maiores nomes da maçonaria espiritualista da época, tais como Cagliostro, Mesmer, Touzay-Duchanteau, entre outros.[10]
Foram os autores dessa linha de pensamento que fizeram as ligações entre a iniciação maçônica e as iniciações aos Mistérios do Antigo Egito, ou aos Mistérios de Elêusis, praticados pelos gregos antigos. A esses filamentos culturais adicionaram as tradições da arte hermética, fazendo da Câmara de Reflexões uma associação bastante próxima à uma Caverna onde, nas antigas iniciações, ocorria as Provas da Terra, que em sua analogia, correspondia ao Athanor (vaso do alquimista) onde se realiza a transmutação da matéria prima na chamada pedra filosofal. Essa era, por exemplo, a interpretação dada por Jean-Marie Ragon, um dos mais respeitados autores maçons, no seu “Ritual do Aprendiz”, editado pela primeira vez em 1858.
Esta interpretação encontra-se igualmente presente nos primeiros Rituais dos Ritos Egípcios (Misraim- Memphis, 1838);
Assim, é preciso não esquecer que a maioria dos Irmãos instituidores dos ritos de origem escocesa e francesa tiveram ligações com os Irmãos da Loja“Philalétes”, e que vários membros do primeiro Supremo Conselho de França e do REAA, pertenceram, na origem do seu percurso maçônico, à Loja-Mãe Escocesa de Paris (“Saint Alexandre d’Écosse”), na qual se praticava o Rito Escocês Filosófico, que era, na origem um rito hermético. Talvez por isso tenha surgido, em 1829, a primeira descrição de uma Câmara de Reflexões do REAA, justamente numa obra de origem francesa, na qual a iniciação vinha recheada de alusões hermetistas, atribuindo-se à ela um caráter deísta, para descontaminá-la das referências culturais pagãs que lhe haviam sido apostas por Irmãos de tendências gnósticas, ligados à referências culturais dessa escola de pensamento.
No principio do século XX, os Irmãos Oswald Wirth e Jules Boucher, principalmente, desenvolveram em suas obras importantes argumentos para justificar os elementos da cultura alquímica presentes na iniciação maçônica. Para Wirt, por exemplo,“O simbolismo maçônico constitui com efeito uma estranha mistura de tradições retiradas das antigas ciências iniciáticas. Tem em conta o valor cabalístico dos números sagrados e rege o cerimonial segundo os mesmos princípios da Magia; por outro lado dispõe o Sol, a Lua e as Estrelas, tal como o prescreve a Astrologia. Mas é a Alquimia filosófica, tal como a concebiam os Rosacrucianos do século XVII, a que apresenta as analogias mais surpreendentes com a Maçonaria. Existe, numa e noutra parte, identidade de esoterismo, os mesmos domínios iniciáticos traduzem-se por alegorias retiradas, umas da metalurgia, outras da arte de construir. A Franco-Maçonaria não é, neste ponto de vista, mais do que uma transposição da Alquimia”.[11]
Os trabalhos de Wirt recuperaram para a iniciação maçônica um caráter espiritualista que havia sido eclipsada pelas interpretações positivistas que lhe quiseram dar os autores que não gostavam da face demasiadamente esotérica que a maçonaria francesa e escocesa tinham imposto à Arte Real. O positivismo, como se sabe, é uma corrente filosófica que propugna por uma visão científica da realidade e só aceita como verdade os postulados que possam ser comprovados por meios científicos. Destarte, com a vitória das teses iluministas e do verdadeiro anelo pela ciência, que tomou de assalto os intelectuais do século XIX, o apelo romântico das velhas ideias dos adeptos da alquimia ficaram relegadas a uma mera curiosidade intelectual. Nesse sentido as obras de Wirt deram uma nova dimensão á importância espiritual que o mito da Pedra Filosofal viria a desempenhar na simbologia dos Graus simbólicos e filosóficos do REAA, que até então tinha como suportes arquetípicos a cultura da geometria aristotélica e a mitologia ligada à construção do Templo de Salomão.
A alquimia é hoje, para muitos, apenas uma curiosidade histórica. Refletiu o espírito de uma época, em que a intensa procura por um caminho que pudesse levar a consciência do homem a um êxtase superior era uma preocupação constante. Como esse caminho encontrava dificuldades para ser desvendado através da religião, vários homens de espirito e preparo em ciências naturais intentaram desvelá-lo através da manipulação química. Não cabe aqui discutir o método alquímico em termos de ciência. Deixamos isso para os experts na área. O escopo deste estudo é situar a sua importância na iniciação maçônica e destacar a sua riqueza simbólica. E, mais que isso, apontar a sua virtude como âncora significativa para trabalhar o inconsciente do iniciado no sentido de provocar nele a visão de uma nova vida que começa com a sua iniciação na maçonaria. Pois essa é a virtude de um símbolo. Emular o espirito da pessoa a quem ele é comunicado, no sentido de ancorar nele um estado psicológico propício ao desenvolvimento de uma crença, uma ideia, um comportamento, ou quiçá, uma habilidade.
- Simbolismo
A simbologia é hoje um dos mais destacados campos de estudo da psicologia humana, devendo-se principalmente a Carl Gustav Jung o pioneirismo nesses estudos. Um dos seus mais interessantes trabalhos nessa área versa exatamente sobre a alquimia e os símbolos cabalísticos, onde ele nos mostra como o inconsciente coletivo da humanidade está estreitamente ligado aos mitos, símbolos e arquétipos que moldam a cultura universal. Isso porque o símbolo é sempre uma âncora que se associa a uma ideia, uma crença, uma sensibilidade que a linguagem comum geralmente não consegue expressar. É a única forma de forjar uma imagem visível de uma realidade que não se pode expressar pelos meios de comunicação conhecidos pelo homem. Destarte, o método simbólico não se assenta numa resposta codificada, mas sim num processo metafórico que oferece ao iniciado os meios de compreensão dos fenômenos inconscientes que ocorrem em nossa mente e muitas vezes, moldam nossos comportamentos.
Assim, os ritos maçônicos estão carregados de simbolismos, especialmente a iniciação. Somente decodificando essa simbologia é possível entender os ensinamentos mais profundos que essa prática contém. Ela se revela nas Palavras, Sinais, Toques, Paramentos, Números, Formas Geométricas, Cores, Jóias, Mitos e Metáforas contidos nos rituais, formando um corpo perfeitamente organizado para servir de catecismo ao iniciado.
É, pois, nesta amalgama extremamente bizarra de influências culturais que a maçonaria moderna foi estruturar as bases do seu ritualismo iniciático. Uma mistura de verdadeiras pesquisas filosóficas produzidas pelos autores iluministas, com apaixonadas buscas de elevação espiritual feitas por espíritos honestos, temperada quiçá com especulações aventureiras formuladas por alguns charlatões ocultistas, mas que de maneira nenhuma concorrem para contaminar de vícios insanáveis a arte do maçom, constitui o acervo dessa arte. Porque, como todo alquimista aprendia quando se iniciava na arte dos adeptos, é persistência, a fé e o espírito de verdadeiro aprendiz que conduz à iluminação. Para todo Irmão que se inicia na arte dos Obreiros da Arte Real, vale o mesmo conselho dado ao alquimista iniciante: ora, ora, ora, labora et invenias. Orar, Orar, Orar, trabalhar. E então descobrirás
[1][1] Essa característica dos ritos de passagem está presente em todas as crônicas que descrevem seções iniciáticas, desde os Antigos Mistérios praticados pelos gregos e egípcios (Mistérios de Ísis e Osíris e Mistérios de Elêusis) como também nas iniciações praticadas por seitas gnósticas da antiguidade. Há indicações que até entre os primeiros cristãos essa prática iniciática tivesse sido exercida. Vários autores referem-se aos episódios descritos nos Evangelhos do Novo Testamento (ressurreição de Lázaro (Evangelho de São João) e a fuga de um jovem envolto em um lençol por ocasião da prisão de Jesus no Horto de Getsemâni (Evangelho de São Marcos) como registros da realização de um ritual de iniciação. Há também indicações que os Cavaleiros Templários praticavam algum tipo de ritual de iniciação para os membros de hierarquia superior na Irmandade, que envolvia elementos de magia ritual, que iam além da mera inserção em um grupo.
[2] A palavra Vitriol é o acrônimo da expressão latina“Visita Interior a Terrae Rectificando que Invenies Occultum Lapidem” – (Visita o interior da Terra, que purificado, encontrarás a pedra escondida). Nessa expressão encontra-se um dos mais caros ensinamentos da alquimia, que acentua a necessidade de uma morte iniciática para fins de um renascimento em outro nível de consciência. Essa frase é atribuída a um alquimista alemão do século XV, chamado Basile Valentin. Este foi um monge beneditino, autor de várias obras de alquimia, entre as quais as mais conhecidas são Currus Triumphalis Antimonii (A carruagem triunfal do antimônio) e Duodecim Claves (As doze chaves).
[3] Esse documento, denominado “Recepcion d’un frey-maçon”, descreve a cerimônia de recepção de um aprendiz maçom, na qual o candidato é conduzido pelo seu padrinho a um reservado privado de luz, onde ele é interrogado sobre a sua vocação para fazer parte da Irmandade. Caso aprovado ele era preparado para a entrada em Loja, após o recolhimento dos metais, e sempre usando uma venda, na condição de “nem vestido nem despido, como ainda hoje é observado no Ritual do Aprendiz.
[4] Não por acaso, uma das divisas da maçonaria se expressa exatamente pela frase “Ordo ab Chaos” (Ordem no Caos).
[5] No princípio criou Deus o céu e a terra. E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas. E disse Deus: Haja luz; e houve luz. E viu Deus que era boa a luz; e fez Deus separação entre a luz e as trevas. E Deus chamou à luz Dia; e às trevas chamou Noite. E foi a tarde e a manhã, o dia primeiro. Gênesis 1:1-5
[6] “Régulateur du Maçon”, publicado em 1801-Supremo Conselho da França.
[7] Essa era uma crença esposada por algumas seitas gnósticas que foram suprimidas pela Igreja de Roma, quando conseguiu fazer do cristianismo a religião oficial do Império Romano. Há claras evidências documentais que mostram que os Cátaros, seita que floresceu no sul da França no início do segundo milênio e que foi suprimida numa violenta cruzada patrocinada pelo Vaticano, era partidária dessas crenças. Segundo esses cultores do cristianismo herético, Jesus não era filho de Deus, nem havia nascido de uma virgem e também não ressuscitara. As referencias evangélicas que falam sobre a sua ressurreição nada mais seriam que interpolações feitas por autores encomendados pela Igreja para provar que Jesus era o Messias esperado pelos judeus e o Cristo dos mitos solares. Tais interpolações teriam sido inspiradas na prática iniciática da morte ritual, para renascimento em outro estado de consciência, que Jesus teria instituído entre seus discípulos. Assim, o episódio da morte e ressurreição de Jesus, os três dias na tumba, etc. nada mais refletia do que uma prática ritual. Essa prática também teria sido adotada pelos Cavaleiros Templários em suas seções iniciáticas superiores, o que teria servido de motivo para a supressão da Ordem e a morte na fogueira de seus principais líderes.
[8] Para maiores pormenores sobre a cultura que precedeu o nascimento da maçonaria moderna vide nossa obra “Conhecendo a Arte Real”, Ed. Madras, São Paulo, 2019.
[9] Wirth Oswald – ”Le symbolisme hermetique par rapport à l’Alchimie et à la Maçonnerie”, Paris, 1910;
[10] Jean Palou- A Maçonaria Simbólica e Iniciática, Ed. Pensamento, 1964
[11] Wirth Oswald – ”Le symbolisme hermetique par rapport à l’Alchimie et à la Maçonnerie”, Paris, 1910; op citado. Wirth Oswald – ”Theorie et symboles de la Philosophie Hermetique”, Paris;