ANTIFREUD
O problema capital da Psicanálise: eu e isso não podem ser opostos quando, de uma perspectiva nietzscheana, p.ex., muito mais lúcida e inclusive didática, eu e isso não passam de partições arbitrárias do próprio inconsciente. E mesmo no sistema formal estilizado do freudismo clássico a eterna necessidade de montar uma tópica tripartite nunca casa com necessidades terapêuticas de pacientes para-neuróticos (ou com a explicação da própria alma humana): como explicar que a instância da censura (supereu) não seja, ela sim, a que se opõe diametralmente ao isso, o inconsciente mais arcaico e profundo? Além disso, se não se considera o eu como contido no inconsciente, o problema só piora: ele está parte dentro, parte fora? Como é isso? Se queriam uma unidade mediadora, não deviam criar uma instância ex nihilo só para isso, sob pena de ter de lidar com “estrelas-do-mar que crescem dos braços amputados de uma primeira estrela-do-mar que se tentou matar”! E como se chama ou se dá a mediação isso-eu, e a eu-supereu? Existe mediação isso-supereu (sim, claro que existe, mas um freudiano ata suas mãos com seus a priori incautos – era para ser esse fraturado eu que acaba tendo uma identificação meramente negativa!)? O freudiano diria: isso e eu são polares, e mesmo com uma instância ‘no meio’, se relacionam – porém, objeta-se com bom senso: como o eu mais espontâneo estaria na periferia a consciência e o órgão de controle superegóico (a sociedade, os pais) por detrás, quando é visivelmente o inverso?!? Em suma, quanto mais se chafurda no “pseudo-empiricismo freudista”, mais a questão fica confusa e abstrata, senão insultante! Se não se deseja abrir mão de “um eu parte consciente, parte inconsciente”, melhor seria, para início de conversa, voltar a Nietzsche. Há um consciente e inconsciente, basta. Consciente e inconsciente são sistemas interrelacionados umbilicalmente. Basta. Ou, para ser ainda mais direto: só o que existe é o Inconsciente, sendo o consciente a ponta de fenômeno visível do iceberg humano. O resto não passa de especulação de vigaristas aproveitadores.