Xadrez, Poquêr e Projetos

Xadrez, Pôquer e Projetos!

Uma experiência pessoal em projetos baseada na teoria dos jogos.

Então você começa a ler este capitulo já com uma pergunta na cabeça: O que será que este cara quer dizer com xadrez, pôquer e projetos?

Te garanto que há muito de experiência pessoal no que você vai ler. Então prepare-se para encontrar algo que pode ser aplicado a sua vida e pode ajudar consideravelmente a oportunidade de obter sucesso em seus projetos, negócios e até mesmo na vida pessoal.

A teoria dos jogos foi pela primeira vez desenvolvida por John Von Neumann e posteriormente ampliada pela mente brilhante de John Nash, basta dizer que este matemático foi ganhador do prêmio Nobel de economia em 1994 com a “Teoria dos jogos não cooperativos” demonstrando a existência de um ponto de equilíbrio em negócios estratégicos com múltiplos jogadores.

O ponto de equilíbrio de John Nash explica por exemplo porque diversos comerciantes escolhem abrir sua loja ao lado de concorrentes, formando grandes centros de compras para uma determinada categoria de produtos, exemplos conhecidos são praças de alimentação, ruas que só vendem lustres, ruas que só vendem eletrônicos etc. Parece até contrassenso, mas não é, cada comerciante tenta buscar o ponto de equilíbrio estando onde muito provavelmente os clientes que buscam determinados produtos estarão.

Teoria dos jogos nada mais é do que o estudo situacional do comportamento humano ou até mesmo de maquinas, haja vista a evolução do machine learning através da inteligência artificial onde os agentes econômicos precisam decidir algo e baseiam-se em como os outros agentes competidores ou não, irão agir.

Sim, estamos falando de estratégia, a mesma estratégia tão fundamental quando falamos em inovação e não podemos esquecer que inovação é sempre um projeto.

Projetos de um modo geral são compostos por um time de pessoas que trabalham em “conjunto” para atingir um objetivo comum, mas nem sempre isto acontece assim desta forma tão harmoniosa e sinérgica. Diria até que quase nunca acontecem assim, pois se assim fosse não teríamos tantos projetos fracassando ou entregando resultados e benefícios muito abaixo do esperado por seus patrocinadores.

Claro que estamos falando de times e grupos empresarias que ainda possuem baixa maturidade em gerenciamento de projetos, mas isto é outra “estória” e que já vem sendo abordada a exaustão por outros autores e pelos escritórios de projetos que tem como um de seus objetivos aumentar a maturidade das organizações. Então vamos deixar o tema maturidade para outro momento.

Hoje vamos abordar o lado das relações humanas e dos chamados soft skills que são as habilidades interpessoais para trabalhar em time, bem como a capacidade de motivar o outro.

Para isto precisamos lembrar que todo projeto tem como regra 4 momentos básicos:

Forming, Storming, Norming e Performing, o famoso modelo de Tuckman que em bom português significa:

Forming: Formação do time, com primeiros contatos e a ideação do projeto e o entendimento dos objetivos.

Storming: momento de turbulência onde há oposição de ideias, modo de trabalho, argumentos e visões antagônicas e posições baseadas em experiencias pessoais e até mesmo nos egocentrismos das pessoas.

Norming: momento de normatização, onde as pessoas começam a se alinhar e as ideais convergem para um objetivo comum.

Performing: situação na qual os grupos de trabalhos começam a ganhar produtividade e sinergia no processo de trabalharem juntos e buscando a melhoria continua, performando cada vez melhor.

Há um 5º estágio chamado de Adjourning que é o momento da conclusão das tarefas ou do projeto e que trazem a sensação de completude e reconhecimento entre os membros de um time.

Então é aqui que entramos no mundo do xadrez, pôquer e projetos.

Talvez para você que está lendo e não conhece em detalhes os jogos, tente abstrair, não é necessário conhecer em detalhes para entender o conceito por trás desta visão.

Em minhas experiências pessoais, venho usando a técnica de sempre pensar se durante um projeto estou jogando pôquer ou xadrez e o leitor perceberá que existe uma razão para isto e não é uma insanidade pensar assim.

Você perceberá e aqui eu coloco um momento para que você faça um introspecção durante a leitura, pensando em varias situações as quais você já viveu em seus projetos, negócios ou na própria vida pessoal, onde você certamente verá que você já jogou xadrez ou pôquer, mesmo que nunca tenha jogado de fato estes jogos.

Há muito tempo venho exercitando as três artes pôquer, xadrez e gerenciamento de projetos, sim considero “arte”, porque para cada uma delas requer mais do que técnica, requer habilidades pessoais.

No início eu utilizava cada uma destas “artes” de forma isolada, mas com a frequência a qual eu jogava pôquer e xadrez ou trabalhava com gerenciamento de projetos comecei a ter uma visão mais abrangente e integrada, o que me obrigou a relacioná-las sempre. Explico:

Muitas vezes jogamos xadrez como um hobby, como uma diversão ou simplesmente como um exercício de lógica, assim acontece também com o Pôquer que muitas vezes não passa de um bom momento de carteado entre amigos, ou para os mais viciados uma forma de competição e oportunidade de apostar com o objetivo de ganhar uma grana.

Assim como existem aqueles que fazem do gerenciamento de projetos um conceito baseado em técnicas (hard skills) ou ainda aqueles que se aventuram em gerenciar projetos, só se preocupando com os efeitos e esquecendo que por trás de qualquer efeito sempre há uma causa. Gerenciar projetos é uma arte e o artista deve ter a sensibilidade para imaginar como a sua obra ficará antes de tê-la iniciado e quais os benefícios que serão entregues aos stakeholders.

Voltando ao tema principal, é incrível como podemos fazer uma relação clara entre o xadrez, pôquer e projetos.

Costumo dividir os dois jogos (Xadrez e Pôquer) em duas variáveis claras que podemos identificar no campo do gerenciamento de projetos e quando digo projetos estou falando no conceito mais amplo que esta palavra pode ter, sem nos focarmos em segmentos de negócio especificamente.

As duas divisões claras que existem são as “ Jornadas e Batalhas” que acontecem em campo aberto e em campo fechado, existe uma diferença muito grande entre combater em um terreno amplo e descampado, como nas famosas batalhas de Waterloo ou como nas Cruzadas Medievais, onde os oponentes enxergavam-se à distância, tinham pleno conhecimento da quantidade de arqueiros, cavaleiros e do arsenal bélico que o inimigo possuía, propiciando assim uma melhor definição da estratégia a ser adotada para aquele combate.

Outra situação é combater em Campo fechado como foi feito no Vietnã nas florestas e matas fechadas, onde não temos conhecimento do inimigo, quantos são e quais são as forças e estratégias que dispõem.

Quando transportamos este conceito para o gerenciamento de projetos podemos fazer a mesma analogia, gerenciar projetos em campo aberto é como jogar Xadrez, você conhece o escopo, sabe quais são os stakeholder e sabe muito bem onde está pisando, tem uma visão clara do time e conhece o objetivo dado pelo sponsor, bem como, o seu próprio objetivo, além de conhecer toda a hierarquia do jogo, regras e o desenvolvimento do mesmo.

Assim jogar xadrez é como combater em campo aberto e administrar o conhecido.

No Pôquer em qualquer modalidade que você possa jogar existe uma relação obscura no decorrer do jogo, o campo é fechado, você não conhece a mão do seu oponente, não tem domínio sobre as cartas que irá receber, você nunca sabe quando está olhando para seu oponente ou para uma máscara, as relações passam através de regras claras, entretanto, o desenvolvimento do jogo é totalmente no escuro, é como se você estivesse combatendo em mata fechada sem saber se será atacado repentinamente.

No pôquer você ainda encontra variáveis econômicas fortes, o dinheiro, sem o qual não existe fator motivador para que o evento aconteça, além de possuir um apelo psicológico ligado a pressão do dinheiro envolvido, que faz suscitar, o medo, angustia, ambição, frustração, euforia, ódio, alegria e etc.

Aqui proponho analisar o xadrez e o pôquer sob uma visão de gerenciamento de projetos.

Imaginemos um tabuleiro de Xadrez com suas 64 casas que se alternam entre casas pretas e brancas, de um lado estão a sua força de combate dividida e alocada em posições estratégicas e hierárquicas. À frente os peões, seguidos de armamentos poderosos tais como cavaleiros e torres, suportados pela força do clero, representadas através dos bispos. E no meio está à peça chave do jogo, o Rei, que deve estar seguro de todos os perigos, ao seu lado a dama ou rainha, uma poderosa peça que representa o poder do povo ao lado de seu rei, daí a força de ataque e defesa da rainha no xadrez.

Exatamente do outro lado do tabuleiro estão às forças do seu adversário, que não são nem melhores nem piores do que as suas forças. Elas são exatamente iguais em quantidade e poder.

O objetivo é o mesmo para ambos, ou seja, é cercar o Rei inimigo de maneira a torná-lo preso e indefensável, o objetivo é o Xeque-mate.

Isto tudo é um cenário. Um cenário montado tal qual vivenciados no mundo dos projetos, no desenrolar deste cenário que vai mudando a cada lance, existem negociações, existem estratégias, existe o momento certo para atacar e o momento de defender-se.

No dia a dia dos projetos as relações são exatamente iguais a um jogo de Xadrez, ou seja, você não parte para o ataque se você não tiver certeza de estar seguro em sua defesa, muitas vezes erramos ao atacar sem imaginar o contra-ataque que pode surgir e fazer com que toda sua estratégia seja em vão, muitas vezes podendo ser fatal, assim sempre temos o planejamento geral do projeto que devemos fazer antes de partir para execução.

Temos que mensurar neste planejamento os riscos e oportunidades. Sair diretamente executando nem sempre é a maneira mais produtiva ou acertada de se obter resultados, mesmo que falando em métodos ágeis.

Durante um jogo de Xadrez, analisamos todo o tempo às vantagens competitivas envolvidas e estas vantagens tornam-se muito eficazes quando elas são percebidas pelas forças ou stakeholders que tem objetivos contrários ao projeto. O planejamento, a organização a forma como você implementa uma ação nos projetos são exatamente como no decorrer de uma partida de Xadrez, o mais importante é que são mensuráveis, pois está tudo ali na sua frente.

Durante o desenrolar de uma partida fazemos opções, opções de troca ou até mesmo de perda substancial de material em função da sua estratégia, o que nos remete novamente a negociação que existem nos projetos, negociamos o tempo todo, muitas vezes para alinharmos as ações e o escopo, outras para reduzirmos custos, outras atingir objetivos intermediários, etc.

O mais incrível é que durante um jogo vivemos momentos de extrema pressão, onde somos forçados a entregar posições, sermos flexíveis e resilientes, algumas vezes temos que entregar a Rainha para podermos salvar o Rei e continuarmos no Jogo. E nos projetos agimos de modo diferente? Muitas vezes abrimos mão de algo no escopo para termos à possibilidade de continuarmos com o projeto e entregarmos os benefícios.

E os momentos críticos onde sacrificamos um peão ou peça mais valiosa para abrirmos um espaço desejado ou uma estratégia mais ambiciosa. Isto é exatamente igual no dia a dia de um gerente de projetos que tem que tomar decisões deste porte. Os riscos mapeados e mensuráveis, e uma estratégia está em curso.

Como falamos anteriormente isto cabe dentro do nosso campo aberto e conhecido, sendo assim o Xadrez é uma das etapas no qual está inserido o gerente de projeto.

Analisamos agora o lado do Campo Fechado, ou seja, o imprevisível, o misterioso. Isto é pôquer no gerenciamento de projetos.

O Cenário é composto por você, uma mesa, um baralho, vários oponentes, ou seja, você contra todos e todos contra todos, isto que o que Nash chamou: "Jogo não cooperativo".

No pôquer as relações são subliminares, as cartas são embaralhadas e depois são distribuídas, levando consigo os ventos da sorte, mas não é só sorte, pôquer está muito longe de ser um jogo de azar, pôquer requer muita sensibilidade, habilidade e percepção.

Tão logo a distribuição das cartas começa um jogo psicológico toma conta do cenário, existe uma série de movimentos que não estão nas regras, mas são partes fundamentais do jogo, existe um verdadeiro jogo de caras e bocas, ou simplesmente um profundo silêncio estampado nos rostos dos jogadores que mais parecem estátuas de cera, simplesmente para não denotar qualquer sentimento, comumente chamado de “Poker Face”. O jogo é frio.

Os jogadores passam a analisar suas condições em termos cinéticos e potenciais, pois ainda haverá uma rodada de troca de cartas que podem melhorar a vantagem competitiva de cada “Player”.

As estratégias são feitas e assim como no Xadrez existem quantidades absurdas de oportunidades disponíveis, o que faz dos jogadores excelentes em soft skills, com habilidades nativas de influenciar os outros.

As relações humanas e as habilidades para perceber sutilezas são fundamentais no projeto, a neurolinguística torna-se primordial neste campo fechado.

Além das forças da probabilidade, existem aspectos a serem observados, tais como: objetivos pessoais, ousadia, quebra de paradigmas e medos.

Tudo isto exige do jogador ou gerente de projetos uma enorme sensibilidade e atenção aos mínimos movimentos, esta é uma arte refinada que o gerente de projetos desenvolve, ver além do que é visível.

Ainda assim, com toda esta avaliação, toda a sensibilidade, toda a estatística e lógica matemática envolvida neste processo, nem sempre o melhor jogo é que leva o cacife, a bolada. Por quê?

Existe um fator no pôquer que é fundamental nos projetos, saber arriscar, saber avaliar, até mesmo quando você não tem nada na mão. Saber blefar.

Parece horrível falar blefar em projetos, é totalmente contraditório aos hard skills, que são as técnicas que aprendemos para gerenciar. Mas falando francamente, técnicas por si só não levam um projeto ao sucesso, se assim fosse não precisaríamos de pessoas habilidosas para gerencia-los.

Isto mesmo, a palavra chave é blefar, mas até mesmo para blefar você tem que ser respeitado pelos stakeholder opositores, não adianta blefar toda hora, porque se pagarem para ver e perceberem que você é um blefador, sempre pagarão para ver, e você perderá a credibilidade. Portanto é importante ter base de sustentação em alguns momentos, assim a oposição ao projeto nunca saberá quando você está ou não blefando. Aqui lembramos da analise de stakeholders e suas posições no projeto.

Outros momentos interessantes são aqueles em que ninguém pagou para ver seu jogo, você tem uma quadra de ases na mão (jogo bem alto), entretanto como ninguém pagou para ver, para que mostrar as cartas? Ou por que não mostrá-las?

Quando nos deparamos com situações de extrema pressão em projetos, às vezes o blefe é a melhor saída, as vezes não. Só um excelente gerente de projetos saberá quando faze-lo, muitos até intuitivamente. Ser gerentes de projetos é ser um exímio negociador, articulador.

Sempre que entramos em um projeto, que está inserido em um cenário complexo com forte oposição, devemos avaliar bem, porque assim como no pôquer, uma jogada mais ousada poderá nos assustar e correremos deste jogo colocando a perder todo o planejamento feito.

Sendo assim e ponderando as duas situações, entendemos que o gerenciamento de projetos é mais complexo que os jogos individualmente, porque alternasse os momentos de xadrez e pôquer e dentro deste dilema, cabe ao gerente do projeto saber qual jogo está sendo jogado.

A grande desafio é saber quando está em campo aberto ou campo fechado, muitas vezes jogasse xadrez como se fosse pôquer e vice-versa, o resultado é desastroso. Então como saber? Existem muitas variáveis para analisarmos neste tema, que é amplo e inesgotável, assim como a sublime arte de gerenciar.

Há uma miríade de possibilidades.

Agora que nós já temos algumas percepções, talvez possamos responder a seguinte questão:

Em qual jogo somos melhores? Pôquer ou Xadrez?

Se soubermos a resposta, já percorremos boa parte da jornada na busca do autoconhecimento e desta forma saberemos quais são nossos papeis e qual jogo empreenderemos no cenário vivido.

Talvez uma boa mescla de pôquer e xadrez seja o melhor caminho.

Fica aqui o desafio...