Simplismo e a seleção social de ideias

LIBERALISMO

Eu chamava meu posicionamento filosófico/econômico de ‘liberal’. Entretanto observei que o entendimento das pessoas com quem eu conversava divergia muito do meu, especialmente em um aspecto: as pessoas acreditam que o liberalismo resolve todos os problemas a partir de transações financeiras. Como liberal acredito que em geral as individualidades mais competentes para decidir acerca da transação são aquelas nela envolvidas. Com exceções, uma pessoa deficiente mental pode, em alguns casos, ser melhor representada por um parente. Ou seja, como liberal acredito que em uma transação comercial a própria pessoa é sua melhor representante. Entretanto também acredito que a livre circulação de bens, serviços, dinheiro e pessoas é um bom ponto de partida, mas insuficiente. Tendo isto em mente criei uma ideologia que é compatível com o liberalismo, mas apresenta a troca e aperfeiçoamento de ideias à frente da troca de bens e serviços.

SIMPLISMO

Batizei de simplismo esta nova ideologia, a qual sua carta da princípios está em outro ensaio. Tenho especial apreço por David Hume, Karl Popper e Nassim N. Taleb. Espero que minhas ideias sejam coerentes com suas filosofias, mas não tenho nenhum compromisso com nenhuma delas. A autoridade, especialmente no que é relativo às ideias, é algo contra o qual cada um deles se posicionou firmemente. Da mesma forma ressignifico conceitos consagrados ou crio os meus próprios à despeito das instituições oficiais.

FRAGILIDADE DAS IDEIAS

O simplismo defende que as ideias sejam elaboradas tendo em vista a seleção social (seleção natural, mas no contexto social). Para tal o simplismo defende que as ideias sejam elaboradas da maneira mais frágil possível, isto é, que sejam escritas de maneira que possam ser criticadas, aperfeiçoadas ou rejeitadas. O simplismo entende que quanto mais simples e transparente for uma ideia ou conceito, mais fácil é de ser criticado. Também defende que as ideias sejam escritas, quando possível, de maneira que seja possível refutá-las (nas palavras de Popper, que as ideias sejam falseáveis).

FRAGILIDADE DE INDIVIDUALIDADES COM ANTIFRAGILIDADE DO SISTEMA

Nassim N. Taleb, em seu livro, ‘Antifrágil’ fala de como os aviões são frágeis: pesadas máquinas de aço voando à muitos quilômetros de distância da terra, qualquer imprevisto pode levar a um desastre. Entretanto, cada acidente de avião leva ao aprimoramento do sistema, seja pelo aperfeiçoamento do equipamento, seja pelo aperfeiçoamento das regras ou das técnicas. Cada individualidade (neste caso cada avião) é frágil, mas a fragilidade da individualidade leva à antifragilidade do sistema. Como resultado de longo prazo voar se tornou extremamente seguro: é muito mais seguro voar de Brasília a Recife do que ir dirigindo.

ROBUSTEZ DA INDIVIDUALIDADE COM FRAGILIDADE DO SISTEMA

Taleb também cita o caso da crise de 2008. Bancos que agiram de maneira leviana foram (e ainda são) socorridos antes de irem à falência. Assim tanto os bancos irresponsáveis continuam no mercado como outros bancos são incentivados a adotarem suas práticas, uma vez que sabem que se estiverem em situação crítica serão socorridos. O socorro deixa um banco robusto (ele aguenta uma crise), mas às custas de deixar todo o sistema mais frágil.

FRAGILIDADE DAS IDEIAS COM ANTIFRAGILIDADE DO SISTEMA DE IDEIAS

A seleção social de ideias acontece independentemente de qualquer disposição contrária ou a favor. O que o simplismo defende é que as ideias sejam elaboradas de maneira que a seleção seja orientada de acordo com a intenção das pessoas que as elaboram. Ironicamente a maneira de fazer isto é escrevendo ideias frágeis: ideias que podem ser descartadas seja através de análise crítica, seja através da comparação com dados empíricos. O objetivo do simplismo, no que tange à fragilidade, é que o sistema teórico seja mais parecido com o sistema de aviação do que o sistema bancário.

CONCLUSÃO

O liberalismo advoga pela livre circulação de bens, serviços, pessoas e dinheiro. O análogo a isto, no mundo das ideias, é a produção de ideias mais inteligíveis possível. Quanto mais simples e claras forem, mais fácil é criticá-las para rejeitá-las ou para aperfeiçoá-las. Da mesma maneira que alguma população pode decidir intervir na livre circulação de mercadorias (por exemplo, sobretaxando uma bebida que faz mal à saúde) é possível decidir por elaborar as ideias de maneira um pouco mais complexa. Tal complexidade deve ser, tanto quanto possível, evitada.