Das diferentes Esperanças (ou, de quando a crença no amanhã é um anseio racional)

E de toda esperança alimentada - essa, que sem que nos demos conta -, brota uma outra que se constitui no esforço de entende-la. A esperança que nasce de forma espontânea, penso nascer de nossa luta pela sobrevivência. É uma esperança descontrolada, instintiva, como a sede pela água que falta e, bem por isso, tão necessária como o ar ao pulmão chegar e a respiração fazer a vida viver. É intrínseco a nós, e a qualquer animal, lutar até nossa última gota de força. Exemplifico isso com a cena de Blade Runner. Quando o androide persegue Dechart, personagem de Harrison Ford, está claro que ali se colocam duas possibilidades, a saber, uma que preconiza a vitória do humano e, outra, que nos indica a derrota do homem frente a um androide. Várias são os momentos em que Dechart poderia ser eliminado, porém, sua ânsia em viver, o faz "retirar" forças que lhe permitem se salvar. É essa luta pela vida que faz com que o andróide admire nossa espécie, e numa fala magistral, "é de hora de morrer", termina o filme. O que isso significa senão o reconhecimento de que a luta pela vida é o elemento que nos dá superioridade frente outros animais, pois, se neles ocorre apenas o instinto, em nós, me parece, se somam outros; eu citaria a perpetuação da espécie como outro fator essencial. Essa é a esperança que penso ser intrínseca a nossa espécie. Penso haver outra. Destaco aqui aquela que denomino de esperança racional. Trata-se de uma esperança construída, ou desenvolvida, para um fim específico. Pode-se dar o nome de projeto, pois é disso que se trata. Noutras palavras, essa esperança, penso, se associa, obrigatoriamente, numa construção cognitiva tendo em vista um fim pré determinado. É uma esperança politicamente elaborada para uma ação e um fim delimitados. Nesse sentido, essa esperança, diferente daquela que denomino instintiva, é superior, na medida em que busca compreender as razões determinantes da realidade e relações estabelecidas. Ou seja: não se deve negar o que é instintivo, porém, não se deve, em seu nome, deixar a realidade ser atropelada em seu nome. Posto que, se as relações humanas, elas em si, baseadas em diferentes seres e com visões de mundo e perspectivas de vida únicas, é natural que busquem, cada qual, e a seu modo, atender o que lhes parecem mais adequado e satisfatório. Também não se deve ignorar que tais relações, ao adentrarem nessa arena da vida, busquem um bem que possa atender a todos, nesse aspecto, trata-se de uma ação política, outra característica inerente a nós seres humanos.