Falta de tempo para pensar

Do mesmo jeito que viemos ao mundo vamos embora e a maioria das pessoas perdem seu tempo e sua saúde acumulando coisas as quais no final ficam para os outros, viram lixo ou são utilizadas para, em vão, tentar recuperar o que ao longo da vida foi perdido: tempo e saúde. Se esquecem de buscar aquilo que ultrapassa a materialidade e a finitude da vida cotidiana.

Nos dias de hoje pagamos o alto preço pelos longos séculos em que passamos a acreditar na inutilidade de estudos que não geram lucro. O desprezo nutrido por nossa sociedade pelos estudos nas áreas de História, Filosofia, Sociologia, Linguagens e Códigos, Arte e outras ciências afins acarretou a formação de uma população caracterizada pela incapacidade – ou preguiça, talvez? – de pensar criticamente a realidade na qual está inserida. O ato de refletir e pensar tornou-se raridade.

Não se trata aqui de menosprezar as demais áreas do conhecimento, todas são importantes e nenhuma deve ser diminuída. Cada uma possui seu fim próprio e, por conta disso, precisa ser respeitada, estudada, entendida e, principalmente, aplicada à vida para o bem de todos.

Para não delongar demais esta exposição me aterei apenas ao âmbito da vida pessoal, pois em minha humilde opinião os outros campos – política, religião, convivência social, redes de comunicação, entre tantos outros – são, atualmente, apenas meras consequências de uma vivência pessoal pautada na ignorância em relação aos assuntos apontados há pouco.

Desenvolvemos um modo de vida que nos leva cotidianamente a buscar o “ter” em detrimento do “ser”. Sendo que para “ser” algo é preciso pensar e repensar a realidade, mas quando focamos excessivamente o “ter”, o espaço para a reflexão desaparece e passa-se a seguir os caminhos da vida do “jeito que dá” do ponto de vista da reflexão. Em muitos casos as consequências são claras: alguns se estabilizam financeiramente, outros ser tornam ricos e, uma minoria, milionários, no entanto o vazio existencial não deixa de ser uma companhia constante. A busca de bens materiais ou de visibilidade no mundo não substitui a ausência de uma vida interior pautada na busca do próprio aperfeiçoamento.

No Brasil, e em outros países também, as áreas do conhecimento que destaquei a pouco são conteúdos obrigatórios em todas as instituições de ensino, sejam elas públicas ou privadas. Isso não ocorre ocasionalmente. Na verdade, existem justificativas muito boas para isso.

Um indivíduo o qual reflete sobre sua vida do ponto de vista das humanidades constata que vivemos em um mundo socialmente construído. Assim, em diversos aspectos, mas nem todos, nada está pronto e acabado. Noções partidas de princípios como esse possibilitam a todos reverem suas ações, repensarem suas vivências, enfim, refletirem criticamente e, consequentemente, mudarem posturas prejudiciais enraizadas na mentalidade. Além disso, conhecer e entender melhor o passado através das ciências faz com que os indivíduos se tornem mais humanos, mais compreensivos com os demais, possibilita o desenvolvimento da empatia para com o diferente. É importante lembrar o que dizia o poeta alemão Johann Wolfgang Goethe "Quem não sabe prestar contas de três milênios, permanece nada trevas ignorante, e vive apenas o dia que passa"

Para alcançar tal nível de entendimento sobre o mundo, o qual possui infindáveis possibilidades e consequências, é preciso a constante construção do conhecimento no sentido que somos seres múltiplos e inacabados. Precisamos desenvolver diversas áreas da vida concomitantemente, o cuidado com os bens materiais é apenas parte disso. A interiorização, o entendimento do mundo social no qual vivemos, entre tantos outros aspectos se fazem essenciais.

O imediatismo vivido atualmente somado à ampla disseminação de Fake News tem dificultado cada vez mais aos indivíduos desenvolverem uma consciência filosófica efetiva. Divulga-se informações de modo irrefletido, constrói-se crenças limitantes e com isso todos passam a viver em suas bolhas de ignorância. Aqueles que conseguiram estabilidade financeira constroem essas bolhas no conforto de suas residências conforme suas possibilidades e aos demais cabem se contentarem com a ilusão de que o futuro será melhor, mas ele não será, porque as pessoas não estão fazendo questão nenhuma de se tornarem melhores.

Apesar de tudo, não se deve perder o ânimo. É sempre tempo de lutar, buscar o próximo conscientizar e talvez um dia esse cenário caótico, de algum modo, reinventar. Todavia, não se pode negar que, se de fato houver alguma mudança, será através de um processo muito lento e deve partir de as pessoas independentemente de sua realidade.