Chá da Cesta - 9 -B: Expansão do chá a partir da China
Expansão do chá a partir da China
Por que razão, apesar de serem provavelmente os primeiros a trazer chá para a Europa, os Portugueses não se interessaram pela sua importação para a Europa? José Duarte Amaral considera que os Portugueses, ao contrário dos Holandeses, não previram para o chá um interesse comercial que se equiparasse ao das especiarias. João Teles e Cunha, por sua vez, adianta algumas razões para este não investimento no comércio do chá: os portugueses não alteraram significativamente as mercadorias traficadas na Ásia; tornando a Índia o centro da sua presença na Ásia, Portugal afastou-se da área do consumo do chá, não obstante o domínio de Malaca, na fronteira desta, além de que Macau era muito distante e o Japão ainda mais periférico do que a China; desde a década de 1640, os holandeses foram os únicos europeus com acesso ao Japão, com relações comerciais exclusivas, a partir de Nagasaki; os espanhóis também não se interessaram pelo consumo e comercialização do chá, apesar de o conhecerem, em virtude da sua presença nas Filipinas, especialmente em Manila, onde existia uma significativa comunidade de chineses.
Apesar de tudo, o comércio do chá não dispensava Macau nem os comerciantes portugueses. José Duarte Amaral destaca a importância de Macau no comércio sino europeu desde 1577, sendo um entreposto usado pelos europeus para a aquisição de produtos chineses, entre os quais o chá. A este propósito, afirma ainda que o primeiro navio a chegar à Europa com chá seria português ou holandês, zarpando de Macau em 1606 ou 1610, embora a primeira referência ao consumo de chá na Holanda date de 1635. João Paulo Azevedo de Oliveira e Costa garante que, dentro das lucrativas relações comerciais nas margens dos impérios europeus e asiáticos,
“os Portugueses foram, juntamente com os Chineses, a comunidade mercantil mais dinâmica, vendendo chá, sedas, zinco e outras mercadorias e levando no regresso pimenta e canela, esta oriunda do Ceilão e destinada ao comércio com Manila.”
A importância de Macau no comércio do chá também é confirmada por uma carta do comerciante inglês R. C. Wickan, escrita em 1615, no Japão, na qual refere “que nessa altura, Macau era um importante entreposto de chá (…).” J. B. Deuss, um antigo Director da Estação Experimental para o chá e a borracha, em Java, na Indonésia Holandesa, referindo-se talvez apenas a Java, sem mencionar os portugueses, afirma que “o primeiro chá foi importado de Java pelos Holandeses em 1610, seguindo-se depois em 1635. Tratava se então de chá não fermentado. O chá alcançou de imediato um grande sucesso.”
No entanto, é certo que em Portugal, “(…) o consumo não descolou e manteve-se sempre dentro de nichos, insuficientes para animar um comércio com Macau sem ser acompanhado de outras mercadorias chinesas, com relevo para as porcelanas (…).” Daqui se poderá deduzir que os Portugueses não consomem nem transportam chá para a Europa, mas abastecem em Macau ou em Java os holandeses que o trazem para a Europa. A situação manter-se-á seguramente até ao desfecho da Guerra do Ópio, em meados do século XIX. É nesta fronteira de intercâmbio comercial no Oriente, longe dos centros imperiais, nas margens dos Impérios europeus, por vezes em contracorrente com os interesses da Metrópole ou de outras áreas do Império, que o comércio do chá se processa.
Mário Moura
Doutor em História do Atlântico
Universidade dos Açores
Lugar Areias, Rabo de Peixe, Setembro de 2019